Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)
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quinta-feira, 14 de março de 2013

Governo coloca o país voluntariamente no caminho da forca do livre comércio

Quinta, 14 de março de 2013 
Do Site Rumos do Brasil
Por J. Carlos de Assis
Desde o aborto provocado do acordo da ALCA, o Brasil jamais esteve ao ponto de sacrificar tantos interesses econômicos específicos e perspectivas concretas de avançar no seu processo de desenvolvimento do que com a espantosa candidatura de seu embaixador em Genebra, Roberto Carvalho de Azevedo, ao posto de secretário geral da OMC-Organização Mundial do Comércio.  É o equivalente a construir uma arapuca e meter-se voluntariamente dentro dela.


Para os que não estão familiarizados com o tema, a OMC é o órgão supremo de promoção e doutrinação do livre comércio no mundo. O instrumento para isso é o rebaixamento generalizado de barreiras tarifárias ou não tarifárias, reduzindo ou eliminando a proteção à indústria nacional. Por certo que isso pode justificar-se entre países com estruturas produtivas e tecnológicas similares. Para os tecnologicamente atrasados é um desastre anunciado de produção, emprego qualificado e renda.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

BCE prepara mais uma etapa do genocídio na zona do euro

Terça, 11 de setembro de 2012

Por J. Carlos de Assis
Acaba de ser cumprida pelas mãos dos dirigentes do BCE (Banco Central Europeu) mais uma etapa do genocídio em curso na zona do euro pelo qual as grandes massas estão sendo calculadamente sacrificadas em favor de uma pequena elite de especuladores que se locupletaram com a desregulamentação financeira das últimas décadas. O programa de compra de títulos públicos anunciado pelo presidente do banco, Mario Draghi, é um acinte em face da crise social europeia. Tranquiliza os ricos sob condição de violentar os pobres.

É graças à caixa preta que recobre as operações monetárias e financeiras que as sociedades europeias ainda não se levantaram em rebelião contras as políticas econômicas que lhes estão sendo impostas. O que está por trás desse plano do “bondoso” Draghi? Ele promete que o BCE comprará títulos emitidos pelos governos da área do euro, de vencimento até três anos, ilimitadamente, desde que os governos emissores tenham recorrido ou se proponham a recorrer a programas de estabilização gerenciados pela Comissão Europeia.

domingo, 2 de setembro de 2012

A Sombra do Samurai e o comando da economia

Domingo, 2 de agosto de 2012
Por J. Carlos de Assis, em "Rumos do Brasil"
O ministro Guido Mantega sempre está a um passo à frente na história.  Para ele a economia nunca vai mal. Se os números se revelam piores do que o previsto – como os 0,4% de crescimento no último semestre, perfeitamente antecipados por analistas independentes, mas antes descartados como pessimismo por Mantega -, ele logo saca da cartola algum indicador de que as coisas estão melhorando ou vão melhorar no futuro próximo. Assim, nunca há crise. Ou ela não acontecerá, ou já passou. E assim la nave va!

Isso parece ser parte da retórica oficial em qualquer país. A contribuição original do ministro é uma certa dose de academicismo que se traduz num distanciamento da situação real. Ocupando o principal posto executivo do Governo em três fases bem definidas – os anos Lula até 2008, os anos de crise e aparente recuperação entre 2008 e 2010, e os anos de relativa estagnação, que pode tornar-se contração, de 2011 para cá -, ele se comportou como a Sombra do Samurai, o shogun de Kurosawa que não precisava de se mover enquanto a batalha seguia.

Na fase do Governo Lula até aproximadamente 2005, Mantega assistiu com incrível frieza a valorização do câmbio que iniciou o processo de desarticulação de nossa indústria de manufaturados, tolerou Meirelles por fazer o que bem quis com a taxa de juros na lua, aceitou extravagâncias do Banco Central como o famoso swap cambial reverso dando-lhe cobertura com uma medida provisória que transferia ao Tesouro os custos dessa especulação com derivativos. (Mais à frente, com a crise, Sadia, Aracruz e Votorantin quase faliram quando a especulação se virou contra eles.)

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Trajetória Trágica

Sexta, 27 de julho de 2012
"O preço dessa opção, de condenar o Brasil a uma condição subalterna às pressões privatistas e estrangeiras, é alto e grave: mantemos a triste trajetória de renúncia de nossa soberania, autodeterminação e de nossa própria inteligência, por conta da incapacidade e pusilanimidade das elites econômicas e políticas do país."

Este artigo foi publicado originalmente no site "Rumos do Brasil"

Trajetória Trágica

Por Paulo Passarinho*
O atual mês de julho deveria ser encarado por Dilma Rousseff como um marco importante das absurdas limitações que vão se impondo ao seu governo, em decorrência de decisões equivocadas que vêm sendo assumidas, desde o início do seu mandato.

O início da gestão do atual governo foi marcado pelo temor de um propalado recrudescimento inflacionário, que o levou a decidir, através do Banco Central, pela elevação sistemática da taxa Selic, por cinco diferentes vezes consecutivas. O ministro da Fazenda declarava, então, que o seu objetivo era produzir uma desaceleração no ritmo da atividade econômica, como forma de arrefecer a pressão inflacionária que, supostamente, se apresentava como uma perigosa tendência, necessária de ser combatida. Outra preocupação explícita da equipe econômica era com o processo de valorização do real frente ao dólar, especialmente pelos efeitos negativos produzidos nos resultados da balança comercial.

Já a partir da metade do ano passado, contudo, a percepção dos gestores da política econômica havia se alterado: a desaceleração econômica já se fazia sentir de forma mais intensa que o desejável e o agravamento da crise europeia se adicionava às preocupações do governo. As medidas de elevação da taxa de juros acabaram por produzir uma estagnação econômica no terceiro trimestre do ano e as medidas de injeção de liquidez – adotadas pelos bancos centrais americano e europeu – mantiveram em alta os fluxos de capital especulativo para países como o Brasil, contribuindo para a valorização indesejável do real.

