Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 7 de junho de 2014

IHUnisinos: Uma Copa para assistir pela televisão. Entrevista especial com Édison Gastaldo

Sábado, 7 de junho de 2014
“O projeto para as ditas classes populares parece ser o que corresponde à mensagem ‘fiquem nos seus lugares assistindo pela televisão’”, avalia o antropólogo. 

    “No Brasil, a mídia e o esporte têm uma construção que chamamos de reflexiva: o esporte constrói o campo das mídias, e o campo das mídias constrói o campo do esporte. [...] O futebol cresceu e se autonomizou, ganhou caderno especial, virou jornal especializado. E agora, em época de Copa do Mundo, ganha caderno diário de 16 páginas a cores só sobre o Mundial. Há um vasto investimento editorial neste campo, que obviamente constrói a audiência de 97% [nos jogos da seleção brasileira]. Este fenômeno de audiência é um fenômeno midiático. O futebol é hoje, para a maior parte das pessoas, um programa de televisão”, analisa o publicitário e antropólogo Édison Gastaldo.

     Nesta entrevista, concedida por telefone à IHU On-Line, Gastaldo avalia a relevância do futebol na construção de uma identidade e cultura nacionais, a participação do Estado na consolidação e nos resultados desta modalidade esportiva e o projeto socioeconômico que orienta a concepção dos novos estádios do país, erguidos para a Copa ou não. “O que está acontecendo hoje no Brasil é um processo de aburguesamento do estádio de futebol. Está se dando muita atenção para estacionamento, coisa que nunca foi problema no Maracanã, por exemplo. As pessoas iam ao estádio de trem, de ônibus, usando o transporte público. As pessoas que frequentavam o estádio não iam de carro. Agora estão sendo oferecidos estacionamentos cobertos e manobristas e elevadores e shopping center, caracterizando o processo de aburguesamento destes empreendimentos imobiliários, a partir da definição do público-alvo pelas organizações que constroem e administram os novos estádios, as lojas e shoppings, as arenas multiuso, conforme o projeto de exploração econômica daquele espaço. Há aí, portanto, um projeto capitalista claramente colocado”, enfatiza o docente.

Édison Luis Gastaldo possui graduação em Comunicação Social – Habilitação em Publicidade e Propaganda pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, mestrado em Antropologia Social pela mesma instituição, doutorado em Multimeios pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP e pós-doutorados em Sociologia pela University of Manchester, Inglaterra, e em Antropologia Social pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.

    Atualmente é professor adjunto no Departamento de Letras e Comunicação da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ e professor permanente no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFRRJ. É autor dos livros Pátria, Chuteiras e Propaganda: o brasileiro na publicidade da Copa do Mundo (AnnaBlume/Unisinos, 2002), Erving Goffman, desbravador do Cotidiano (Tomo Editorial, 2004), Nações em Campo: Copa do Mundo e identidade nacional (com Simoni Guedes, Intertexto, 2006) e Publicidade e Sociedade: uma perspectiva antropológica (Sulina, 2013).

Confira a entrevista.

    IHU On-Line - Qual é a importância do futebol para os brasileiros?

    Édison Gastaldo - Esta é uma relação histórica que vem sendo construída desde os anos 1930. É uma longa história que, por uma série de ações do Estado e por um gosto popular pelo futebol, foi se desenvolvendo no sentido forte de que o futebol expressa a brasilidade.

    Tem papel importante nesta leitura a obra de intelectuais como Mário Filho e Gilberto Freyre. Este último, por exemplo, publicou em 1938 um artigo no Diário de Pernambuco chamado Football mulato, sobre o desempenho brasileiro na Copa do Mundo realizada naquele ano, quando ficou em terceiro lugar, e teve o goleador da competição e o melhor atleta: o jogador Leônidas, o Diamante Negro. Foi um feito extraordinário para o futebol brasileiro da época.