Sábado, 13 de fevereiro de 2016
Estadão conteúdo/ foto: linkedln
e Blog do Sombra
Na reta final da coleta de 1,5 milhão de assinaturas de apoio ao
projeto 10 Medidas contra a Corrupção e próximo de completar 2 anos da
fase ostensiva da maior investigação sobre malfeitos no País, Carlos
Fernando dos Santos Lima diz não ter dúvidas de que força-tarefa atingiu
'grande esquema de compra de apoio político partidário através do
loteamento de cargos públicos'. ...
Próximo de completar 2 anos de sua fase ostensiva, a Operação Lava Jato
atingiu a ‘maturidade’. Considerando ter chegado a um “grande esquema
de compra de apoio político partidário” originado nas “altas esferas do
Governo Federal”, o procurador Regional da República Carlos Fernando dos
Santos Lima, que integra a força-tarefa do Ministério Público Federal,
avalia que, mesmo que as investigações fossem interrompidas agora,
“ainda haveria trabalho para muitos anos”, dentro e fora da Petrobrás.
“Novas estatais virão. Novos bancos virão. Fundos de pensão virão”,
afirmou um dos mais experientes dos 11 procuradores do grupo da Lava
Jato, em Curitiba – cérebro das apurações – em entrevista ao Estado.
Perplexos – eles também! – com o incrível e audacioso esquema de
corrupção identificado na Lava Jato, os procuradores esboçaram um
projeto que denominaram 10 Medidas contra a Corrupção, com amplo apoio
da Procuradoria Geral da República. O projeto está nas ruas, em busca da
adesão popular. O sistema exige 1,5 milhão de assinaturas para que a
Câmara acolha esse tipo de iniciativa. Foi assim na Lei da Ficha Limpa.
O 10 Medidas contra a Corrupção, segundo esperam os procuradores,
permitirá agilização no combate às fraudes e desvios de recursos
públicos e redução do quadro de impunidade do colarinho branco,
Na entrevista ao Estado, o procurador regional da República Carlos
Fernando dos Santos Lima destaca que o esquema descoberto na Lava Jato
não se restringe a ‘uns três diretores da Petrobrás’.
Ele falou sobre o manifesto subscrito por dezenas de juristas
renomados, entre eles muitos defensores de réus da Lava Jato, que
atacaram a investigação, no início do ano. “O choro é livre em nosso
País.”
Estado – Próximo de completar dois anos de fase ostensiva, pode-se dizer que a Lava Jato está em sua fase final?
Carlos Fernando dos Santos Lima – Vamos dizer que a Lava Jato alcançou
sua maturidade. Significa que há muito a se fazer. Creio que hoje
ninguém mais põe em questionamento a existência de um grande esquema de
compra de apoio político partidário através do loteamento de cargos
públicos importantes para que os partidos da base pudessem “fazer”
dinheiro para suas campanhas. Mostrar isso era importante. Era preciso
sair da Petrobrás para que não fosse dito que o esquema era apenas de
uns três diretores corruptos. Assim fomos para a Eletronuclear, Belo
Monte, CEF (Caixa Econômica Federal), e outras estatais, sempre com o
objetivo de investigar esse esquema, que em si, é o mesmo. Infelizmente
houve a decisão do caso Pixuleco e do caso Eletronuclear deixando de
reconhecer essa conexão entre todos eles. Mas a força tarefa Lava Jato
ainda pretende demonstrar além de qualquer dúvida razoável – apesar de
ser quase de conhecimento público – que todo esse esquema originou-se
dentro das altas esferas do Governo Federal.
Estado – Que rumos tomarão as investigações da força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba, em 2016?
Carlos Fernando – Há muito que fazer ainda na área investigativa. Novas
estatais virão. Novos bancos virão. Fundos de pensão virão. É claro que
enfrentaremos dificuldades, especialmente aquelas criadas pelo próprio
Governo, como no caso da lei de repatriamento e na MP 703, que alterou a
Lei Anticorrupção, tornando-a uma lei criminogena, uma lei que
incentiva a prática corrupta, pois permite que aqueles que sejam pegos
possam escapar pelo simples pagamento de multas.
Além disso, há muito ainda a se investigar na própria Petrobras. Áreas
inteiras, com orçamentos bilionários, em que há indicativos de
irregularidades.
Muito há o que fazer, portanto. Mesmo que parássemos hoje de
investigar, ainda haveria trabalho para anos. Ainda há muitas denúncias a
oferecer, muitos processos para acompanhar, muitos recursos para
interpor e responder. Mas é para isso que existe o Ministério Público.
Estado – As delações premiadas e as prisões cautelares têm sido os
principais focos de ataques vindos das defesas dos réus e investigados
ao trabalho da força-tarefa da Lava Jato. Qual critério se usa para
adotar tais mecanismos de investigação? E dentro do conjunto de provas
levantado, qual sua importância e efetividade.
Carlos Fernando – A colaboração, assim como a leniência das empresas,
visa produzir provas e criar atalhos na investigação. Ao invés de
ficarmos perdendo tempo e recursos elaborando hipóteses investigativas, a
colaboração acelera as investigações. E o número delas apenas indica o
quão amplo é o espectro da investigação, pois somente há interesse em
uma colaboração se ela trouxer fatos novos, outros crimes além daqueles
já conhecidos. Assim, os colaboradores devem falar sobre o que já
sabemos que fizeram, mas também trazer depoimentos e provas que nos
levem a um novo patamar na investigação. Dessa forma, não há colaboração
em atacado, mas muitos crimes desvendados.
Agora, é evidente, até pelo próprio texto legal, que ninguém pode ser
acusado somente com a palavra do colaborador. São necessárias provas, ou
pelo menos indícios diversos e conducentes a uma mesma conclusão, para
procedermos a uma acusação e conseguirmos uma condenação. Assim tem sido
feito com êxito desde a Operação Banestado, quando inauguramos essa
técnica especial de investigação.
Estado – No começo do ano um grupo de advogados divulgou manifesto
atacando suposto “regime de supressão episódica de direitos e garantias
verificado na Operação Lava Jato”. Chegam a afirmar que “magistrados das
altas cortes do País estão sendo atacados ou colocados sob suspeita
para não decidirem favoravelmente aos acusados em recursos e habeas
corpus”. Contraponto, o índice de revisão das decisões do juiz federal
Sérgio Moro é baixo, de cerca 2%. Qual leitura o senhor faz desses
números diante das críticas, que chegaram a comparar a Lava Jato com o
período do regime militar?
Carlos Fernando – Penso que muitos advogados vivem de vender seu
passado. Não há a mínima analogia entre a ditadura e o Brasil de hoje.
Vivemos num país de excesso de recursos, infindáveis habeas corpus,
embargos de embargos de embargos, etc… Nosso país tem a fama da
impunidade, e é ela merecida. Mesmo assim, ainda há possibilidade de se
fazer um bom trabalho. As críticas soam familiares, pois são repetições
do que aconteceu durante o mensalão. Os números absolutos de habeas
corpus e recursos na Lava Jato mostram que há, em verdade, um abuso do
uso desses recursos em nosso país, e o Ministério Público tem proposto,
dentre outras medidas contra a corrupção, uma racionalização desse
sistema.
Quantos às críticas, penso que ataques genéricos, sem a coragem de
nominar pessoas ou apontar fatos concretos, somente desqualifica o
manifesto. Mas, é claro, o choro é livre em nosso país.
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10 medidas contra a corrupção