Neste contexto, 2012 tem início com Dilma Rousseff preocupada em evitar o pífio crescimento do PIB observado em 2011 (2,7%), abaixo da média do PIB mundial e o mais fraco desempenho entre os países da própria América do Sul. Para o governo, a ideia era procurar assegurar uma expansão do PIB de 4,5%. Com relação ao câmbio, medidas buscando inibir operações de empréstimos e financiamentos entre filiais de multinacionais e suas matrizes ajudaram a diminuir o fluxo de entrada de recursos especulativos no país. Além disso, a saída de recursos de estrangeiros aplicados nas bolsas de valores e mercadorias acabou por produzir uma relativa desvalorização do real.

Entretanto, sob o ponto de vista do ritmo da atividade econômica, os resultados não poderiam ser mais desanimadores. Sucessivas reavaliações foram feitas desde o início do ano, por parte do próprio governo e de instituições ligadas ao chamado mercado, e hoje se torna consenso que, na melhor das hipóteses, a economia deverá crescer em torno de apenas 2%. As várias medidas que têm sido anunciadas, sempre em torno da desoneração fiscal e da concessão de crédito subsidiado a setores empresariais, parecem não mais surtir o efeito esperado. Há incertezas por parte do capital privado para novos investimentos e as respostas na esfera do consumo se mostram tímidas frente ao forte endividamento das famílias, contraído nos últimos anos, mesmo diante da política em curso de redução das taxas de juros.

A grande alternativa que poderia estar ao alcance do governo seria uma guinada nos chamados gastos públicos, tanto em termos de novos investimentos, como no incremento de gastos de custeio, particularmente no atendimento às demandas salariais do funcionalismo. Para tanto, a diminuição das metas de superávit fiscal poderia abrir uma margem de manobra importante ao governo, para a viabilização desses objetivos. Porém, esta é uma medida quase proibitiva, dentro da lógica do governo.

Para o rompimento da verdadeira ditadura fiscal representada pelo superávit primário, de forma consequente e sustentável, haveria a necessidade de uma abrangente mudança no conjunto da política macroeconômica. Mecanismos de controle sobre os fluxos cambiais, maior eficácia fiscalizatória sobre os bancos e uma substantiva mudança no padrão de administração da dívida pública, com uma forte redução nas taxas de juros dos títulos públicos – muito além da redução da taxa Selic – seriam medidas essenciais.

Haveria, particularmente, a necessidade de uma forte atenção com nossas contas externas, fortemente pressionadas pela conta de serviços e pela redução do saldo comercial, ampliando ano após ano o déficit em conta corrente do país. Controlar as remessas de lucros ao exterior e dotar nossas exportações de maior competitividade, através de uma taxa de câmbio desvalorizada, seriam também medidas importantes para uma transição que tivesse como objetivo uma nova realidade econômica, favorável ao capital produtivo, à geração de empregos de qualidade e à ampliação dos gastos públicos.

A maior dificuldade para uma mudança dessa natureza não se encontra na esfera técnica. Os obstáculos são de natureza política. A adoção de uma política econômica alternativa implicaria romper com o pacto de poder hegemônico, construído desde meados dos anos noventa, e que tem nos bancos e multinacionais os seus principais avalistas e beneficiários.

Exigiria, portanto, coragem política para enfrentar os atuais donos do poder.

Mas, ao que tudo indica, o governo Dilma se encontra em uma armadilha ditada pelas suas opções de governabilidade, herdadas do governo Lula. Abrindo mão do papel protagônico que deve guiar o Estado, em um país dominado pelo capital financeiro, o recrudescimento das atuais dificuldades do governo deverá ser respondido com maiores concessões ao capital privado. Mudanças na legislação trabalhista voltam a ganhar destaque e, sob o ponto de vista do investimento, o que se prenuncia é um conjunto de medidas para a entrega à iniciativa privada dos setores de infraestrutura.

Aeroportos, ferrovias, rodovias e portos deverão ser concedidos a operadores privados, inclusive estrangeiros, através de parcerias público-privadas, e onde curiosamente – assim como ocorre desde o início da tragédia das privatizações – o sempre presente BNDES estará atuante, como financiador-mór dessas operações.

Dessa forma, em meio ao agravamento da crise do capital financeiro no mundo mais desenvolvido, em meio à fragilidade do Estado brasileiro frente às suas obrigações constitucionais com o nosso povo – em termos de educação, saúde, habitação popular ou transportes públicos – continuamos a aprofundar o enraizamento dos princípios e políticas ditadas pelo neoliberalismo, para um país periférico.

O preço dessa opção, de condenar o Brasil a uma condição subalterna às pressões privatistas e estrangeiras, é alto e grave: mantemos a triste trajetória de renúncia de nossa soberania, autodeterminação e de nossa própria inteligência, por conta da incapacidade e pusilanimidade das elites econômicas e políticas do país.

*Economista. Especialista em análise de políticas públicas, coordenou  o extinto grupo de economistas do PT no Rio de Janeiro, entre os anos de 1989 e 1998. Economista e apresentador do Programa Faixa Livre, produz artigos de opinião para diversos portais da internet.

sábado, 16 de junho de 2012

O que Marx escreveria no quinto volume de “O Capital”

Sábado, 16 de junho de 2012
Por J. Carlos de Assis
Custou a Marx quatro volumes de “O Capital” para demonstrar que o fundamento da acumulação de lucro pelo capitalista estava na apropriação da mais valia, isto é, na apropriação da diferença entre o valor de reprodução da força de trabalho e o valor dos bens que ela produz. Isso mudou. Se estivesse vivo, Marx prestaria mais atenção no que acontece hoje fora da fábrica, ou seja, nas relações monetárias e fiscais que transferem renda direta dos mais pobres para os muito ricos, seja no boom, seja especialmente nos momentos de crise econômica, pela via da disputa do orçamento público.

Na fábrica, exceto situações extremas como a da China e de outros países asiáticos onde temos ainda um processo de acumulação primitiva baseado na super-exploração do trabalho, o valor da força de trabalho vai-se aproximando cada vez mais do valor que ela produz em face da concorrência de preços inter-capitalista. As grandes corporações não negam generosos aumentos salariais. Apenas os transferem, coordenadamente, aos preços. É na disputa da mais-valia extra fábrica – ou seja, no orçamento público – que se concentram os grandes ganhos empresariais. Isso, na crise, fica explícito.

