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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

STF: Relatora Rosa Weber vota pela inconstitucionalidade de norma que permite produção de amianto

Quinta, 17 de agosto de 2017
                                   Foto publicada no site VIOMUNDO
Aldo Vicentin, vítima do amianto,  na UTI do Incor, após a 
cirurgia; quinta-feira, 3 de julho de 2008, às 9h30, ele faleceu.

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Do STF
Relatora vota pela inconstitucionalidade de norma que permite produção de amianto

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quinta-feira (17), o julgamento sobre a constitucionalidade de dispositivo da Lei 9.055/1995 (artigo 2º) que disciplina a extração, industrialização, utilização e comercialização do amianto crisotila (asbesto branco) e dos produtos que o contenham. Única a proferir voto na sessão de hoje, a relatora da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4066, ministra Rosa Weber, se posicionou pela inconstitucionalidade da norma que considera em desacordo com os preceitos constitucionais de proteção à vida, à saúde humana e ao meio ambiente, além de desrespeitar as convenções internacionais sobre o tema das quais o Brasil é signatário.

Preliminar
A ação foi proposta pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e pela Associação Nacional do Procuradores do Trabalho (ANPT), cuja legitimidade ativa para propor ADI sobre o tema foi questionada pela Advocacia-Geral da União. Segundo a AGU, as entidades não estariam legitimadas porque as atividades fins de seus membros não guardam relação direta com a norma impugnada.

Por maioria, prevaleceu o entendimento da ministra Rosa Weber, no sentido de que as associações possuem vínculo de pertinência com o assunto, pois além da defesa dos interesses corporativos de seus associados, as entidades têm entre suas finalidades institucionais a proteção à saúde e segurança dos trabalhadores, o que também se observa nas missões dos integrantes das duas categorias profissionais. Ficaram vencidos os ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, que entendem não haver legitimidade em razão de ausência de pertinência temática.

Voto
A ministra destacou a existência de um consenso científico em relação aos males à saúde causados pela exposição ao amianto, especialmente quanto a seu potencial como agente cancerígeno. Em seu entendimento, ainda que se pudesse admitir a constitucionalidade da lei à época em que foi editada, “não é mais razoável admitir, à luz do conhecimento científico acumulado sobre a extensão dos efeitos nocivos do amianto para a saúde e o meio ambiente, e a evidência da ineficácia das medidas de controle da Lei 9055/1995, a compatibilidade de seu artigo 2º com a ordem constitucional de proteção à saúde e ao meio ambiente”, afirmou.

Segundo a relatora, o direito à liberdade de iniciativa, previsto na Constituição, não impede a imposição pelo Estado de condições e limites para o exercício de atividades privadas, que deve se harmonizar com os demais princípios fundamentais. No caso da produção do amianto, observa a relatora, a compatibilização deve ocorrer com o dever de assegurar a proteção à saúde pública e um meio ambiente equilibrado. Em seu entendimento, não é possível considerar que os direitos fundamentais sociais ou coletivos tenham proteção menor em relação aos direitos individuais.

Ela lembrou que, segundo a Constituição Federal de 1988, a saúde é um direito social de todos, não se reduzindo a um mero caráter assistencial, mas abrangendo também o direito à prevenção inclusive no local de trabalho. “Os preceitos constitucionais que elevam a saúde à categoria de direito social incumbem ao Estado o dever de garanti-la mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e assegure aos trabalhadores a redução de riscos no trabalho e adoção de agenda positiva para a proteção desses direitos”, argumentou.

A ministra salientou que a Convenção 162 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata do banimento do amianto, admite a continuidade de sua produção em determinadas condições, sempre regulamentada por meio de lei, mas orienta a substituição progressiva à medida em que surjam tecnologias alternativas. Observou que a convenção, que tem status de norma supralegal no Brasil, prevê a atualização periódica da legislação, mas que isso não ocorreu pois a Lei 9055 já tem mais de 20 anos de sua promulgação.

A relatora considera que a norma impugnada, embora pudesse ser constitucional em 1995, não detém o mesmo status atualmente. Segundo ela, não é possível expor os trabalhadores ao risco de uma doença laboral unicamente para potencializar a capacidade produtiva de uma empresa ou determinado setor econômico. Em seu entendimento, cada vez que um processo produtivo se revele um perigo para a saúde do profissional, o empregador deverá reduzir, até o limite máximo oferecido pela tecnologia, os males causados ao trabalhador. “Quando, porém, os incômodos forem de tal monta a ponto de minar a saúde do trabalhador, havendo um conflito entre a exigência produtiva e o direito, este último deverá prevalecer”, sustentou.

A ministra propôs, ainda, a seguinte tese: “A tolerância ao uso do amianto crisotila, da forma como encartada no artigo 2º da Lei 9.055/95, é incompatível com os artigos 7º, XXII, artigo 196 e 225 da Constituição Federal”.
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Memória:
  

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