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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Novo edital do trem-bala entre Rio de Janeiro e Campinas é questionado em ações do MPF/DF

Segunda, 25 de fevereiro de 2013
Do MPF
Duas ações civis públicas foram ajuizadas na Justiça para correção de irregularidades que podem gerar danos bilionários ao erário
 
O Ministério Público Federal no DF (MPF/DF) ajuizou duas novas ações civis públicas contra a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e a União para corrigir irregularidades no Trem de Alta Velocidade (TAV) que pretende ligar a cidade do Rio de Janeiro a Campinas, em São Paulo.

A atuação judicial do MPF/DF não entra no mérito da necessidade de instalação do chamado trem-bala, mas busca impedir que seja iniciado o empreendimento sem os cuidados legais e técnicos adequados.

Na primeira ação, são questionados aspectos jurídicos do projeto: solicita-se a anulação do Edital de Concessão nº 001/2012 e, ainda, que seja reconhecida a ilegalidade da Resolução nº 3/2012, do Conselho Nacional de Desestatização (CND).

Na segunda ação, com fundamento em parecer técnico, o MPF/DF busca ordem judicial que determine o início de estudos complementares de viabilidade técnica e econômica do TAV a serem realizados pela União e ANTT. Para o Ministério Público, caso o trem venha a ser implementado, devem ser impostos limites para a participação de capital público no empreendimento.

Confira, abaixo, os detalhes de cada ação civil pública ajuizada pelo MPF/DF:

Edital questionado – Na primeira ação ajuizada, uma das principais ilicitudes apontadas é a indevida inclusão do TAV no Plano Nacional de Desestatização (PND). Tal como proposta, a concessão geraria, ao invés de uma “privatização” de serviço público, um crescimento da máquina administrativa. Isso porque há previsão de se criar empresa estatal para ser sócia da vencedora, haverá construção de infraestrutura pelo poder público e significativos empréstimos serão concedidos.

Além disso, o Conselho Nacional de Desestatização, ao editar a da Resolução nº 3/2012, desobedeceu as regras legais previstas para a concessão de serviço público. A resolução prevê a transferência da construção da infraestrutura do empreendimento para o poder concedente, ou seja, a União. Desse modo, houve inovação em matéria de concessão de serviços públicos, fazendo com que uma mera Resolução confronte a Lei Geral das Concessões.

Por outro lado, a modalidade de desestatização escolhida - o leilão - não deveria ser usada e sequer poderia ser realizada da forma prevista no edital (que determina a apresentação de lance único). Conforme o MPF/DF, o leilão é caracterizado justamente pela ausência de sigilo das propostas que, uma vez apresentadas, dão início à fase de lances sucessivos.

Outro problema: a empresa interessada, ao formular sua proposta, apenas estimará o valor de custos dos túneis, pontes e viadutos, mas não ficará responsável pela sua execução, a cargo da União. Assim, qualquer erro de estimativa não gera responsabilidade para a concessionária, mas onera a União. O Brasil possui histórico de imprecisão no cálculo de preços de grandes obras públicas, por isso a preocupação do Ministério Público em se antecipar em relação eventual prejuízo ao erário.

Para o MPF/DF, caso seja do interesse do Poder Executivo implementar novo modelo de concessão, deveria enviar sua proposta ao Legislativo e aguardar sua aprovação, para, aí sim, lançar edital.

Por fim, o Ministério Público solicitou antecipação da tutela para suspender a licitação atual. Com a aproximação da data para entrega das propostas – 13 de agosto de 2013 –, o pedido de liminar do MPF/DF visa prevenir prejuízo às empresas proponentes e, assim, evitar futura responsabilização do poder público pelos custos decorrentes da realização de estudos, investigações, levantamentos, projetos e investimentos, caso seja efetivamente anulado o edital.

Processo 0008439-63.2013.4.01.3400, 5ª Vara Federal. Confira aqui o teor completo da ação civil pública.

Estudos insuficientes e muito capital público – A segunda ação civil proposta pelo Ministério Público Federal tem dois focos principais: requer o início de estudos complementares de viabilidade técnica e econômica do TAV e a observância dos limites de participação de capital público no empreendimento fixados na primeira licitação.

Os estudos que fundamentam a atual licitação ainda são os mesmos do primeiro edital: os levantamentos foram realizados em 2008, com dados de 2007. O Tribunal de Contas da União (TCU), em 2010, considerou esses estudos insuficientes, principalmente no tocante à análise geológico-geotécnica, elaborada a partir de uma quantidade de sondagens muito inferior às recomendações internacionais.

Segundo a ação, a transferência dos riscos da construção para o poder público, no atual modelo de contratação, não poderia ser feita sem estudos suficientes e devidamente revisados e atualizados. Embora o Tribunal de Contas tenha autorizado a publicação do edital, o MPF/DF considera inaceitável o início do empreendimento bilionário sem haver segurança técnica para celebração do contrato de concessão.

Por outro lado, a retirada da limitação de investimentos públicos presente no edital anterior permite uma alta participação direta de capital público no empreendimento (45% do capital total), assim como elevada participação indireta – por meio da construção de toda a infraestrutura do trem-bala e um possível financiamento posterior pelo Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES). Para o Ministério Público, a ausência de limites transfere o risco de insucesso ou superfaturamento do empreendimento para o poder público e deve ser revista.

Processo 0009020-78.2013.4.01.3400, 15ª Vara Federal. Acesse aqui a íntegra da ação civil pública.

Atuações judiciais anteriores – O Ministério Público Federal do DF atua desde 2010 para regularizar a implementação do trem-bala, quando recomendou a suspensão imediata da licitação anterior. Em março de 2011, o MPF/DF ajuizou duas ações civis públicas contra a ANTT e a União devido a irregularidades no mesmo empreendimento.

A ação 014512-22.2011.4.01.3400 está sob análise do Desembargador Jirair Aram Megerian e o processo 16151-75.2011.4.01.3400 ainda está em curso na 9ª Vara Federal. Na época, também foram expedidas duas novas recomendações à ANTT, que jamais foram atendidas pela Agência.