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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Trocando os nomes

Quarta, 11 de setembro de 2013
Por Ivan de Carvalho
Embora em decorrência de decisão adotada pelos congressistas, entre eles o atual governador Jaques Wagner, ainda existem na Bahia alguns políticos e algumas outras pessoas que insistem em tirar do aeroporto internacional de Salvador (antes chamado de Aeroporto do Ipitanga e depois de Aeroporto 2 de Julho) o nome do deputado Luís Eduardo Magalhães – ex-presidente da Câmara dos Deputados e em grande parte responsável pela modernização do país, especialmente na área da reforma econômica.

Querem porque querem, uma coisa ranzinza, pequenininha, espécie de picuinha. E sem sentido, pois a chamada data magna da Bahia está inscrita em dezenas ou talvez centenas de monumentos, instituições (filarmônicas são dezenas, na heroica cidade de Itiúba, por exemplo, existe quase imemorialmente a Sociedade Filarmônica União 2 de Julho) e “logradouros públicos”. Tem a Praça 2 de Julho, ali em frente ao Teatro Castro Alves, tem o Largo 2 de Julho, ali atrás da Rua Carlos Gomes, tem o Complexo Viário 2 de Julho e se eu quiser citar todas as outras coisas o espaço não vai dar para isso nem para mais nada.

Estão muito bem aquinhoados de homenagens “in memoriam” o 2 de Julho e o deputado Luís Eduardo Magalhães. São coisas sobre as quais não dá nem para discutir, na minha opinião – o desempenho político do deputado e a expressão histórica, para os baianos, do 2 de Julho.

Assim, passo à questão seguinte. O vereador Gilmar Santiago, do PT, pediu o apoio dos vereadores de Salvador, de todas as tendências, para a aprovação do Projeto de Lei nº 260/2012, que destitui daquela importante avenida que liga a Avenida Garibaldi a Ondina o nome de Adhemar de Barros e a denomina de Avenida Milton Santos.

Tenho a mais sincera e forte convicção da justiça e acerto de dar o nome do excepcional geógrafo e demógrafo baiano Milton Santos, mundialmente conhecido, a uma importante avenida de Salvador. Ou até à ponte Salvador–Itaparica, caso o escritor e jornalista João Ubaldo Ribeiro recuse a homenagem, ele que neste caso especial da ponte tem evidente precedência, pelo tanto que viveu, amou e escreveu em Itaparica e sobre Itaparica.

Mas a ponte, se Ubaldo recusar, já que não simpatizou, desde o primeiro momento, com sua construção, seria a homenagem perfeita para Milton Santos, enquanto se trate de homenageá-lo com uma obra viária, ao invés de uma grande biblioteca. Aliás, seu nome na Biblioteca Central dos Barris até ficaria muito bem – desde que recuperem a biblioteca.

Destituir da avenida Adhemar de Barros a denominação atual – mesmo que o vereador autor do projeto haja recebido sugestão de setores da Universidade Federal da Bahia – a mim parece algo um tanto macabro, como se os vereadores fossem em comissão ao cemetério paulista onde Adhemar foi sepultado após ter o corpo trasladado da Europa, após morrer no exílio, depois de ter, em 6 de junho de 1966, seu mandato de governador de São Paulo cassado pelo regime militar cuja ascenção apoiou decididadamente. As revoluções, como Saturno, devoram seus filhos – pelo menos os filhos que detêm liderança e poder importantes. Como Che Guevara.

E lá, nesse cemitério paulistano, os vereadores expulsassem do túmulo os restos mortais de Adhemar, dando-lhe destino semelhante aos gregos que, sem poder pagar ao barqueiro Caronte (se nada havia no “cofre do Adhemar” ou se roubaram o que havia, esta seria a situação), não atravessavam o rio Estige, permanecendo na margem errada e assim privados do seu lugar no Hades, o mundo inferior, dos mortos.

Adhemar de Barros teve vários slogans políticos corretos, mas popularmente houve um que se disseminou no país intensamente: “Rouba, mas faz”. No ambiente político-administritivo em que o país está hoje, esse slogan talvez fosse meritório. Pior é roubar e não fazer. Isso é mais um argumento a favor da permanência do nome.

Consta que Dilma Rousseff participou do planejamento do “cofre do Adhemar”. A ação realmente ocorreu. O resultado é controverso.

Adhemar foi interventor e governador de São Paulo, mais tarde governador eleito outra vez (derrotando Jânio Quadros), duas vezes candidato à presidência da República, derrotado, mas com votação expressiva. Um currículo que impressiona.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
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