Por que os conservadores europeus, chefiados por Merkel, advogam políticas monetárias expansivas e políticas fiscais restritivas? Pensem bem. Quem toma dinheiro emprestado em bancos, a taxas reduzidíssimas, senão os que têm garantias patrimoniais para oferecer? E quem tem garantias, exceto os ricos? Assim, nas crises financeiras como a atual, a política monetária expansiva, em nome da facilitação do crédito, não passa de um artifício para facilitar a apropriação direta da mais-valia social pelos mais ricos – primeiro, os bancos que têm acesso às taxas básicas, depois, a sua clientela que se beneficia de taxas igualmente baixas.

domingo, 3 de junho de 2012

A maldição do superávit e de uma falsa ética empurrando a recessão

Domingo, 3 de maio de 2012
De Rumos do Brasil
propostas para um país melhor

Por J. Carlos de Assis
O crescimento da economia brasileira de pífios 0,2% no primeiro trimestre do ano não surpreendeu ninguém, exceto os ortodoxos. A queda da taxa básica de juros e a queda menos expressiva das taxas de aplicação do sistema bancário são um fenômeno recente demais para alterar o ritmo dos investimentos. Ao lado disso, a política fiscal de realização de superávits primários recorrentes é de natureza contracionista, ao que se acrescenta o fato de que o investimento público se contraiu 2 pontos percentuais este ano, sobretudo nos transportes.

Estamos sob a dupla maldição da ideologia neoliberal e de um desarranjado combate à corrupção. A ideologia nos diz que “o Governo tem que fazer poupança para pagar os juros” (terminologia da Globo para justificar o superávit primário), enquanto o suposto combate à corrupção paralisa o conjunto dos investimentos públicos, sobretudo em transportes -  o setor que mais vinha investindo -, em nome da ética. Como consequência, o Governo retira da sociedade, sob a forma de impostos líquidos, mais do que lhe devolve em gastos públicos. A consequência é contração econômica.

Leia a íntegra no site "Rumos do Brasil"

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Horizonte Sombrio

Quinta, 31 de maio de 2012
De "Rumos do Brasil"

Por Paulo Passarinho
Há pouco tempo, escrevi um artigo (No reino do curto-prazo) destacando a dependência do governo, em seu processo de tomada de decisões, a situações conjunturais de curto-prazo.

Esse é um dos elementos que evidenciam a total subordinação do país a diferentes circunstâncias econômicas, sem que tenhamos um norte estratégico definido. Vivemos, assim, a ausência de um projeto de nação que estabeleça metas e objetivos nacionais a serem atingidos no curto, médio e longo prazos, através de meios e instrumentos factíveis e racionais. Algo que no passado era denominado de planejamento.

Vivemos, na verdade, a realidade de um país que navega nas ondas circunstanciais das pressões de um mercado globalizado e cada vez mais concentrado e altamente competitivo. O Brasil atual (com as suas estruturas de poder) passa a ser, desse modo, um administrador de pressões e interesses que surgem dos pólos mais dinâmicos do atual jogo global, notadamente corporações transnacionais e financeiras.

Frente, por exemplo, à fase da crise do capital que se abre a partir de 2007/2008, e que no momento aponta para o agravamento da situação de crise na Europa, com a possibilidade da Grécia deixar a área do euro, o governo procura se agarrar a qualquer expediente que lhe garanta que a economia brasileira possa ter, agora em 2012, uma taxa de crescimento um pouco maior que o obtido em 2011.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Realidade e Farisaísmo

Segunda, 14 de maio de 2012
De Rumos do Brasil
Proposta para um país melhor

Por Paulo Passarinho*
A atual e aparente queda de braço entre o governo e os bancos deve ser mais bem entendida, antes de qualquer precipitada conclusão, conforme já alertei em artigo anterior.

O último, ou melhor, penúltimo capítulo dessa história foi a anunciada mudança nas regras de remuneração das cadernetas de poupança. O governo apresentou a iniciativa como uma necessidade para a garantia do processo de continuidade de redução da taxa básica de juros, a taxa Selic.

Com a queda da taxa Selic, os fundos de renda fixa – que são lastreados majoritariamente pelo rendimento dos títulos públicos – tenderiam a perder competitividade em relação à remuneração das cadernetas. Os títulos públicos, dentro desse raciocínio, renderiam menos, por conta da redução da taxa Selic, e, por conseqüência, os fundos passariam a pagar menos aos seus aplicadores. Os aplicadores em fundos pagam, também, taxas de administração aos bancos que os gerenciam (em geral, muito elevadas), além da tributação do imposto de renda, o que acabaria por tornar o rendimento da poupança, isento de imposto de renda, mais atrativo do que dos fundos. A cobrança do imposto de renda em relação aos títulos públicos é isenta apenas aos fundos de investimento estrangeiros, o que já é uma aberração.

A fuga de capitais dos fundos para as cadernetas, por sua vez, não interessa ao governo, pois são através dos fundos que os bancos captam recursos que são aplicados, em sua maior parte, em títulos públicos, fundamentais para a rolagem da dívida pública.

Contudo, o mais curioso é que essa versão da história é apenas uma meia verdade. A Campanha Auditoria Cidadã da Dívida Externa, em seu boletim diário de acompanhamento das notícias veiculadas pela mídia dominante, em sua versão do último dia quatro de maio, nos informa que “no dia 3/5/2012, por exemplo, o governo emitiu R$ 1,5 bilhão em títulos, pagando aos rentistas taxa de 10,7% ao ano, taxa esta que somente cai quando o governo reduz drasticamente o prazo de pagamento de tais títulos, conforme se pode ver na tabela da própria Secretaria do Tesouro Nacional”. O citado boletim lembra, também, que “segundo o último dado da Secretaria do Tesouro Nacional, dos R$ 29 bilhões de títulos da dívida interna emitidos em março pelo Tesouro, apenas R$1,8 bilhão foram indexados à Taxa Selic”. Além disso, “apenas 27,52% do estoque da Dívida Interna sob responsabilidade do Tesouro estavam indexados à Selic, com o custo médio da Dívida Interna sob responsabilidade do Tesouro Nacional sendo de 11,47%, bem mais que a Taxa Selic” (vide www.auditoriacidada.org.br)

Em suma: a vinculação da remuneração dos títulos públicos à taxa Selic é hoje uma realidade para menos de 30% dos títulos emitidos pelo Tesouro, e as taxas que vêm sendo oferecidas aos credores da dívida interna mobiliária, nos chamados títulos pré-fixados, excedem à atual taxa Selic, de 9% ao ano.

