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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 29 de março de 2019

Membros do Ministério Público Federal visitam o Conjunto de Favelas da Maré, no Rio de Janeiro

Sexta, 29 de março de 2019
Do MPF
Atividade da Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional colheu relatos de moradores e fiscalizou violações de direitos
Foto mostra um grupo de pessoas posando em frente a um muro com arte grafite
Fotos: Adriana Medeiros
Coordenador da 7ª Câmara, o subprocurador-geral da República Domingos Silveira destacou que o objetivo do MPF era ouvir e conhecer a realidade da comunidade. “Fomos conhecer a Maré para entender melhor a dor que a comunidade sente, pisar no mesmo chão. E, a partir disso, atuar de maneira mais incisiva no acompanhamento de investigações de violações de direitos. Nosso papel principal é jogar luz sobre as violações de direitos humanos”, explicou aos moradores. O Conjunto de Favelas da Maré é considerado o maior do Rio Janeiro e abriga mais de 132 mil moradores espalhados em 17 favelas, segundo dados do Censo Maré 2000.Representantes do Ministério Público Federal (MPF) visitaram na quarta-feira (27) o Conjunto de Favelas da Maré. O objetivo da ação – a primeira realizada pelo órgão no Rio de Janeiro – foi conhecer de perto a realidade local, colher relatos dos moradores e fiscalizar violações de direitos humanos pelas quais passam as populações das favelas. A visita foi promovida pela Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional (7CCR) do MPF. Também integrou a comissão do MPF a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão no Rio de Janeiro.

A procuradora regional dos Direitos do Cidadão no Rio de Janeiro, Ana Padilha, explicou a atuação do MPF: “Nós trabalhamos em conjunto com o Ministério Público Estadual [MPE] e atuamos nas causas federais ou quando há agentes federais envolvidos”. Como exemplo, ela citou a recente intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro. “Naquele caso, era muito clara a nossa atribuição”, destacou.
Além do MPF, também participaram da atividade representantes da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Alerj, o MPE, integrantes dos movimentos de favelas de dentro e fora da Maré, instituições da sociedade civil que desempenham atividades na Maré, familiares de vítimas da violência policial, advogadas populares e defensores dos direitos humanos.
Relatos – Durante a visita, os membros do MPF visitaram escolas, ouviram moradores, conversaram com movimentos sociais e promoveram uma reunião com a comunidade no Museu da Maré. Em um dos relatos, a moradora Flávia Cândido lamentou a ausência de políticas públicas nas favelas cariocas. “O braço do Estado chega apenas de forma violenta e não dá conta de garantir nossas necessidades de moradia, saneamento, segurança, educação, entre tantas outras”, afirmou.
Após a visita, os movimentos sociais da Maré escreveram uma nota sobre a ida dos procuradores à região. No texto (veja íntegra abaixo), os moradores ressaltaram a importância do diálogo direto entre autoridades públicas e comunidades. “Essa reunião possibilitou o vínculo e canal aberto com o MPF, PRDC e todas as institucionalidades estatais com a finalidade de construirmos de forma articulada a responsabilização de quem viola nossos direitos cotidianamente, o Estado”, diz. Durante a atividade, enquanto acontecia uma reunião no Museu da Maré, os participantes foram surpreendidos com uma operação da Polícia Civil e vivenciaram na prática a rotina dos moradores.
dr. domingos na maré
Roteiro – O Colégio Estadual Professor João Borges de Moraes, escola técnica de ensino médio situada no complexo, fez parte do percurso de visitação. Diretor da escola, Marcelo Belfort é histórico morador e militante da Maré. “Já no início dos anos 80 eu, aos 15 anos, fazia parte das primeiras articulações dos moradores em busca de cidadania. É o que seguimos buscando. Esta escola ainda funciona em condições precárias. Nosso abastecimento de água era feito por caminhão pipa até semana passada. Temos uma rede elétrica ainda improvisada”, relatou.

