Por
Adriano Benayon* | Brasília, 24/4/2015
É importante, especialmente em situações críticas como a que
vivemos no Brasil, atentar mais para os fatos que para ideologias. Não que
teorias não possam ser úteis, mas, para gente honesta e consciente de seus
interesses, elas só se validam se forem conformes à realidade.
2. Ao contrário, o sistema de poder concentrador – que
objetiva, sobretudo, acumular mais poder – emprega intelectuais para criar
teorias, que mistificam os povos, e, mercê do controle sobre a mídia, as
transforma em “verdades”, aos olhos da maioria.
3. Não importa se você é de direita ou esquerda: se é
brasileiro, está sendo brutalmente saqueado, salvo as infames exceções dos
agentes e colaboradores da oligarquia financeira internacional.
4. Tampouco importa se você é militar ou civil ou, ainda, se
é adepto da intervenção do Estado, ou se acredita numa quimérica livre
iniciativa, praticamente inexistente onde se admitem e subsidiam carteis.
5. Enrolados por doutrinas e por distorções dos fatos, os
brasileiros brigam por causa de opiniões e teorias, como o império
anglo-americano mundial gosta, pois sempre investiu em dividir suas vítimas com
antagonismos ideológicos e querelas religiosas, étnicas e outras.
6. É como uma cidade cujos residentes se digladiam, enquanto
suas casas são ocupadas por assaltantes armados. E quanto mais se distraem
nisso, mais aumenta o saqueio.
7. O colossal esbulho cresce e alcança novas áreas, sob um
sistema político caracterizado pela corrupção sistêmica e no qual, em todas as
instâncias, se verificam manifestações de acordo, ainda que implícito, com a
dominação exercida pelos carteis transnacionais e por grupos financeiros
concentradores.
8. Demonstra ser tal sistema imprestável, não haver nele
partido político algum, de expressão, que se oponha a esse estado de
coisas.
9. O que a massa de trabalhadores, empresários, gerentes,
técnicos, funcionários civis e militares não percebe – porque lhe é
cuidadosamente ocultado – é que os políticos, como o gato da fábula milenar de
Esopo, tiram as castanhas do fogo para a raposa, os carteis financeiros e
econômicos transnacionais.
10. Grande quantidade de gente indigna-se contra alguns
políticos e executivos, colocados na Petrobras, receptores de propinas de
grandes empreiteiras, e reclama a privatização da estatal e/ou penas letais
para essas empreiteiras.
11. Ressalvado que esses delitos envolvem quantias de menor
monta, comparadas aos prejuízos que a corrupção sistêmica causa ao País, e
mesmo a outros casos de corrupção derivada, a indignação é compreensível.
12. Porém, esse tipo de resposta aos escândalos da Operação
Lavajato denota visão obscurecida pela cobertura do assunto na grande
mídia, sempre vinculada aos interesses antinacionais.
13. Há verdadeira campanha midiática em cima dessa Operação,
enquanto se oculta a corrupção sistêmica e as praticadas por empresas
transnacionais, grandes bancos e políticos afinados com esses concentradores.
14. O trabalho da grande mídia é alimentado pelo tratamento
dado ao inquérito pelo juiz que o preside, abusando da delação premiada,
fazendo vazamentos à mídia e mantendo presos, indevida e prolongadamente,
executivos das empreiteiras, postura com a qual colaboram membros do Ministério
Público.
15. Em vez de haver investigação isenta e eficaz, vê-se
desrespeito a direitos constitucionais dos acusados, o que é o oposto da
propalada sede de justiça e pode frustrar, mais adiante, a punição dos
responsáveis.
16. O resultado é que: a) as atividades da Petrobras e as da
engenharia nacional privada são prejudicadas; b) são reforçados, na opinião
pública, falsos conceitos, de há muito inculcados, de que estatais são
inconvenientes e as empresas privadas nacionais são intrinsecamente corruptas,
enquanto essa não seria a regra entre as estrangeiras.
17. Estando a maioria dos parlamentares alinhada com os
financiadores de suas eleições, e a chefe do Executivo pouco resistente a
pressões dos concentradores, fica claro o assalto transnacional às fabulosas
reservas de petróleo descobertas pela Petrobras, tramado em Projeto de Lei do
senador José Serra
18. Esse desempenhou, no governo de FHC, papel destacado nas
privatizações, quando a União entregou setores inteiros e fabulosas estatais,
gastando, para isso, dinheiro público em montante muito superior às receitas
dos leilões.
19. O jornalista Motta Araujo observou, em artigo recente,
no Jornal GGN, a inexistência atual, no Brasil, de um centro de poder político,
como na antiga tradição presidencialista do país.
