Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A queda de Jobim

Sexta, 5 de agosto de 2011
 Por Ivan de Carvalho

Antes de entregar, sob ameaça de ser demitido – feita em telefonema da presidente Dilma Rousseff –, sua carta de demissão, o ministro da Defesa de ontem, Nelson Jobim, disse que, na entrevista dada por ele à revista Piauí, retiraram do contexto dois comentários seus sobre duas das três mais poderosas mulheres do governo.

       A senadora Ideli Salvatti é a ministra de Relações Institucionais, encarregada da articulação política do governo, principalmente com o Congresso. A senadora Gleisi Hoffmann, mulher do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, é a ministra-chefe da Casa Civil, cargo ocupado por Dilma Rousseff durante vários anos do governo Lula e de onde esta saiu para disputar e conquistar a Presidência da República.

      Pois o até ontem ministro da Defesa, Nelson Jobim, não precisou botar uniforme camuflado do Exército para fazer dois disparos de bazuca contra as duas ministras.

   Um dos disparos atingiu a ministra de Relações Institucionais, integrante do “núcleo duro” do governo Dilma. “Ideli é muito fraquinha”, disse Jobim à revista. O outro disparo atingiu a ministra-chefe da Casa Civil. Jobim disse que Gleisi Hoffmann “sequer conhece Brasília”.

   Quando, nas agitadas horas que precederam sua demissão “a pedido” imposto – com a entrega de uma carta durante uma conversa dura, rápida e tensa –, o ex-relator da Constituição de 1988, ex-ministro da Justiça do governo FHC, ex-presidente do STF disse que a revista “tirou do contexto” suas inocentes observações sobre Ideli e Gleisi Hoffmann, ninguém entendeu. Especialmente nos meios jornalístico e político, ambos experientes em saber o que está no contexto e fora dele e o que dele não pode ser tirado.

     Como tirar “Ideli é muito fraquinha” de um contexto em que a frase tenha sido dita? Fraquinha de bíceps ou quadríceps, não é o caso, o presidente do Senado, José Sarney, ontem mesmo disse que ela é “até gordinha”. Quanto a Gleisi Hoffmann, a frase “sequer conhece Brasília” certamente não terá sido dita quanto a uma preocupação de que ela não saiba como trafegar pela cidade, encontrar ruas, hotéis, pontos turísticos, já que não está contratada pelo governo para motorista de táxi. A frase quer significar que ela não conhece o funcionamento político-administrativo da capital da República.

     O tempo irá mostrando o que pretendia e o que conseguiu ou não, politicamente, o ex-ministro Nelson Jobim. Ele estava no cargo por influência de Lula, que recomendou sua permanência a Dilma Rousseff, mas Lula não saiu perdendo – o novo ministro da Defesa, Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores no governo Lula, é de sua total confiança, apesar de todas as bobagens que andou fazendo na política externa brasileira, em parceria com Marco Aurélio Garcia.

    O governo tem um núcleo duro, em torno do qual evolui o secretário Gilberto Carvalho. Mas o núcleo mesmo é composto por Dilma, com seu estilo trator, que não gosta de dialogar e conciliar, razão pela qual delega isso a Ideli, “muito fraquinha” e a Gleisi, tão estilo trator quanto a presidente. Os políticos (e ministros e outros altos funcionários) não conseguem chegar à presidente, fato simples, que faz os políticos se sentirem prestigiados e representam meio caminho para pacificações e resolução de problemas. São os tais “afagos”.

    Perguntei a um experiente político sobre o que fazer ante a realidade desse trio constitutivo do “núcleo duro” do governo. Ele olhou por uns três segundos o horizonte, com olhar perdido e respondeu, convicto – rezar. Após o que baixou a cabeça, contrito, sobre o peito.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.