O diretor, apesar de apontar os problemas ainda existentes, reconheceu o esforço de toda a comunidade escolar e também de setores do governo estadual em busca de melhorias do espaço. “Aqui trabalhamos com o conceito de educação pública, gratuita, universal, de qualidade e que seja também comunitária. O diálogo com instâncias do governo estadual possibilitaram avanços nesse sentido. Aqui é lugar de violações, mas, sobretudo, aqui é lugar de potências”, finalizou.
Uma escola municipal também fez parte do roteiro do Ministério Público Federal: o Ciep Operário Vicente Mariano. Lá, os alunos falaram sobre a falta de segurança e o medo vivido quando há operações policiais. Relataram que muitas das operações são feitas em horário escolar, na hora de entrada e saída das aulas. Pontuaram, ainda, o grande número de aulas perdidas em dias de operações policiais.
Bruna Silva, moradora da Maré e mãe do estudante Marcus Vinícius, de 14 anos, assassinado no ano passado durante operação policial, destacou a importância da visita. “Eles precisam ver de perto o que a gente na favela sofre por causa das operações. Precisam saber que as escolas e postos de saúde ficam fechados por horas e até dias depois de uma operação”, afirmou. Ela destacou o adoecimento dos moradores gerado pelo pânico dos disparos do helicóptero. “Nossas ruas estão cheias de marcas de bala. Meu filho só queria estudar, mas um tiro o acertou. Estou aqui lutando pelo futuro dessas crianças da Maré, eles precisam ter seu futuro garantido”, disse.
Para Mariana Rodrigues, integrante da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, estar onde estão as demandas é vital para o trabalho da comissão e para a sensibilização do órgão na defesa dos direitos e no atendimento às vítimas de violações. “É fundamental que as estruturas de poder que atuam com direitos se engajem em ações deste tipo. Que saiam de seus castelos institucionalizados. É preciso conhecer a realidade de quem demanda nosso atendimento”, afirmou. Já no Museu da Maré, ao final da visita, o grupo se reuniu para partilhar impressões da comunidade. Familiares de vítimas da violência do Estado, da Maré e de outras favelas, apresentaram o andamento de seus casos aos procuradores. A avaliação geral é de que desde janeiro aumentaram as operações com uso do helicóptero nas favelas cariocas. Outro diagnóstico foi o aumento de chacinas e de casos de auto de resistência em todo o Rio de Janeiro. Moradores da Maré, profissionais da educação, da saúde, integrantes de movimentos e organizações expuseram dados e depoimentos sobre as consequências destas operações policiais no cotidiano dessa favela que sofre historicamente com violações de direitos.
Pelo Ministério Público Federal, também acompanharam a visita a subprocuradora-geral da República Sandra Cureau e o procurador regional da República Marcelo Freire, membros titulares da 7CCR; os procuradores regionais da República Paula Bajer e João Francisco de Carvalho, membros suplentes da 7CCR; e os procuradores da República Sérgio Suiama e José Júlio Araújo.
Com informações de Silvana Sá e Gizele Martins, do Conjunto de Favelas da Maré
“Nota sobre a Visita da 7ª Câmara de Coordenação e Revisão- Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional do Ministério Público Federal/MPF:
Hoje, 27 de março de 2019, tivemos uma visita que foi um marco histórico para as favelas e periferias do Estado do RJ.
A Favela da Maré recebeu e acolheu a Câmara de Coordenação e Revisão - Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional do Ministério Público Federal/MPF e Procuradoria Geral dos Direitos do Cidadão/PRDC.
Das 10 às 15h , o MPF/Sétima Câmara e o PRDC junto com Defensoria Pública da União, Defensoria Pública do Estado e Ministério Público Estadual realizaram visitas e escutas com moradores(as), movimentos sociais,movimento de Mães e Familiares Vítimas da Violência do Estado RJ da Maré e de outras favelas e bairros de periferia do Estado do RJ.
Durante essas horas, o MPF e PRDC puderam ouvir relatos de violações no campo da saúde, da educação,moradia,saneamento e segurança pública.
Essa reunião possibilitou o vínculo e canal aberto com o MPF, PRDC e todas as institucionalidades estatais com a finalidade de construirmos de forma articulada a responsabilização, de quem viola nossos direitos cotidianamente, o Estado.
A única ressalva foi que durante a visita, próximo a passarela 10, entrada da favela da Maré, fomos pegos por uma Operação policial da Decodi da policia civil.
Terminamos essa nota fazendo um agradecimento a sétima Câmara do MPF por acreditar que o diálogo com as favelas é possível e necessário, para que possamos superar as violências e violações do Estado Brasileiro.
Assinam essa nota:
Rede de Comunidades e Movimento contra à Violência
Fórum Grita Baixada
Coletivo Papo Reto
CDD Acontece
Frente Estadual pelo Desencarceramento
Movimento Moleque
Movimento Candelária Nunca Mais
Fórum de Juventudes RJ
Rede de Mães e Familiares Vítimas da Violência do Estado na Baixada Fluminense
Afaperj”