Em todo o caso, a mudança decretada para o cálculo dos rendimentos das cadernetas somente será aplicada, caso a taxa Selic chegue a 8,5% ao ano ou menos do que isso, nas novas cadernetas abertas ou para os novos depósitos realizados, a partir do dia quatro de maio. Com a Selic fora dessa faixa ou para as contas de cadernetas já existentes, a remuneração continua a ser de 0,5% ao mês, mais a variação da TR – Taxa de Referência, calculada pelo Banco Central.

Com isso, o governo tenta capitalizar a medida, destacando o “respeito aos contratos” e procurando assegurar que os poupadores da caderneta não sairão perdendo.

E para não esquecer o fio da meada do último capítulo dessa história, os analistas do mercado financeiro já voltam a manifestar preocupações com o ritmo da inflação e os seus riscos à estabilidade econômica. A depender dessa turma, as novas regras de remuneração da poupança não terão oportunidade de ser aplicadas, pois, como sabemos, para ela, somente a elevação da taxa Selic é eficaz para se combater eventuais elevações de preços em uma economia.

Nesse aspecto, o grande problema a ser considerado, levando-se em conta que a maioria da clientela desse tipo de aplicação se constitui de pessoas de menor renda, assalariados ou trabalhadores em condições de fazer alguma poupança, é o modelo de economia – e de país – que continuamos a construir, sob a hegemonia dos bancos e das transnacionais.

Com o crescimento do emprego e da renda dos segmentos mais pobres, observado nos últimos anos, há um enorme espaço de propaganda positiva para esse modelo, iniciado nos anos 1990, mas de aparente sucesso apenas no período a partir de 2003. De lá para cá, as raízes do modelo periférico-liberal se aprofundaram. Avançamos nas aberturas financeira, comercial, produtiva e tecnológica, com acentuada perda de soberania em áreas vitais para o planejamento do nosso futuro. A desnacionalização da economia e o grau de concentração dos negócios são gritantes; a deterioração dos serviços públicos essenciais à população é absurda. Privatizações, fraudulentas e perniciosas ao país, não somente não foram revistas, como continuam a avançar. E a desmoralização e descrença da população com o instrumento da política, como ferramenta para um mundo melhor, é evidente.

Contudo, para muitos vivemos uma espécie de aurora de novos tempos.

A população, bombardeada por meios de comunicação de massa que procuram difundir os supostos acertos da política econômica, parece não perceber que as dificuldades do seu dia-a-dia são crescentes. De alguma forma, o acesso aos crediários com altas taxas de juros e a possibilidade de comprar bens de consumo a prestações criou uma espécie de amortecedor contra as evidentes contradições vividas. Os centros comerciais – os shoppings – e suas instalações parecem substituir escolas de qualidade, centros de saúde adequados, transportes decentes.

As lideranças políticas procuram também estimular a ilusão. Recentemente, em solenidade no Rio de Janeiro, onde Lula foi agraciado com o título de doutor honoris causa, por cinco diferentes universidades públicas do estado, o ex-presidente, ao abordar um dos maiores problemas urbanos que temos vivido – a falência dos transportes públicos e as dificuldades de mobilidade nos grandes centros – afirmou que é o sonho de todo trabalhador ter o seu carro próprio, poder passear com sua família e se divertir. Disso ninguém pode discordar. Outra coisa é admitir como plausível, ou inevitável, um modelo de cidade onde o trabalhador gaste quatro, cinco ou seis horas do dia, para o seu deslocamento de casa para o trabalho e do trabalho para a casa.

Ou seja: uma liderança como Lula, político projetado pela esquerda e com origem popular, contundente crítico do modelo dos bancos até a sua chegada à presidência da República, não se constrange em jogar para a platéia e apostar em um nível atrasado de consciência, para poder se manter em evidência.

Nesta mesma solenidade, contudo, as fraturas do falso modelo exitoso de governo, inaugurado a partir de 2003, se mostraram em diversos momentos. Logo no seu início, com a atriz Camila Pitanga cobrando da presidente Dilma o veto ao Código Florestal, recém aprovado pelo Congresso, pela própria base governista. Ou na fala do reitor da UFF, ao reivindicar reajustes salariais para os professores universitários e, também, a destinação de verbas equivalentes a 10% do PIB para o Plano Nacional de Educação. Ou mesmo no patético esforço de Lula para defender e elogiar Sergio Cabral Filho, o corrupto e desmoralizado governador do Rio, além de seu aliado.

A realidade, portanto, teima em se mostrar, mesmo em ocasiões onde o farisaísmo se manifesta e o baixo nível de consciência e responsabilidade com o nosso futuro se mostram sem pudores.

*Paulo Passarinho, economista, especialista em análise de políticas públicas, coordenou  o extinto grupo de economistas do PT no Rio de Janeiro, entre os anos de 1989 e 1998. Economista e apresentador do Programa Faixa Livre, veiculado pela rádio Bandeirante AM 1360, produz artigos de opinião para diversos portais da internet. 

quarta-feira, 7 de março de 2012

Apelo às esquerdas: reformem o capitalismo antes que a direita o faça!

Quarta, 7 de março de 2012
Artigo publicado em "Rumos do Brasil"

Por J. Carlos de Assis
O capitalismo não vai acabar por força da atual crise financeira, mesmo que esta seja a maior de sua história. Sua arte consiste em adaptar-se a crises. Isso porque o capitalismo não é uma ordem social externa ao mundo das relações produtivas, mas o constituinte básico delas. Ou seja, estamos organizados de forma capitalista mesmo quando somos críticos radicais do capitalismo. É que a teia básica em que se movem as sociedades é fundamentalmente capitalista: propriedade privada dos meios de produção, busca do lucro, liberdade de iniciativa. As pessoas criticam o capitalismo, mas não renunciarão a tais coisas.

