Sábado, 31 de agosto
de 2013
Por Ivan de Carvalho
A negativa da maioria do Parlamento
britânico, onde o primeiro-ministro conservador David Cameron tem maioria, ao
pedido dele para, juntamente com os Estados Unidos e a França, retaliar
militarmente o uso de arma química (gás sarin) pelo governo sírio contra a
população civil, o que matou mais de mil pessoas, representa um trincamento, ou
pelo menos um contratempo, na unidade não oficial, mas firme e persistente,
entre cinco países que há alguns anos vêm atuando militar e politicamente como
se fossem um só.
A França não é um desses cinco países e
está presente na questão do gás sarin na Síria pela convicção de que é uma
imprudência não dar uma resposta enérgica, militar, ainda que limitada a
ataques contra alvos escolhidos com mísseis e aviões – sem envolvimento de
tropas por terra – a uma ação de guerra química, proibida pelas Nações Unidas
mediante tratado que envolve quase a totalidade dos países do mundo. No caso, a
guerra química foi feita contra população civil, homens, mulheres e crianças, o
que aumenta – se isto é possível – a gravidade do que aconteceu.
Se
não se dá uma resposta ao precedente, este poderá eventualmente vir a gerar uma
rotina. E já que o uso de armas químicas, mesmo proibido, é praticado sem que o
autor sofra uma consequência importante, o que impedirá de, na próxima esquina,
pessoas da mesma estirpe do ditador sírio Bashar al-Assad lançarem mão de armas
biológicas?
Por
isto, enfrentando a interesseira oposição da Rússia e da República Popular da
China, o que impede uma ação com aprovação do Conselho de Segurança da ONU,
Estados Unidos, Reino Unido e França, com forte estímulo da Alemanha,
preparavam-se para uma ação militar aérea. E então o primeiro-ministro inglês,
querendo dividir com o Parlamento o desgaste por uma ação que não é bem vista
por 70 por cento da população do Reino Unido – ainda ressabiada com as “armas
de destruição em massa” – não encontradas no Iraque quando, sob o pretexto de
que elas existiam, Estados Unidos e Inglaterra invadiram o país do ditador-monstro
Saddam Hussein.
Embora
tivesse autoridade para atacar sem pedir a autorização do Parlamento, David
Cameron fez o pedido – e então o teve negado e ficou de mãos atadas. Com isso,
conseguiu uma derrota política interna e enfraquecer a planejada ação americana
do democrata Barack Obama secundada pela França do socialista François
Hollande.
Mas
voltemos aos cinco Estados que formam há alguns anos e cada vez mais
estreitamente uma unidade político-militar, sem esquecer as áreas de inteligência
e de tecnologia. Trata-se de assunto bem pouco conhecido da população em geral,
mas do qual estão a par as cúpulas políticas, militares, econômicas, de
inteligência e diplomáticas do mundo inteiro, não se podendo garantir,
infelizmente, que algum Antônio Patriota ou Marco Aurélio Garcia estejam a tal
respeito mais por fora que umbigo de vedete. E dispostos a dizer que não sabiam
de nada.
São
esses Estados o Reino Unido, os Estados Unidos da América, o Canadá, a
Austrália e a Nova Zelândia. Note-se que, entre os cinco, estão três dos
maiores países do mundo, além da maior potência militar e de uma potência
militar da segunda classe, mas muito relevante (o Reino Unido) e do Canadá, praticamente
formando uma unidade militar com os Estados Unidos. A distribuição do quinteto
no planeta também é relevante sob o aspecto geopolítico.
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Este artigo foi
publicado originariamente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é
jornalista baiano.