Segunda,
14 de julho de 2014
Carolina Gonçalves -
Repórter da Agência Brasil
Sem a presença de representante do governo ou de
instituições como Ministério Público e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
representantes de movimentos sociais fizeram, em audiência no Senado, críticas
à criminalização dos movimentos sociais. Tramita no Legislativo projeto para
alterar o Código Penal e reprimir crimes ocorridos em manifestações ou
concentração de pessoas. Desde a série de protestos que começou em junho de
2013, alguns parlamentares vêm defendendo a aprovação do projeto. A ideia era
aprovar o texto antes da Copa do Mundo, mas a falta de consenso em torno da
matéria adiou a decisão.
“A Copa passou, o projeto não foi aprovado e não houve nada
daquilo que os pregadores do caos diziam que iria acontecer em matéria de
violência contra os nossos convidados. Não houve violência alguma contra os
convidados que vieram assistir à Copa no Brasil”, avaliou o senador Paulo Paim
(PT-RS), que presidiu o debate na Comissão de Direitos Humanos.
O texto propõe o aumento da pena para crime relacionado ao
patrimônio, permite que a autoridade policial possa investigar os danos e
qualifica o homicídio praticado nas manifestações, prevendo pena com reclusão
de 12 a 30 anos e eleva em até 50% a pena para lesão corporal cometida naquelas
circunstâncias. O uso de máscara, capacete ou qualquer outro utensílio ou
expediente destinado a dificultar a identificação, segundo o substitutivo,
seria um agravante para a pena. Por fim, tipifica o dano ao patrimônio público
ou privado praticado durante manifestações públicas. Se aprovado, a pena será
de reclusão de dois a cinco anos, além de multa.
Paim lembrou que é a terceira vez que o colegiado se reúne
para ouvir as diversas posições sobre o assunto. “Somos totalmente contra
qualquer tipo de criminalização dos movimentos sociais. Entendemos ser legítimo
o direito de protesto e de mobilização. Eu mesmo aplaudi muito as jornadas de
junho e julho, quando o povo foi à rua, protestando e exigindo mais
investimento em saúde, educação, habitação, saneamento básico”, disse.
Os representantes dos movimentos sociais e sindicalistas
reiteraram o posicionamento unânime em torno da discussão. As críticas se
basearam principalmente no cerceamento ao direito de expressão e nos interesses
de governos e iniciativa privada em abafar os protestos.
“Estamos vendo um recrudescimento, um avanço de várias
violações de direitos de manifestação e direitos de atividade política”, disse
Lucas Brito, que integra a executiva da Assembleia Nacional de Estudantes
Livres. Ele lembrou que em junho milhões de pessoas foram às ruas para lutar
contra o aumento das tarifas do transporte, “mas, de fundo, estava colocada uma
insatisfação política com a situação que vivemos no Brasil. Porque não é à toa
que a população saiu às ruas levantando cartazes de que aqui nós queremos um
padrão da Federação Internacional de Futebol (Fifa) para educação, para saúde”,
completou.
Brito citou a prisão de 19 ativistas no último final de
semana, suspeitos de envolvimento em atos violentos em protestos no Rio de
Janeiro. Segundo ele, “estão sendo presos por terem sido confundidos com
vândalos. Nós somos ativistas políticos e não vândalos”, protestou. Para o
estudante, a ação de repressão é uma tentativa clara de enquadrar a ação dos
movimentos sociais e das entidades sindicais como uma ação terrorista. “Temos
uma grande contradição, hoje, no país: ao passo em que os movimentos sociais
avançam na sua luta desde junho do ano passado e mostraram que é preciso lutar
e que é possível vencer, temos, de outro lado, uma movimentação para calar a
nossa voz”.
Mesmo reconhecendo que o medo impediu muitos manifestantes
de participar de protestos durante a Copa, o estudante avaliou o movimento como
vitorioso. “Somos nós que estamos ganhando porque o que eles queriam é que a
gente tivesse ficado com medo e voltasse para casa. Queriam nos calar, queriam
nos amedrontar. E seguimos em frente. Chegamos até aqui fazendo luta, fazendo
mobilização”, avaliou.
O coordenador do Fórum Sindical dos Trabalhadores, Lourenço
Ferreira Prado, lembrou que as manifestações vem sendo feitas há anos como
instrumento de luta por conquistas de direitos trabalhistas e sociais. “Mas, o
Estado de hoje, mais do que o de ontem, utiliza seus agentes civis e militares
para reprimir toda e qualquer manifestação, sob a falsa e conhecida alegação de
que é mantenedor da boa e necessária ordem política e social, mediante a
segurança pública”, criticou.
Representante da Força Sindical em Brasília, Maria Antônia
Rodrigues defendeu a adoção de políticas mais sérias voltadas para o
trabalhador. “Ir para rua, levar aposentados, levar trabalhador para ir lutar
por essa causa, isso é crime? Eu não sei mais. Tem hora que eu não sei mais
definir o que é crime, para estar se criando uma lei como essa. Crime maior do
que você ver, depois de tantos anos de luta, o seu salário corroído?”,
comparou.
Pois é, o gigante não conseguiu se levantar nem desta vez. A
sensação é que voltará a roncar, que a democracia tão almejada continua uma
ingênua “criança” engatinhando em volta de seu “berço esplêndido”. Mais
lágrimas, não só de torcedores, marcam “a maior derrota”.
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