Acaso se deve abrir mão do princípio da propriedade privada dos meios de produção, seguindo o principal cânone do marxismo radical, em favor da propriedade estatal deles, como passo intermediário da utópica propriedade coletiva e do fim do Estado? Vimos o que isso significou na Rússia e, antes das reformas capitalistas de Deng Xiaoping, na China. Vimos a frustrante experiência cubana. E vemos com ansiedade a experiência venezuelana. Não creio que, sob qualquer aspecto, a abolição da propriedade privada dos meios de produção tenha trazido aos povos dos países onde foi adotada uma efetiva melhora de bem estar social.

Politicamente, a escolha é ainda mais complexa. Marx observou que a ideologia de uma sociedade é a ideologia da classe dominante. Isso significa mais ou menos o seguinte, no plano político: também os pobres e os trabalhadores que jamais terão meios de produção próprios tendem a incorporar ideologicamente como seu o direito à propriedade privada dos outros. E não se trata de ideologia pura: por mais que se critiquem trustes, monopólios, oligopólios e corporações gigantescas, a competição entre eles por uma renda social finita promove avanços tecnológicos e redução de preços relativos ao longo do tempo.

A ambiguidade do capitalismo – um mecanismo brutal de exploração e concentração de renda, e um instrumento da inovação tecnológica e de melhoria do bem estar material dos povos – é que está por trás de sua força política. Justamente por isso, os partidos comunistas, onde detêm e onde detiveram o poder político, só se mantêm ou se mantiveram na condição de partido único. Na Rússia pós-soviética o Partido Comunista ficou na casa dos 20% dos votos, não muito mais. Até prova em contrário, as sociedades democráticas consideram a propriedade dos meios de produção um aspecto vital da liberdade em geral.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

A economia europeia entre a estupidez e a ganância

Segunda, 20 de fevereiro de 2012
Por J. Carlos de Assis
Qualquer jovem estudante de graduação em economia que tenha se familiarizado com noções elementares dessa disciplina sabe que, numa situação de recessão, a única receita para a retomada da economia requer a recuperação da demanda efetiva via aumento dos gastos públicos ou das exportações, junto com algum corte de impostos. No meu tempo de estudante, nos anos 70, aprendia-se isso no livro clássico de Paul Samuelson, e não me lembro de ninguém do ramo que pusesse em dúvida essa linha de pensamento keynesiano.

A rigor, nem é necessário ser economista para chegar à mesma conclusão. Bastam alguns conceitos econômicos elementares. A recessão tem muitas causas, inclusive o fim de um ciclo de especulação financeira, mas na essência ela acontece quando a procura de bens e serviços é inferior à oferta, desestimulando o investimento. Para revertê-la, não há como confiar no aumento de investimentos do setor privado porque ninguém vai investir se a demanda de seus produtos, por efeito da própria recessão, estiver em declínio ou estagnada. Leia a íntegra em Rumos do Brasil

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

O Partido dos Trabalhadores

Sexta, 10 de fevereiro de 2012
Por Paulo Passarinho
O Partido dos Trabalhadores completa no dia dez de fevereiro, 32 anos.  Nesse dia, em 1980, no Colégio Sion, em S.Paulo, o Movimento Pró-PT – reunindo os mais diferentes segmentos de trabalhadores, estudantes, intelectuais, comunidades eclesiais de base, lideranças combativas do movimento sindical e militantes de diversas organizações de esquerda, clandestinas, por força da ditadura em vigor – chegava ao seu objetivo de cumprir as exigências impostas pelo regime militar para a criação de um partido político.

No momento mais simbólico daquela histórica tarde, Apolônio de Carvalho, Mário Pedrosa e Sergio Buarque de Holanda entraram de braços dados pelo salão onde se realizava a reunião de fundação formal do PT. Representavam décadas de militância política e intelectual a favor dos trabalhadores, e renovavam as esperanças e expectativas de brasileiros que apostavam na criação de mais um importante instrumento de luta para a emancipação de nosso país e de nosso povo.

Daquela data até os dias de hoje, muita coisa mudou no Brasil e no próprio PT.

Ao longo da década de oitenta, o PT se afirmou como a principal referência partidária junto aos militantes dos movimentos sociais, principalmente dos setores identificados com a Central Única dos Trabalhadores e o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, igualmente criados naquela década. A partir das eleições municipais de 1988, especialmente com a vitória de Luiza Erundina para a prefeitura de S.Paulo, dentre outras (anteriormente, em 1985, Maria Luiza Fontenelle já havia sido eleita para a prefeitura de Fortaleza), o PT começa a trilhar o delicado caminho de procurar compatibilizar os seus objetivos políticos com os limites da institucionalidade vigente.

Com a derrota de Lula para Collor, nas eleições presidenciais de 1989, e a própria ascensão do projeto neoliberal no país, os movimentos sociais entram em compasso de resistência contra a nova hegemonia que se expressa na sociedade, com conseqüências importantes para a própria construção política do PT.

Abreviando essa trajetória petista, e após o período das contra-reformas da era FHC, o PT que chega ao governo federal em 2003 é completamente diferente do que se poderia imaginar para um partido que se pautava – na sua fase de afirmação – pela defesa de uma nova ética na prática política e de transformações estruturais da economia e da sociedade brasileiras.

Históricas bandeiras políticas do PT – como a reforma agrária, a reforma tributária a favor do mundo do trabalho, a reforma urbana, a revisão das criminosas privatizações de FHC, Itamar e Collor, o controle democrático das estatais ou a mudança do modelo econômico, através de uma nova política macroeconômica – foram abandonadas e substituídas sem cerimônia e em nome do que se denominou de governabilidade.

A justificativa para tamanha metamorfose foi a alegação de que a correlação de forças na sociedade não permitiria mudanças substantivas no plano da política e especialmente na condução da política econômica. A política de alianças que leva Lula à presidência também foi alegada com fator de impedimento, para um programa de governo minimamente reformista e de contraposição às contra-reformas de FHC.

A rigor, a correlação de forças que foi substantivamente alterada se deu dentro do próprio PT. A submissão do conjunto do partido, com honrosas exceções, às opções e preferências de Lula – com seu inegável carisma, popularidade e apelo junto aos mais pobres, que se identificam com a origem do ex-metalúrgico – tornou-se uma regra.

