Segunda, 29 de fevereiro de 2016
              Akemi Nitahara - Repórter da Agência Brasil
          
Em carta ao Comitê de Direito das Crianças da Organização das 
Nações Unidas (ONU), a Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Criança e
 do Adolescente (Cdedica) da Defensoria Pública do Estado do Rio de 
Janeiro (DPRJ), junto com outras 25 instituições, denunciaram a prática 
de apreensão irregular de crianças e adolescentes por agentes do estado.
Segundo
 o documento, a apreensão compulsória de meninos e meninas nas ruas da 
cidade ocorre como uma forma de “higienização” preparatória para as 
Olimpíadas Rio 2016, o que viola o direito de ir, vir e permanecer em 
áreas nobres do Rio. De acordo com o texto, “crianças e adolescentes 
negros, pobres e moradores de periferia têm a sua liberdade de locomoção
 e permanência, nos mais variados pontos da cidade, constantemente 
ameaçada por ações desencadeadas no âmbito dos governos estadual e 
municipal”.
O subcoordenador da coordenadoria, o defensor público
 Rodrigo Azambuja, explica que ele e a coordenadora do setor, Eufrásia 
Souza, vêm recebendo denúncias dos conselhos tutelares há pouco mais de 
um ano. Os jovens são levados para a delegacia por equipes da Polícia 
Militar, que chamam os conselhos tutelares para acompanhar os menores.
“Chegavam
 muitos relatos de que os meninos estavam indo para a praia ou algum 
outro lugar, aí eram abordados pela polícia, faziam a revista neles e 
não encontravam nada, mas, mesmo assim, eram levados para a delegacia e 
se constatava que não tinham praticado nenhum crime nem existia ordem de
 prisão contra eles”.
De acordo com Azambuja, foi pedido um 
habeas corpus coletivo para todas as crianças e adolescentes, para 
evitar a repetição dessa prática. Porém, a medida não surtiu efeito. 
“Achamos que as coisas iam se remediar, mas no fim do ano recebemos a 
notícia dos conselhos tutelares da zona sul que teriam ido à delegacia e
 cerca de 20 meninos estavam nessa situação, foram levados pelos 
policiais da operação Aterro Presente, lá se encontravam sem ter 
cometido nenhum crime”.
O defensor não tem o balanço completo de 
quantos adolescentes passaram por essa situação desde o fim de 2014, mas
 lembra que, em um único fim de semana de agosto, foram cerca de 160 levados ilegalmente para a delegacia.
“A
 gente ainda vê esses 'arrastões', de pegar um monte de menino, sob 
alguma justificativa ilegal e levar para a delegacia sem que tivessem 
praticado crime nem tendo ordem judicial. É o Minority Report [filme de 
ficção científica de 2002 em que paranormais visualizam crimes antes 
deles acontecerem e os possíveis criminosos são presos e punidos antes 
do fato se concretizar]. É até possível que algum deles viessem a 
praticar algum delito, mas a gente não pode trabalhar assim, a gente 
acaba tendo algum perfil que é abordado e impedido de ir e vir."
De
 acordo com ele, a justificativa usada é a de que os jovens estavam em 
situação de risco e precisavam de medidas de proteção quando, na 
verdade, o que ocorria era um cerceamento de direitos. Azambuja 
esclarece que os recursos legais no Brasil ainda não se esgotaram, já 
que o assunto está sendo tratado pela Vara da Infância, da Juventude e 
do Idoso da Capital. Contudo, o envolvimento da ONU cira um 
constrangimento internacional ao país para que as medidas sejam tomadas.
“Nós
 estamos externando nossas preocupações. Uma vez constatado esses fatos,
 pedindo que o Comitê faça recomendações à República do Brasil para que 
evite que essas ações ocorram e faça cumprir a convenção da ONU sobre os
 Direitos da Criança, que as medidas de proteção não sejam utilizadas 
com esse viés de cerceamento de direitos”.
Por meio de nota enviada pela assessoria de imprensa da Operação Segurança Presente,
 uma parceria entre a Secretaria de Estado de Governo e a Federação do 
Comércio do Rio (Fecomércio), o governo nega irregularidades nas 
apreensões de crianças e adolescentes.
De acordo com a nota, os 
menores são encaminhados para a delegacia somente quando cometem ato 
infracional e todas as abordagens são filmadas. “No caso de menores em 
situação de vulnerabilidade social, estes são acolhidos por assistentes 
sociais nos locais das Operações Aterro, Lagoa e Méier. Estas ações são 
realizadas com o apoio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento 
Social”.
Também assinam a carta à ONU as seguintes entidades: 
Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente 
(Anced / Seção DCI Brasil); Justiça Global; Centro de Defesa dos 
Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca/RJ); Gabinete de Assessoria
 Jurídica às Organizações Populares (Gajop); Associação Beneficente São 
Martinho; Associação Beneficente Amar; Movimento Moleque; Movimento 
Nacional de Direitos Humanos (MNDH-RJ); Associação Estadual de 
Ex-Conselheiros e Conselheiros da Infância (AECCI); Associação de 
Conselheiros e Ex-Conselheiros Tutelares do Estado do Rio de Janeiro 
(ACTERJ); Organização de Direitos Humanos Projeto Legal; Mecanismo 
Estadual para a Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro; Comitê 
Estadual para a Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro 
(CEPCT-RJ); Associação de Mães e Amigos da Criança e Adolescentes em 
Risco (Amar-RJ); Rede Rio Criança (RRC); Centro de Etno-Conhecimento 
Sócio-Cultural e Ambiental Cauieré (Cesac); Rede de Comunidades e 
Movimentos Contra a Violência; Movimento Candelária Nunca Mais; Centro 
de Teatro do Oprimido (CTO-RJ); Bnai Brith - RJ; Associação Excola; 
Conselho Regional de Serviço Social (Cress-7ª Região-RJ); Pamen-Cheifa; 
Fórum de Juventudes do Rio de Janeiro; e Fórum Social de Manguinhos-RJ.
