Domingo, 21 de fevereiro de 2016
Mariana Tokarnia - Repórter da Agência Brasil
O Ministério Público Federal, o Ministério Público
de Goiás (MPGO) e o Ministério Público de Contas do Estado questionam a
capacidade das organizações sociais (OSs) qualificadas pelo governo de
Goiás para administrar escolas estaduais. Segundo recomendação expedida na última semana, nenhuma delas atende aos requisitos previstos na legislação, na Lei Estadual 15.503/2005.
O
governo goiano pretende começar este ano a transferir a gestão das
escolas estaduais para OSs, iniciativa inédita no país na área de
educação. A implantação começa em 23 escolas e deverá chegar a 200 até o
final do ano. Polêmica, a proposta é alvo de críticas de especialistas e
motivou a ocupação de 28 escolas no estado desde dezembro do ano passado.
O
documento dos ministérios públicos mostra que alguns dirigentes
respondem a processos judiciais, são acusados de falsidade ideológica,
estelionato, fraudes em concurso público e improbidade administrativa.
Outros, segundo os MPs, não possuem nada que aponte para a “notória
capacidade profissional a ponto de ser responsável por uma organização
social da área de educação, conforme exige a lei”.
“Os
responsáveis pelas organizações sociais recentemente qualificadas pelo
estado de Goiás não comprovaram notória capacidade profissional a ponto
de ser reconhecido em sua área de atuação ou não possuem idoneidade
moral”, diz o documento, que acrescenta que as instituições que possuem
responsáveis processados “não poderiam ter sido qualificadas como
organizações sociais pelo estado de Goiás”.
Em nota, a Secretaria
de Educação, Cultura e Esporte (Seduce) diz que prestará os
esclarecimentos sobre o projeto diretamente ao Ministério Público. Em
conversa com internautas na última quarta-feira (17), a secretária de
Educação do estado, Raquel Teixeira, foi perguntada sobre a idoneidade
das OSs qualificadas e respondeu que esse tipo avaliação depende da
conclusão da seleção de entidades.
“Acho que a pergunta está um
pouco precipitada, vamos falar da OSs quando tivermos o resultado. Ainda
não sabemos qual OS será classificada. A gente não sabe ainda por quem
ela será comandada.”
O edital de chamamento das entidades foi lançado no fim do ano passado e a abertura dos envelopes
foi feita no último dia 15. Dez das 11 entidades qualificadas
apresentaram propostas. Segundo a Seduce, todas as OSs interessadas
tiveram alguma pendência na documentação. Uma nova sessão foi agendada
para o dia 25 de fevereiro.
Pontos inconstitucionais
A
questão chamou atenção dos ministérios públicos, que consideraram
vários pontos do edital inconstitucionais. Na recomendação de adiamento
do certame expedida essa semana, promotores e procuradores destacam como
irregularidades pontos do projeto que abrem margem para a
desvalorização dos professores e preveem a utilização de recursos da
União para pagar profissionais não concursados. O documento recomenda o
adiamento do edital até que essas questões sejam solucionadas.
Veja as alegações dos MPs sobre cada uma das entidades qualificadas pelo governo de Goiás para a seleção:
Educar:
Tem como responsável Hilda Regina Ferreira Sena, servidora da
Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia e coordenadora de escolas
particulares de Goiânia. Hilda também é ligada à Universidade Norte do
Paraná, mas nada que aponte para uma notória capacidade profissional a
ponto de ser responsável por uma organização social da área de educação,
conforme exige a lei.
A Agência Brasil entrou em contato com a entidade, mas não recebeu resposta até o fechamento da reportagem.
IDGE:
OS responsáveis pela entidade, Joveny Sebastião Cândido de Oliveira e
Danilo Nogueira Magalhães, figuram como investigados pela prática do
crime de falsidade ideológica nos autos de inquérito policial em curso
na 11ª Vara Criminal de Goiânia. A entidade é ligada ao Centro
Universitário de Goiás (Uni-Anhanguera).
A IDGE foi a única entre as qualificadas que não apresentou proposta para concorrer ao edital. A Agência Brasil entrou em contato com a entidade, mas não recebeu resposta até o fechamento da reportagem.
GTR:
Tem como responsáveis André Luiz Braga das Dores e Antônio Carlos
Coelho Noleto. O primeiro é réu em ações penais e de improbidade
administrativa decorrentes da Operação Fundo Corrosivo, deflagrada pelo
Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério
Público do Estado de Goiás. O segundo é membro do PSDB/GO, servidor da
Assembleia Legislativa do Estado de Goiás cedido para a governadoria de
julho a dezembro do ano passado e beneficiário de suspensão de processo
em razão da prática do crime de concussão.