Com relação à política de alianças, eu mesmo ouvi do vice-presidente de Lula, José de Alencar, em encontro no Palácio Jaburú com representantes do Conselho Federal de Economia, durante o primeiro mandato de ambos, que jamais foi consultado – ou mesmo informado de forma antecipada – das razões que levaram a cúpula petista a anunciar, em solo norte-americano, com Lula à frente, a nomeação do executivo financeiro do Bank of Boston, Henrique Meireles, para a presidência do Banco Central.

Outra explicação ou justificativa que também foi alegada, particularmente por setores que ainda têm o capricho de se apresentarem como forças de esquerda que apóiam os governos petistas, é que estes seriam “governos em disputa”. Seja por espantosa ingenuidade ou deslavado oportunismo, a verdade é que se houve alguma disputa, em algum momento que seja, em todas elas a esquerda perdeu. Ou, conforme um amigo sempre lembra, a única disputa relevante que podemos apontar no âmbito do governo Lula foi a disputa entre os grupos Bradesco e Itaú, pela liderança do super-lucrativo mercado bancário brasileiro, mais privilegiado ainda no período pós-2002 do que na era FHC.

Todas essas considerações devem ser lembradas pela razão de, na mesma semana em que o PT comemora mais um ano de sua existência, uma nova e inequívoca prova de sua total e radical guinada para a direita ter sido comprovada. Refiro-me ao início do processo da privatização dos principais e rentáveis aeroportos brasileiros. Serviço público essencial e fator de segurança nacional, a entrega dos principais aeroportos do país à administração privada, e a operação dos mesmos a empresas estrangeiras, escancara de uma vez por todas a natureza política dos governos pós-2002.

Mais patética do que a ação privatista em si, injustificável sob todos os pontos de vista, foi o esforço de dirigentes e líderes petistas procurando contestar qualquer semelhança com as privatizações da era FHC. Alegando que concessões não significam privatizações, essas tristes figuras ainda permitiram que ex-dirigentes tucanos se retirassem do ostracismo político em que se encontram para lhes explicar que serviços públicos, de fato, não podem ser privatizados, como se fossem “uma Vale do Rio Doce”. Por conta de dispositivo constitucional, esses serviços devem ser executados diretamente pelo Estado, ou por concessões a serem feitas à iniciativa privada, através de contratos, e por tempo definido.

Parece que em termos de privatização, os neopetistas têm muito ainda a aprender com os carcomidos tucanos. Da minha parte, o que espero é que aqueles que ainda mantenham um mínimo de coerência, entre os que ainda se considerem de esquerda, e que continuam aprisionados ao PT e aos seus governos, rompam definitivamente com esse partido e com o atual governo.

A esses setores, é importante lembrar que após mais de nove anos de governos comandados pelo PT, as tarefas para a construção de um verdadeiro programa democrático e popular – conforme o ideário do finado e verdadeiro PT – são mais complexas hoje do que em 2002.

O processo de privatização e de abertura de nossa economia aos capitais transnacionais é muito mais intenso e deitou raízes no país de forma muito mais profunda. Temos, portanto, muito mais trabalho pela frente e nossos adversários estão hoje muito mais fortalecidos. A economia brasileira encontra-se muito mais desnacionalizada, o Estado muito mais endividado e os movimentos sociais muito mais debilitados, pela cooptação de suas lideranças.

Chega de ilusões. É chegada a hora de se desfazer de fantasias e mistificações.

domingo, 18 de dezembro de 2011

A miséria do “novo desenvolvimentismo”

Domingo, 18 de dezembro de 2011


“O capitalismo só triunfa quando se identifica com o estado, quando é o estado”
              Fernand Braudel, “O Tempo do Mundo”, Editora Martins     
                                                                 Fontes, SP, p: 34
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Por José Luis Fiori
O “debate desenvolvimentista” latino-americano não teria nenhuma especificidade se tivesse se reduzido à uma discussão macro-econômica entre “ortodoxos”, neo-clássicos ou liberais, e “heterodoxos”, keynesianos ou estruturalistas. Na verdade, ele não teria existido se não fosse por causa do estado, e da discussão sobre a eficácia ou não da intervenção estatal, para acelerar o crescimento econômico, por cima das “leis do mercado”. Até porque, na América Latina como na Ásia, os governos desenvolvimentistas sempre utilizaram políticas ortodoxas, segundo a ocasião e as circunstancias, e o inverso também se pode dizer de muitos governos europeus ou norte-americanos ultra-liberais ou conservadores que utilizaram em muitos casos, políticas econômicas de corte keynesiano ou heterodoxo. O pivot de toda a discussão e o grande pomo da discórdia sempre foi o estado, e a definição do seu papel no processo do desenvolvimento econômico.

Leia a íntegra do artigo A miséria do "novo desenvolvimentismo".

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Mantendo a Trilha

Quinta, 27 de outubro de 2011
Artigo do site "Rumos do Brasil"

Por Paulo Passarinho
O Banco Central reduziu pela segunda vez consecutiva a taxa básica de juros. A razão da medida é explicada pela piora do chamado cenário externo. Com essa decisão, muitos que defendem o governo Dilma reforçarão os seus argumentos – que têm a sua origem, ainda no governo Lula, no seu segundo mandato – da mudança em curso da política econômica, agora pretensamente com um caráter desenvolvimentista.

A piora do cenário externo é de fato uma realidade. Existem claros indícios da necessidade de uma articulação para se dar início a um processo de reestruturação das dívidas soberanas de alguns dos países mais frágeis da União Européia. É uma necessidade que apenas vai se tornar mais urgente, com os efeitos das políticas de arrocho que a Alemanha, a França e o FMI têm exigido de Estados como a Grécia, Portugal, Espanha e Itália.

As medidas de caráter recessivo impostas a esses países é a contrapartida do que chamam de “ajuda”. A dita ajuda obedece à lógica de – a partir dos empréstimos aprovados para os mesmos – se garantir recursos de curto-prazo para o pagamento de compromissos financeiros dos países em dificuldades, junto a bancos privados. O problema é que a vida continua e a atividade econômica se reduzirá dramaticamente – por força das medidas de arrocho, de corte de gastos e desemprego – com graves efeitos negativos sobre a arrecadação fiscal nesses países. Com isso, os problemas de solvência e de financiamento se agravarão e a urgência de moratórias negociadas irá se impor.

Não sem sentido, mas irônica e curiosamente, os próprios financistas já apontam a outrora criticada Argentina – que impôs aos credores uma reestruturação de sua dívida soberana, na primeira metade da década passada – como um exemplo interessante de “solução” para a crise da dívida de países europeus.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

O custo intangível do fracasso europeu

Quinta, 22 de setembro de 2011
Por José Luis Fiori, em "Rumos do Brasil"
    “Se fosse possível hierarquizar sonhos, a criação da União Européia estaria entre os mais importantes do século XX. Depois de um milênio de guerras contínuas, os estados europeus decidiram abrir mão de suas soberanias nacionais, para criar uma comunidade econômica e política, inclusiva, pacífica, harmoniosa, sem fronteiras, sem discriminações e sem hegemonias. Um verdadeiro milagre, para um continente que se transformou no centro do mundo, graças à sua capacidade de se expandir e dominar os outros povos, de forma quase sempre violenta, e muitas vezes predatória.”

JLF: “Os sinos estão dobrando”, Valor Econômico, junho de 2008
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Os sinais de desagregação são cada vez maiores e freqüentes, e já não cabe duvida que o processo de “unificação européia” entrou num beco sem saída.  É quase certo o calote da dívida grega, e é cada vez mais provável a ruptura da zona do Euro, que teria um efeito em cadeia, de grandes proporções, dentro e fora do Velho Continente. Ao mesmo tempo, a vitória da França e da Inglaterra, na Líbia, aumentou a divisão  e aprofundou o cisma alemão dentro da OTAN. Por outro lado, os governos conservadores europeus estão em queda livre, e sua alternativa social-democrata não tem mais nenhuma identidade ideológica. Os intelectuais batem cabeça e a juventude busca novos caminhos um pouco sem rumo. O próprio ideal da unificação européia tem cada vez menos força, entre as elites, e dentro de sociedades em que se dissemina a violência e a xenofobia. Parece  iminente o fracasso europeu.

Leia a íntegra do artigo "O custo intangível do fracasso europeu"

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Uma receita para o bolo tributário

Quinta, 8 de setembro de 2011
De "Rumos do Brasil"
Por Gilberto Marques
A carga Tributária brasileira é escorchante – tira a pele e o miolo do cidadão. Quem não sabe, sente o peso. Desde Xica da Silva, a questão propagou-se na história nacional. O contratador comia de um tudo. O duro é saber que o Rei foi-se, mas ficou o filho que ganhou no grito.  Ainda tem o Dia do Fico nos registros da façanha. A turma lusitana ficou no poder por 389 anos.

A duração da crise mundial numa visão realista

Quarta, 8 de setembro de 2011
Publicado em "Rumos do Brasil"
Por J. Carlos de Assis
Em 2009, escrevi o artigo abaixo a propósito da duração da crise financeira nos países desenvolvidos avançados. Revendo esse artigo, tenho pouco a acrescentar, exceto uma ênfase no imperativo da cooperação  e convergência de políticas econômicas desenvolvimentistas entre os países como única alternativa para a superação da crise:

Quando escrevi, em outubro do ano passado, “A Crise da Globalização”, já estava convencido de que a atual crise seria maior em profundidade e extensão geográfica que a Grande Depressão dos anos 30. Hoje, poucos duvidam disso. Mas havia a dúvida, que eu compartilhava com outros economistas, sobre sua extensão no tempo. A dos anos 30 durou cerca de dez anos. A japonesa, nos anos 90, durou mais de quinze, até confundir-se com a atual. Será que estamos condenados a essa demora?

A resposta a essa questão não está na economia, mas na política. A duração da crise depende de ações concretas dos governos e de sua coordenação. Por isso é que é tão difícil prever seu desfecho. Governos são comandados por conchavos políticos, por pressões de grupos e da sociedade como um todo, e, numa extensão nada desprezível, por ideologias. E é sobretudo a ideologia, que em geral recobre interesses de grupos, que pode tornar esta crise de duração indefinida.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Brasil Maior?

Quinta, 1 de setembro de 2011
De Rumos do Brasil

Por Paulo Passarinho 
No último dia dois de agosto, em meio a novos capítulos da crise econômica que afeta de sobremaneira os Estados Unidos e a Europa, o governo Dilma lançou um pacote de medidas rotulado de Plano Brasil Maior.
Trata-se da nova política industrial, tecnológica, de serviços e de comércio exterior para o período 2011/2014. Guido Mantega, o ministro da Fazenda, declarou que a iniciativa era uma resposta à concorrência predatória estrangeira. Fernando Pimentel, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, referiu-se ao plano como mecanismo de defesa do mercado interno.

As medidas anunciadas teriam como objetivo elevar a competitividade dos produtos nacionais, através do incentivo à inovação e à agregação de valor à produção brasileira.

Além de várias projeções de elevação dos investimentos fixos, aumento do gasto em pesquisa e desenvolvimento, melhor qualificação dos trabalhadores industriais, e utilização das compras governamentais para incentivo e fortalecimento de fabricantes nacionais das áreas de saúde, defesa, têxtil, confecções, calçados e de tecnologia da informação, o ponto central e mais consistente, em termos objetivos, se volta para medidas de caráter fiscal. O Plano também prevê novas medidas para o setor automotivo, com benefícios voltados para a produção de veículos e autopeças, ainda em discussão, como contrapartida de metas de investimento, transferência de tecnologia, emprego e agregação de valor.

Desoneração tributária do IPI incidente sobre bens de investimento; redução gradual do prazo para devolução dos créditos do PIS-Pasep/Cofins sobre bens de capital; e, principalmente, a desoneração total da folha de pagamento dos setores de confecções, calçados, móveis e softwares são as medidas de maior impacto que podemos destacar.
A desoneração total da folha de pagamentos desses setores será substituída por uma contribuição de 1,5% sobre o faturamento dessas empresas, excetuando-se às do setor de tecnologia de informação, que ficam com uma alíquota de 2,5%. A medida é considerada experimental, vigorando até 2012, quando seria reavaliada. O governo se compromete nesse período a compensar com transferências do Tesouro para a Seguridade Social, os eventuais prejuízos que essa mudança poderá acarretar nos recursos dessa área.
Trata-se na verdade de precedente extremamente perigoso. Mais uma vez, e paradoxalmente aos discursos oficiais e oficiosos que insistem em apontar a existência de um suposto déficit previdenciário, a bondade fiscal ficará por conta dos recursos que deveriam estar sendo destinados para as áreas da saúde, da assistência social e da própria previdência.
Mais grave, ainda, é a própria eficácia das medidas anunciadas, frente aos proclamados objetivos de defesa da indústria nacional, elevação da competitividade dos produtos brasileiros e maior grau de inovação tecnológica de nossa indústria.
O grande problema é que não se pode desvincular esse presente plano dos seus antecessores PITCE –Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior, em vigor de 2003 a 2007; e da PDP – Política de Desenvolvimento Produtivo, entre 2008 e 2010.
Faço esse destaque, pois foi nesse período recente que observamos – apesar de todas as declarações sempre otimistas das nossas autoridades – um forte processo de redução do peso da indústria de transformação no conjunto da produção brasileira e, também, no total das exportações do país. Entre 2002 e 2010, de acordo com o IEDI – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial – a participação da indústria de transformação no PIB reduziu-se de 18% para 16%.
Estudo recém concluído do professor Reinaldo Gonçalves, do Instituto de Economia da UFRJ, por sua vez, aponta que, entre 2003 e 2010, a substituição de produção nacional por importados, na indústria, foi acentuada, com a tarifa média aplicada sobre importados caindo de 10,9% para 9,2%. Nesse período, o coeficiente de penetração das importações na indústria de transformação é crescente, aumentando de 11% para 16,4%; a participação dos produtos manufaturados no valor total das exportações cai de 56,8% para 45,6%; ao mesmo tempo em que a participação dos produtos básicos se eleva de 25,5% para 38,5%. Nesse estudo (Governo Lula e o Nacional-desenvolvimentismo às Avessas), Reinaldo Gonçalves pondera que esses resultados são influenciados pela explosão dos preços das commodities, nesse período. Contudo, ele mesmo destaca que a participação dos produtos altamente intensivos em tecnologia reduz-se de 13,1% para 8,1%, enquanto que produtos das indústrias de médio-baixa tecnologia aumentam a sua participação de 21,7% para 25,1%.
A grande questão que o governo não admite encarar é que o principal vetor negativo que impacta a nossa indústria é a própria política econômica em vigor, que favorece amplamente as desnacionalização produtiva e a mudança do perfil da nossa indústria, crescentemente montadora de peças e componentes importados.
Frente à incapacidade política do governo em alterar os perversos efeitos que essa política gera sobre a taxa cambial, sobre a taxa de juros e sobre a política fiscal, com a assombrosa e crescente carga de despesas financeiras, mais uma vez medidas paliativas e de resposta emergencial às pressões de alguns setores industriais são anunciadas. São esses efeitos que deveriam ser enfrentados, através de uma nova política econômica, impossível de ser assumida pelo governo, em decorrência de seus compromissos com o modelo econômico defendido por bancos e transnacionais.
Além disso, há uma emergência em curso, como conseqüência dos desdobramentos da crise internacional. Com a paulatina diminuição do saldo comercial do país desde 2007, acentuada a partir de 2008 – ao mesmo tempo em que a conta de serviços, puxada pela remessa de lucros e dividendos, não para de crescer -, a “guerra comercial” já denunciada pelo ministro da Fazenda, poderá fazer com que tenhamos ainda mais dificuldades pela frente.
É nesse sentido que entendemos que frente à concorrência predatória, também denunciada pelo ministro, o governo mais uma vez apele para medidas espúrias de competitividade, que, mais uma vez, muito pouco efeito sistêmico irão produzir.

*Paulo Passarinho é economista e membro do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro.


terça-feira, 12 de julho de 2011

Dura realidade

Terça, 12 de julho de 2011
De Paulo Metri, em "Rumos do Brasil*"

ATO ÚNICO
(As cortinas se abrem e aparece uma sala de órgão federal do governo americano, com seis homens e duas mulheres sentados em volta de enorme mesa retangular)

Homem da cabeceira – Estamos reunidos, hoje, para tratar da questão dos movimentos nacionalistas da América do Sul. Há necessidade de nos preocuparmos?

Homem 1 – É claro que já tivemos as fases dos militares e dos neoliberais que nos tranqüilizaram muito, às suas épocas. Hoje, temos arroubos nacionalistas que, se não forem contidos, poderão acarretar danos sérios.

Mulher 1 – Vamos ser práticos e focar no que é importante. Não podemos esquecer que nossa agência é de inteligência. Brasil e Venezuela são nossos maiores problemas, hoje.  Há nacionalistas em outros países, mas a repercussão não é tão grande quanto as destes dois. Venezuela, por seu petróleo e por Chávez. Passou despercebido por todos, mas as reservas venezuelanas, nos últimos cinco anos, cresceram mais que as brasileiras com todo o pré-sal. Lula e Dilma não podem ser comparados a Chávez, mas não são aliados incondicionais. Lula, sob muita pressão, fez concessões. Mas não sabemos como a Dilma irá se comportar.

Homem da cabeceira – Vamos nos concentrar, primeiro, na questão brasileira. Peter é nosso especialista.

Peter – Ainda temos a grande massa brasileira completamente alienada e dominada. Os meios de comunicação tradicionais fazem um ótimo trabalho, com forte apoio nosso. Mas cresce a mídia alternativa que recebe centenas de milhares de visitações diárias. São pessoas querendo se informar em sites, facebooks, blogs e twitter, que crêem ser mais confiáveis. Têm professores e estudantes universitários, jovens profissionais liberais, empresários, sindicalistas etc. Por outro lado, é muito fraca a aceitação de nossa mídia alternativa.

Homem 2 – Nossa?

Peter – É claro que, quando digo “nossa”, são de brasileiros comprados que publicam nossas versões. Aliás, sobre este ponto, nossas empresas e as de países com os mesmos interesses que os nossos fazem um excelente trabalho, disponibilizando recursos para iniciativas deste tipo.

Homem 3 – Por que é fraca a aceitação da nossa mídia alternativa?

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