Quarta, 17 de fevereiro de 2016
Adriano Benayon *
No
artigo anterior, avaliei que as saídas não emergem das discussões entre
economistas monetaristas, autointitulados liberais, versus keynesianos.
2.
Quais são os problemas maiores? Desemprego, aperto financeiro e dívida
pública imensa, em contraste com a abundância de recursos naturais e de
gente querendo trabalhar e progredir na vida.
3.
Há que tratar da produção e da finança em conjunto. Finança não é
problema: cria-se crédito e emite-se moeda para realizar as produções
necessárias ao desenvolvimento econômico e social.
4.
Este deve ser assim definido: o progresso em atender as necessidades
reais da população, inclusive defesa e segurança, por meio da produção
de bens e serviços, realizada no País com tecnologia e capitais
nacionais, sem deteriorar o ambiente, e até recuperá-lo.
5. Haveria que erguer os órgãos de planejamento, financiamento e promoção das empresas agentes dessa construção:
1) empresas privadas em competição, basicamente médias e pequenas, e cooperativas formadas por pequenas e micro;
2) estatais
e mistas, nas indústrias de base e na infraestrutura, regidas sob
estatuto orientado pelo mérito, admitidas demissões, se comprovado o
descomprometimento com a elevação da qualidade e outros objetivos
essenciais.
6.
Tal composição pressupõe a criação de órgãos de defesa econômica
aparelhados para assegurar concorrência legítima nos mercados, avaliar
a administração das estatais e mistas, e influir nela. Há que vedar
aquisições por empresa estrangeira e modificar o conceito desta na
Constituição.
7.
Conjuntos de empreendimentos formariam o setor produtivo em interação,
desenvolvendo o mercado interno, em patamar superior de tecnologia, com
conexões intersetoriais e apoio das estatais e mistas e da política
econômica.
8.
Estimular-se-iam, nesse patamar, indústrias baseadas em experiências
anteriores à desindustrialização (a produção industrial, 35% do PIB nos
anos 80, caiu a 10%). Também, novas produções de consumo para
necessidades reais desatendidas (em lugar das artificiais criadas pelo
marketing); e dos respectivos bens intermediários e de capital.
9. A infraestrutura tem de ser reorientada em função das interações no mercado interno, da lógica dos recursos naturais e posição geográfica deles e das regiões utilizadoras.
10.
Indispensável fomentar indústrias de alta tecnologia, como
aeronáutica/espacial; eletrônica e informação; nuclear; defesa;
materiais estratégicos, como petróleo, terras raras, nióbio e quartzo e
seu aproveitamento em bens intensivos de tecnologia.
11.
Na infraestrutura: 1) ênfase na energia de biomassa, com produção
descentralizada, combinando alimentos, etanol, óleos vegetais e seus
subprodutos, bases de nova química; 2) energia hidroelétrica, eclusas e
integração com os transportes aquaviários, sem ingerências
pseudoambientalistas e indigenistas a serviço de potências imperiais; 3)
desenvolvimento de linhas de transmissão; 4) estatizações no setor
elétrico e supressão do escandaloso sistema tarifário atual; 5)
proibição de novas termoelétricas; 6) substituição de importações dos
equipamentos de energia solar e eólica, desenvolvendo-os em escalas
menores e melhor tecnologia; 7) destinação do petróleo a usos mais
nobres, à medida que a biomassa assegure o fornecimento de combustíveis
líquidos; 8) nacionalização do petróleo e da petroquímica; 9)
desenvolvimento de tecnologias de transportes interestaduais e urbanos
de massa, trens de velocidade, metrôs e mais meios econômicos e não
poluentes; 10) fomento a empresas nacionais de transportes fluviais,
marítimos, ferroviários e aeronáuticos; 11) constituição de empresas
nacionais e estatais de telecomunicações estratégicas.
12.
Na economia agrária, inclusive o programa da biomassa descentralizada,
criação de empregos de qualidade, prioridade ao suprimento da demanda
alimentar interna e de matérias-primas para a indústria nacional.
Excluir sementes transgênicas e limitar fertilizantes químicos e
agrotóxicos; preservar matas ciliares, nascentes e solos. Mineração com
objetivos semelhantes.
13.
Não haverá dificuldade de realizar os investimentos para esses
empreendimentos, que poderão ter, em 5 a 10 anos, massa bastante para
caracterizar um país em franco desenvolvimento.
14.
De fato, este não surge tanto de dinheiro, como de realizações
concretas, articuladas num conjunto de interações. Não há lógica em
imaginar que possa ser de outro modo.
15.
