Especial para Ponte
Não queremos reconhecer que somos culpados pela falta de atenção a milhões de adolescentes, então é mais fácil criar uma quimera
Por Esther Solano*
O Brasil é um dos países do mundo onde mais jovens morrem. Um
país onde seus representantes fraudam bilhões dos cofres públicos da forma mais
abjeta ao tempo que tantas crianças ficam sem opções de uma educação pública
digna.
E qual é a resposta? Colocar
mais crianças nas prisões, ou melhor seria dizer masmorras, num processo total
de desumanização onde o principal algoz é o Estado? 16, 14, 10 anos…Onde está o
limite? Qual é a idade idônea para ser jogado nos abismos do sistema
penitenciário sem que os homens de bem se sintam culpados, sem que percam
noites de sono?
A redução da maioridade penal
é a resposta hipócrita de uma sociedade incapaz de aceitar, encarar e assumir
que não cuida de suas crianças, de seu futuro. A sociedade que vai aos
shoppings em rebanhos, mas olha com desprezo para a criança que está na rua
pedindo esmola.
Criança maltratada pela
degradação urbana da favela, criança maltratada por estar numa escola
decadente, por não ter a atenção pediátrica que merece, maltratada por um
sistema violento onde matar e morrer é algo natural e cotidiano.
Esses são os verdadeiros
problemas. Esses deveriam ser os debates, os assuntos urgentes que pautaram a
sessões do Congresso, os discursos acalorados, os programas eleitorais.
Não queremos reconhecer que somos
culpados pela falta de atenção a milhões de meninos e adolescentes, então é
mais fácil criar um artifício, uma quimera. Fechar os olhos.
Somos uma sociedade
fracassada quando nos mobilizamos pela redução da maioridade penal mas não por
construir o futuro de nossas crianças.
*Esther Solano Gallego é doutora
em Ciências Sociais pela Universidade Complutense de Madri e professora de
Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo