Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Mexeu com o Pelourinho, mexeu comigo!

Terça, 31 de dezembro de 2013
Por José Queiroz
Tribuna da Bahia
A Secretaria de Turismo da Bahia, na gestão de Domingos Leonelli, PSB, finalizada nesse fim de ano de 2013, concentrou esforços e recursos em eventos, festas e shows, que são segmentos do turismo, efetivamente, mas não são as principais atrações do estado, muito menos de Salvador. O carnaval da cidade, por exemplo, é um dos principais atrativos, mas não sustenta a cadeia produtiva do turismo o ano inteiro, como o Pelourinho, principal atração e âncora da região. Apenas o que se gasta em um ano no Carnaval, direta e indiretamente, daria para concluir a reforma do Centro Histórico e reaquecer a indústria turística do município por muito tempo.

A prefeitura atual, através da recém criada Secretaria de Desenvolvimento, Turismo e Cultura, chefiada por Guilherme Bellintani, segue o mesmo modelo, e já anunciou 93 eventos até 2017, 30 por ano, e até um segundo carnaval! Os gestores do turismo baiano dos últimos sete anos insistem em mudar o perfil turístico da cidade, gastando um volume de recursos que poderia ser utilizado para deixar a cidade exatamente como baianos e turistas querem: limpa, iluminada, segura, acessível, bem equipada, com bons hotéis, boa mão de obra, e atrações autênticas.


Turistas não viajam apenas por shows, senhor Bellintani! E os profissionais de turismo da cidade sabem disso. Ao contrário, eles têm horror à ‘muvuca’ do carnaval, e assim como os baianos, estão com medo de ir ao Pelourinho, não suportam a indigência e o assédio constrangedores, e não estão seguros à noite. E não há atrações locais como mostra a propaganda do governo, pois o dinheiro que poderia garanti-las está comprometido com grandes festas e cachês absurdos. A prefeitura precisa incentivar a instalação de faculdades e escolas de música no Pelourinho, de percussão, atrair outras, oferecer as praças como laboratório e vitrines para estudantes baianos, brasileiros e estrangeiros. Isto interessa a muitas pessoas, à indústria turística do Brasil e do mundo!

Nenhuma das agências da cidade oferece as festas populares de Salvador, mundialmente conhecidas, apesar da beleza ímpar do cortejo do Bonfim, ou da belíssima procissão de Yemanjá, que turistas podem acompanhá-las. O que se vê entre a celebração ecumênica na Conceição e a Lavagem do Bonfim, e entre o porto de Salvador e o Rio Vermelho - e durante as procissões! - é único, indescritível. Mas falta instalação portuária decente, estacionamento, apoio às companhias de barco, e publicidade para isto. A festa de Santa Bárbara é encantadora, exatamente pelo lugar onde acontece: no Pelourinho enfeitado de vermelho e branco. Prefeitura, produtores e artistas exploram os signos do candomblé sem dar nada em troca, a não ser assistencialismo que só beneficia supostos líderes. Profissionalize-se essa relação – como a música! – pois isto interessa ao turista.

O Réveillon de Salvador 2013/2014 – 04 dias – extrapolou todos os limites! É recorde de festa do gênero para sua sofrida e insegura população, e para o Brasil. E com dinheiro público, sim! Deduzido de recursos das necessidades básicas dos cidadãos, manipulados por empresários, artistas e gestores através da Lei Rouanet, a Lei 8.313, de incentivo à Cultura, que garante dedução para empresas e particulares que queiram ‘patrocinar’ eventos, festas e shows. A lei garante acesso, trabalho e cultura para o cidadão comum, porém, na maioria dos casos, as festas públicas têm os mesmos atrativos, ou são feitas em ambientes fechados, cujo lucro é privado.

Réveillon! Não se fala em outra coisa na imprensa baiana! Nem mesmo na suspeita desapropriação de 364 casarões do Pelourinho, publicada no Diário Oficial no dia 14/12, um dia depois do anúncio do Governo do estado de investimento de R$ 430 milhões no Centro Histórico. A Conder não fez nenhuma vistoria, mas considerou os casarões em ruínas, em ‘péssimo estado de conservação’, sem cumprir suas funções sociais, mas alguns casarões estão muito bem, como o nº 1 da Rua Conselheiro Lafaiete, cuja proprietária Silvia Nuñez alega ter gasto R$ 100 mil reais em recente reforma. O governo vai vender os prédios para a iniciativa privada e colocar o dinheiro em fundo de investimento! Situação parecida com a tentativa da Câmara de Vereadores de aprovar o irregular PDDU em pleno recesso de Natal do ano passado. Câmaras, Assembléias e Congresso vivem tempos de aprovar o que lhes interessa, não à sociedade!                     

Artistas e gestores pseudos socialistas, preocupados muito mais com a diversão do povo que com sua saúde, educação, segurança, formação e trabalho, não hesitam em explorar o dinheiro do contribuinte para ganhar em um dia o que o cidadão comum ganharia em 100 anos. Roberto Carlos foi sensato e pulou fora! Mas, Flora Gil e Paula Lavigne precisam ganhar bem, pois seus artistas já não ganham com gravadoras, nem ganhariam com bilheterias, principalmente depois do apoio dado a tentativa de ganhar dinheiro com biografias ou impedir que elas revelem como se capta dinheiro público para shows. E ainda o apoio aos Black bocks que expulsaram o povo das ruas!  Caetano Veloso poderia retribuir a generosidade do município e levantar a mesma bandeira que levantou no Rio, onde mora: Mexeu com o Pelourinho, mexeu comigo!