Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Uma luta por toda uma vida contra a gordura trans

Terça, 31 de dezembro de 2013 
Em 1957, um cientista de nutrição principiante da Universidade de Illinois persuadiu um hospital a lhe dar amostras das artérias de pacientes que tinham morrido de ataque cardíaco.

Melanie Warner
Do site Controvérsia


A elevada ingestão de alimentos ricos em gordura ruim, aliada ao excesso de peso e sedentarismo, faz crescer o risco de desenvolver doenças cardiovasculare. VERDADE: comer muitos alimentos com gordura saturada ou trans leva à formação de placas nos vasos e, consequentemente, ao desenvolvimento de doenças. "Este quadro favorece a hipertensão e aterosclerose, além de males cardiovasculares como angina, infarto e acidente vascular cerebral", salienta o nutrólogo Wilmar Accursio

Quando ele as analisou, ele fez uma descoberta alarmante. Sem causar surpresa, as artérias doentes estavam cheias de gordura –mas era um típico específico de gordura. Os ácidos graxos artificiais chamados de gordura trans, provenientes dos óleos hidrogenados utilizados em alimentos processados como a margarina, expulsaram e tomaram o lugar de outros tipos de ácidos graxos.

O cientista, Fred Kummerow, realizou em seguida um estudo que encontrou quantidades perturbadoras de placas entupidoras de artérias em porcos alimentados com uma dieta carregada de gordura artificial. Ele se tornou pioneiro da pesquisa de gordura trans, um dos primeiros cientistas a apontar um elo entre doenças cardiovasculares e alimentos processados.


Seriam necessárias mais de três décadas até essas conclusões serem amplamente aceitas –e cinco décadas até a Food and Drug Administration (FDA, a agência de controle de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos) decidir que a gordura trans deveria ser eliminada dos alimentos, como foi proposto em uma regra emitida no mês passado.

Kummerow ainda está ativo aos 99 anos, vivendo a poucas quadras da universidade, onde ele dirige um pequeno laboratório. E ele continua a chegar a conclusões contrárias a respeito de gorduras e doenças cardiovasculares.

Nos últimos dois anos, ele publicou quatro artigos revisados por pares em revistas científicas, dois deles dedicados a outro grande culpado apontado por ele como responsável pela aterosclerose, ou o endurecimento das artérias: um excesso de óleos vegetais polinsaturados como de soja, milho e girassol –exatamente o tipo de gordura que os americanos estão sendo estimulados a consumir nas últimas décadas.

O problema, ele diz, não é a LDL, o "colesterol ruim" amplamente considerado como grande causa de doença cardiovascular. O que importa é se o colesterol e a gordura residente nessas partículas LDL se oxidam. (Tecnicamente, a LDL não é um colesterol, mas partículas contendo colesterol, assim como ácidos graxos e proteína.)

"O colesterol não tem nada a ver com doença cardiovascular, exceto em caso de oxidação", disse Kummerow. A oxidação é um processo químico que ocorre amplamente no corpo, contribuindo para o envelhecimento e o desenvolvimento de doenças degenerativas e crônicas. Kummerow argumenta que as temperaturas elevadas utilizadas na fritura comercial faz com que os óleos polinsaturados inerentemente instáveis oxidem, e que esses ácidos graxos oxidados se transformem uma parte destrutiva das partículas de LDL. Mesmo quando não oxidados pela fritura, os óleos de soja e milho podem se oxidar dentro do corpo.

Se for verdade, a hipótese poderia explicar por que estudos apontaram que metade de todos os pacientes com doenças cardíacas tem nível normal ou baixo de LDL.

100 g de azeite de oliva têm 83,9 g de gorduras insaturadas (73,9 g de monoinsaturadas e 10 g de poli-insaturadas)

"Você pode ter um nível bom de LDL e ainda assim ter problemas, se muita dessa LDL estiver oxidada", disse Kummerow.

Isso o levou a uma conclusão controversa: a de que a gordura saturada na manteiga, queijo e carnes não contribui para o entupimento das artérias –e na verdade é benéfica em quantidades moderadas no contexto de uma dieta saudável (muitas frutas, verduras, legumes, grãos integrais e outros alimentos frescos, não processados).

Sua própria dieta atesta isso. Além de frutas, verduras, legumes e grãos integrais, ele come carne vermelha várias vezes por semana e bebe leite integral diariamente.

Ele não se recorda da última vez que comeu algo frito. Ele nunca usou margarina e come ovos mexidos na manteiga toda manhã. Ele considera o ovo um dos alimentos mais perfeitos da natureza, algo que ele prega desde os anos 70, quando o consumo de ovos cheios de colesterol era considerado uma passagem só de ida para doença cardiovascular.

"Os ovos têm todos os nove aminoácidos necessários para construção das células, mais vitaminas importantes e minerais", ele disse. "É loucura comer apenas a clara. Não é uma prática nada boa."

Sua pesquisa inicial sobre gordura trans foi "amplamente criticada e desprezada", disse o dr. Walter Willett, o presidente do departamento de nutrição da Escola de Saúde Pública de Harvard, que credita Kummerow por instigar seu desejo de incluir a gordura trans no Estudo de Saúde dos Enfermeiros. Um resultado de 1993 desse estudo, que mostrou um elo direto entre o consumo de alimentos contendo gordura trans e doença cardiovascular em mulheres, foi um ponto de virada no pensamento médico e científico a respeito da gordura trans.

"Ele teve grande dificuldade em obter fundos, porque a prevenção de doença cardiovascular resistia fortemente à ideia de que as gorduras trans eram o problema", prosseguiu Willett. "No entender deles, as gorduras saturadas eram as grandes culpadas na doença cardiovascular. Qualquer outra coisa era uma distração."

Em uma era em que a própria vida é uma realização, Kummerow disse não ter intenção de abandonar o trabalho ao qual dedicou seis décadas. Ele continua trabalhando em casa e conversa diariamente com dois cientistas que trabalham em seu laboratório, que é financiado pela Fundação Weston A. Price.

AZEITE DE OLIVA - O azeite de oliva ajuda a reduzir o colesterol e possui anti-inflamatórios naturais e ação antixoxidante. A informação é do programa "Meu Prato Saudável", parceria do Instituto do Coração (InCor) e do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP com a LatinMed Editora em Saúde

Sua esposa por 70 anos, Amy, morreu no ano passado aos 94 anos de mal de Parkinson; ele tem três filhos, três netos e um bisneto.

Ele não toma medicamentos e sua mente não exibe sinal de envelhecimento. Ele tem uma memória enciclopédica para nomes, datas e, mais impressionante, conceitos científicos complexos. Após seus músculos ficarem inflamados devido a um medicamento para pressão sanguínea que ele então parou de tomar, ele começou a usar uma cadeira de rodas combinada com um andador.

Seu problema de saúde mais significativo, apropriadamente, foi um bloqueio arterial aos 89 anos –provavelmente em consequência dos efeitos inevitáveis da velhice, não da dieta.

Uma cirurgia resolveu o bloqueio e o fato de agora ter uma artéria de seu braço em seu coração o deixou ainda mais determinado a continuar trabalhando. Doença cardiovascular continua sendo a principal causa de morte de americanos, e ele deseja permanecer por aqui para continuar financiando pesquisa que ajude e mudar isso.

"O que eu realmente quero ver é o desaparecimento da gordura trans", ele disse, "e as pessoas comerem melhor e terem um entendimento mais preciso do que realmente causa doença cardiovascular".
Tradução: George El Khouri Andolfato