Quinta, 12 de
setembro de 2013
Por Ivan de Carvalho
Os índios, especialmente os
norte-americanos que apareciam nos filmes de Hollywood, eram vidrados numa
machadinha. Mas o MST, o mui brasileiro Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra, ampliou o arsenal. Arsenal? Estarei escrevendo sobre isto nas linhas
seguintes.
Em
suas marchas, invasões e ocupações de fazendas, prédios públicos e mais onde
hajam se aventurado, eles portavam, além de alguns estandartes de pano com
inscrições, outros representados por foices, enxadas, picaretas – nas
mobilizações mais amplas, mais de 300, como disse Lula certa vez, se não me
falha a memória – facões, ancinhos, varapaus, facas nada domésticas e machados
(estes, talvez numa assimilação da cultura dos pele-vermelhas
norte-americanos).
Uns
mal encarados agricultores e pecuaristas, do alto de seus tratores e de suas
tribunas (o MST também tem as suas), reclamavam, indignados, que os militantes
ajuntados pelo MST chegavam às cancelas de suas fazendas e frequentemente as
ultrapassavam carregando um arsenal (destinado a intimidar e, se conveniente,
atacar) representado pelos instrumentos de batalha acima citados.
Indignado,
o MST, que liminarmente rejeitava a acusação de que incluía, nem sempre, mas
com frequência, no que os agricultores e pecuaristas chamavam de arsenal,
algumas armas de fogo (revólveres, espingardas de caça), desqualificava a
classificação de arsenal. Terrível essa injustiça de chamar de armas, que em
seu conjunto formariam um arsenal, inocentes instrumentos de trabalho, aqueles
objetos que usavam para cumprir sua penosa faina diária em terra alheia.
Bem,
às 8 horas da manhã de terça-feira, no Centro Administrativo da Bahia, destino
frequentado pelo MST ao longo de muitos anos, um encorpado grupo de militantes
desse movimento social umbilicalmente ligado ao PT, que governa o Estado da
Bahia, ameaça, com seu, digamos assim, arsenal de instrumentos de trabalho,
invadir o prédio da Secretaria de Segurança Pública. E estavam fazendo algum
movimento com a intenção de invadir mesmo, o que, consumando-se, seria
altamente vexatório para o governo. Afinal, não era uma secretaria estadual
qualquer, era a Secretaria de Segurança Pública, cuja missão (infelizmente tão
mal cumprida) é manter o estado em ordem e as pessoas em segurança.
O
MST foi recebido à bala. O subsecretário de Segurança Pública, Ari Pereira,
sacou a arma, aparentemente apontou-a em direção aos manifestantes (a imprensa
diz existir uma foto em que este gesto está registrado), mas na hora de puxar o
gatilho ele apontou a arma para o alto e disparou. Ufa. Não haveria por ali, na
entrada principal da Secretaria da Segurança Pública, um policial fardado. Um
que pudesse dar o tiro dissuasor (ou tiros, há mais de uma versão) que o
subsecretário surpreendentemente deu? Pergunto se não havia ao menos um
soldado, pois de um batalhão de choque (desses que surgem nas manifestações de
rua dissociadas do MST e outros “movimentos sociais”) sabe-se da inexistência
no local. Nesses tempos de espionagem globalizada, fico surpreso, quase
estupefato, ao entender que o governo baiano não sabia que o prédio que comanda
a segurança no Estado da Bahia ia ser invadido às 8 horas da matina.
O
MST tinha uma reivindicação séria e, como disse ontem o governador Jaques
Wagner, é de responsabilidade do governo estadual, “mas não é tão simples,
creio que isto no sentido de que é uma questão complexa. Desvendar o
assassinato de uma liderança do MST, prender o culpado ou culpados e dar ao
caso a devida resolução na esfera do Executivo.
Entre
as declarações que fez ontem a respeito de todo o episódio, o governador,
dizendo que o assunto será apurado, mas já antecipando razões de defesa do
subsecretário Ari Pereira, disse: “Então o pessoal entra de foice, de facão,
invadindo a sede da Segurança Pública, já praticamente entrando no local”.
Foice,
facão... foram-se os instrumentos de trabalho, emergiu o arsenal. Será mesmo
isso, ou entendi mal?
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Este artigo foi
publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é
jornalista baiano.