Em
nota, a GTR diz que ambos não fazem mais parte do quadro de associados.
“A morosidade dos órgãos públicos federais tem causado transtornos. Até
o momento, a Receita Federal não alterou os nomes dos responsáveis
legais em seu sistema, apesar do pedido já ter sido protocolado há algum
tempo”, argumenta a OS.
IBEG: A responsável
pela organização, Silvana Pereira Gomes da Silva e a entidade não têm
idoneidade moral, segundo os MPs, porque foram condenadas pela Justiça
Estadual de Goiás em ação civil de improbidade administrativa em razão
de fraudes perpetradas em concurso público realizado pelo Município de
Aparecida de Goiânia-GO.
Em nota, o IBEG diz que irá discutir o
processo até a última instância. Diz ainda que não há sentença
condenatória transitada em julgado, o que garante à entidade e a sua
presidenta o exercício regular de seus direitos. “O processo é público e
em sua sentença não faz nenhuma referência à fraude perpetrada em
concurso público, trata de questões meramente contratuais e
procedimentais.”
ECMA: Tem como responsável José
Izecias de Oliveira, acusado de peculato e associação criminosa contra a
Universidade Estadual de Goiás (UEG), processo decorrente da Operação
Boca do Caixa, desencadeada pelo MPGO e que resultou em bloqueio de bens
dos envolvidos.
Em nota, o ECMA diz que a ação é “equivocada
como um todo, o que se espera seja oportunamente declarada pelo
Judiciário, como já consta na última decisão colegiada em recurso de
habeas corpus, que determinou a retirada de prova ilícita utilizada pelo
Ministério Público, que embasou o oferecimento da denúncia”. A entidade
diz ainda que processo não foi transitado em julgado, cabendo o
princípio da presunção da inocência.
INOVE: Tem
como responsável o veterinário Relton Jerônimo Cabral, que tem contra si
um boletim de ocorrência narrando suposta prática do crime de
estelionato pela venda de um cão doente em estado terminal. Não há
notícia de histórico na área de educação em favor de Relton.
A entidade diz que só irá se posicionar após o fim do processo de licitação.
IBRACEDS:
Um de seus responsáveis, André Luiz Braga das Dores, é réu em ações
penais e de improbidade administrativas decorrente da Operação Fundo
Corrosivo, deflagrada pelo MPGO.
Em resposta, o presidente da
entidade, Antônio de Sousa Almeida, argumentou que “Nossa Constituição é
muito clara: enquanto o cidadão é processado mas não foi julgado e
condenado, não é um réu. [André Luiz Braga das Dores] é pessoa íntegra e
sofre acusações injustas. O Ibraceds irá mantê-lo. Sei de sua
idoneidade e capacidade.”
IBCES: Tem como
responsável Helena Beatriz de Moura Belle, profissional ligada à
Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC - GO), ao Colégio Decisão
e à Faculdade de Anicuns, mas nada que aponte para uma notória
capacidade profissional a ponto de ser responsável por uma organização
social da área de educação, conforme exige a lei.
A entidade diz que aguardará o posicionamento da Seduce.
FAESPE:
Tem como responsável Marlene Falcão Silva Miclos, profissional ligada a
uma fundação de ensino sediada em Goianésia - GO, mas nada que aponte
para uma notória capacidade profissional a ponto de ser responsável por
uma organização social da área de educação, conforme exige a lei.
A Agência Brasil não conseguiu entrar em contato com a entidade.
CONSOLIDAR:
A responsável pela organização, Melissa Nascimento de Barros, é ligada à
Faculdade Cambury, mas nada que aponte para uma notória capacidade
profissional a ponto de ser responsável por uma organização social da
área de educação, conforme exige a lei.
Em nota, Melissa
questionou a avaliação dos ministérios públicos.“Basta analisar o meu
currículo e todas as minhas competências e experiências vivenciadas e se
certificará que estou habilitada para ocupar o cargo”. A responsável
pela entidade diz que já atuou na Universidade Estadual de Goiás, na
Universidade Católica de Goiás, entre outras, e que trabalhou em
projetos educacionais junto ao estado de Goiás e ao governo do Distrito
Federal.
“Sempre procurei estar atualizada sobre os diversos
acontecimentos que causaram repercussão técnica e também política na
área da educação”, acrescentou.
OLIMPO: Tem como
responsável Marcelo de Moraes Melo, proprietário do Colégio Olimpo, mas
nada que aponte para uma notória capacidade profissional a ponto de ser
responsável por uma organização social da área de educação, conforme
exige a lei.
A Agência Brasil não conseguiu entrar em contato com a entidade.