Quarta, 19 de janeiro de 2011
Por Ivan de Carvalho

Enquanto
os aspirantes a ficantes ou entrantes (não creio que haja algum aspirante a
sainte) se descabelam, vale abordar questão muito mais amena e, acredito, de
muito mais relevância, pois diz respeito à própria natureza de nosso idioma,
“última flor do Lacio, inculta e bela”.
Está
rolando na Internet desde pelo menos a época da campanha para o segundo turno
da eleição presidencial um escrito de José Bones, filólogo e professor da
Universidade Federal do Rio de Janeiro. É que foi exatamente nesse período que,
preocupada com a resistência das eleitoras – bem maior que a dos eleitores – à
candidatura de Dilma Rousseff, decidiram Lula e o marketing da campanha que ela
não mais seria candidata a presidente, mas a presidenta.
Palavrinha,
melhor dizendo, palavrão estranho e feio, mas inventado com o óbvio propósito
de adular (já que não se lhe poderia puxar o saco) as mulheres que integram o
corpo eleitoral com um toque feminista. Um toque esquisito e errado, é verdade,
mas supõe-se que de alguma utilidade, tanto que até hoje Dilma Rousseff se
auto-qualifica de “presidenta”, ainda que ponha Luiz de Camões a revolver-se no
túmulo. E não faltou nem falta ainda a militância petista a jurar em falso que
estão certos ambos os termos, presidente e presidenta.
Não
estão não. Presidente é palavra neutra. Serve há séculos para os dois gêneros.
Presidenta é palavra feminina e, se insistem em usá-la, então que quando o
ocupante do cargo for homem, distingam-no não com a forma correta e neutra, mas
com a masculina, presidento. Apenas uma questão de equilíbrio. Burro, mas
equilíbrio.
Mas
vamos a parte do texto do filólogo José Bones.
“Presidenta?
Mas, afinal,
que palavra é essa?
Bem, vejamos:
No português
existem os particípios ativos como derivativos verbais.
Por exemplo:
o particípio ativo do verbo atacar é atacante, de pedir é pedinte, de cantar é
cantante, de existir é existente, de mendicar é mendicante...
Qual é o
particípio ativo do verbo ser?
O particípio
ativo do verbo ser é ente.
Aquele que
tem entidade.
Assim, quando
queremos designar alguém com capacidade para exercer a ação que expressa o
verbo, há que se adicionar à raiz verbal os sufixos ante, ente ou inte.
Portanto, a
pessoa que preside é PRESIDENTE, e não “presidenta”, independente do gênero,
masculino ou feminino.
Se diz capela
ardente e não capela “ardenta”; e diz estudante e não “estudanta”; se diz
adolescente, e não “adolescenta”; se diz paciente, e não “pacienta”.
E
completa José Bones, com um parágrafo irônico, que tomo a liberdade de
atualizar e reduzir a maldade, antecipando ao autor meu pedido de desculpas:
“A presidente
se comporta como uma adolescenta pouco pacienta que imagina ter virado eleganta
para ser eleita representanta. Esperamos algum dia vê-la sorridenta, pois esta
dirigenta política, como principal membra do governo brasileiro, não tem o
direito de adotar atitudes barbarizantas contra o pobre idioma português só
para ficar contenta”.
Pois é. Viram no que dá
mexer indevidamente numa letrinha?
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da
Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.