O Brasil precisa ganhar expressão tecnológica, antes de retomar maior
volume de comércio externo. Ponto importante é abandonar o apego a
manter o País em organizações internacionais que o atam a acordos
inconvenientes, como os da OMC.
16.
Cumpre revogar a Lei de Propriedade Industrial de 1996, que reforça as
disposições leoninas dos Acordos da OMC (1994/1995), e promove o atraso
tecnológico do Brasil.
17.
Também as regras de comércio têm de ser objeto de revisão, inclusive
reinstituindo a Lei de Valoração Aduaneira, suprimida pelos acordos do
GATT.
18.
Os acordos de comércio têm de ser celebrados com base no interesse dos
contratantes. O TPP (TransPacific Partnership), promovido pelos EUA,
nem merece consideração: visa a radicalizar um tipo de relações
internacionais intolerável, chegando a submeter Estados nacionais a
tribunais arbitrais das transnacionais.
19.
Impõe-se expurgar da Constituição a Emenda Kandir, que isenta de
tributos as exportações de produtos primários, ficando a mineração
sujeita desprezível imposto sobre o faturamento da extração, estimulando
as mineradoras a superfaturar despesas.
20.
A hecatombe de Mariana ilustra a insana e corrupta privatização da
Vale, em 1997, até hoje mantida sub judice, e salienta o despautério de
incentivar a extração de minérios, destrutiva do solo, subsolo, águas e
terras adjacentes.
21.
A associação da Vale com a mineradora anglo-australiana BHP, na
Samarco, exemplifica a regra: carteis transnacionais, liderados por
gigantes britânicas, controlando os minérios estratégicos e preciosos,
abuso que está sendo ampliado com a demarcação de imensas reservas
indígenas e ambientais, na Amazônia, por pressões imperiais.
22.
O favorecimento à devastação, sem retribuição, do solo e subsolo deve
ser substituído pela exploração por empresas nacionais, tributada
considerando a natureza não-renovável dos recursos e serem eles
indispensáveis à produção de bens de elevado valor agregado.
23.
São outras fontes óbvias de arrecadação, sem falar na cobrança dos
débitos fiscais: 1) tributar rendas financeiras, como dividendos e
títulos de renda fixa, em nível, no mínimo, igual ao da alíquota mais
alta do IRPF; 2) suprimir subsídios federais, estaduais e municipais em
favor de montadoras de veículos automotores, entre outros feudos de
carteis transnacionais.
24.
Economistas pró-sistema de poder reinante condenam o governo por abrir
mão de R$ 264,3 bilhões em isenções ou reduções tributárias por ano, mas
só aludem às que favorecem pequenas e micro empresas.
25.
Sobram, pois, recursos financeiros para grande programa dos
investimentos produtivos, sem necessidade de criar moeda e crédito,
mormente eliminando gastos indevidos e improdutivos, como o “serviço da
dívida” pública interna, que cresce exponencialmente, sendo pago com
novos títulos.
26.
Convém desindexar os títulos da dívida interna e fixar para eles juros
de nível mundial: isso implica reduzir-lhe o serviço de 17,5% para 3%
aa. 14,5 pontos percentuais sobre R$ 3 trilhões implica economia de R$ 435 bilhões.
27.
Maior economia, ainda, resultará da urgente auditoria da dívida pública
externa e interna, nos moldes da realizada no Equador, de que
participou a brasileira Maria Lucia Fattorelli.
28.
Se tudo isso não bastasse, poder-se-ia, sem problema algum, custear os
investimentos mediante emissão de moeda e/ou de crédito por bancos
públicos (impondo-se acabar com o art. 164 da Constituição).
29.
Aos que se escandalizam com déficits orçamentários, lembre-se que os
EUA saíram da depressão econômica de 1929 a 1941, convocando 14 milhões
para servir nas Forças Armadas e financiando investimentos de armas e
equipamento industrial e militar.
30.
Os déficits federais resultantes, nos anos 1942/44, foram mais de 100%
do PIB, e nada de grave aconteceu com as finanças estadunidenses. Já os
que programaram amarrar a Europa, submeteram-na, pelo Tratado da União
Europeia, em 1992, ao déficit máximo de 3% do PIB.
31.
Poderíamos mesmo importar técnicos e engenheiros - estrangeiros e
brasileiros - para se fixar entre nós, e fazer investimentos pesados em
segurança pública e na defesa. Convocar para o serviço militar, a curto
prazo, um milhão de jovens, até para se educar na disciplina, alguns
para colaborar em obras públicas. Além disso, engajar um milhão de
professores em programas de educação em tempo integral.