20. De fato, espaços de poder, antes do presidente,
vêm sendo ocupados pelo Legislativo e pelo Judiciário, e parte do Ministério
Público e da Polícia Federal agem em aguda dissintonia com o Executivo.
21. Os países que caminharam na direção de se tornar
potências, o fizeram havendo harmonia entre os poderes e preponderância
de uma só autoridade, fosse o presidente nos EUA, fosse o primeiro-ministro nos
regimes parlamentaristas ou, ainda, o chefe do partido único, sob os regimes
centralizados da Rússia e da China, respectivamente na primeira e segunda
metades do século 20.
22. E mais letal que o esfacelamento do poder no âmbito
interno, por si só suficiente para inviabilizar o desenvolvimento, é ser o
poder real exercido de fora do Brasil.
23. Essa situação decorre das intervenções do império
dirigido pela oligarquia financeira anglo-americana, através de golpes de
Estado – coordenados pelos serviços secretos dos EUA, do Reino Unido e de potências
coadjuvantes –, e mediante corrupção e cooptação de muitos nos setores público
e privado, ademais de investimentos constantes para controlar os meios de
comunicação social, desinformar, arrasar a cultura e abaixar os valores éticos
e a qualidade da educação.
24. A estratégia da dominação teve por ponto de
partida o controle dos meios de produção e financeiros. O primeiro
e decisivo impulso foi dado, de 1954 a 1960, quando os governos egressos do
golpe de agosto de 1954 e o da eleição de JK do final de 1955 proporcionaram às
empresas multinacionais (transnacionais) colossais favorecimentos para
assenhorear-se dos mercados no país, desde a Instrução 113 e seguintes da
SUMOC, em janeiro de 1955.
25. Esse processo nunca mais foi estancado, e foi acelerado
durante a maioria dos mandatos, pois a regra ficou sendo adotar políticas do
agrado das transnacionais, que se haviam tornado a classe dominante.
26. Os EUA e seus parceiros impuseram, quando quiseram,
golpes de Estado, em que a intervenção militar direta funcionou como ameaça, ou
recurso em caso de o resultado não ser obtido sem ela.
27. A subida ao poder de líderes nacionalistas e dotados de
atratividade eleitoral foi impedida através de medidas discricionárias nos 20
anos de governos militares e, novamente, sob a democracia de fachada instituída
em 1988, mediante inúmeras jogadas e fraudes políticas e mediáticas, em
prejuízo de Brizola e Arraes e, mais tarde, do Dr. Enéas.
28. Não é possível ignorar a ilegitimidade das “escolhas” de
Collor e FHC para presidir a República, a não ser sob a ótica bitolada dos que
não percebem as colossais manipulações e abusos de poder, nem os esquemas de
corrupção praticados com esse fim.
29. Tampouco se pode entender a política dos governos
encabeçados por Lula e Dilma, sem ter notícia dos acordos e conchavos destes
com os mentores imperiais de seus predecessores.
30. Resumindo, os membros do Judiciário e do MP,
deslumbrados com os holofotes da mídia corrupta, que agem com desenvoltura e
até contra a lei, só o fazem por estarem agradando às transnacionais e a
oligarquia local a elas vinculada.
31. Ademais, o Executivo enfraqueceu-se e perdeu apoio
popular e a confiança de entidades que o apoiavam, em consequência das
concessões às oligarquias mundial e local.
32. Desde Getúlio Vargas, faltou aos presidentes
focados na realidade do país decisão para convocar o povo às ruas e mobilizar
lideranças do Exército, a fim de ganhar condições de ocupar o poder real.
33. Carecem, por outro lado, de base as ilusões cultivadas a
respeito de líderes como Ulysses Guimarães e Tancredo Neves.
34. Neves derrotou Maluf, nas eleições indiretas de 1985,
porque a oligarquia financeira o preferia. Tanto é assim que sua vitória se
deveu à defecção no PDS para criar a Frente Liberal, liderada por Marco Maciel,
tradicional articulador em favor das oligarquias.
35. Haja vista o ministério legado por Tancredo: Educação: o
próprio Maciel; Comunicações: Antônio Carlos Magalhães (ACM), mantendo o feudo
deste, associado a Roberto Marinho; Itamaraty: Olavo Setúbal, banqueiro do
Itaú; no principal, Fazenda: Francisco Dornelles, defensor de políticas
privatizantes e pró-capital estrangeiro.
= = = = = = =
*Adriano Benayon é doutor em Economia
pela Universidade de Hamburgo e autor do livro Globalização versus
Desenvolvimento.
Fonte: Blog do Adriano Benayon
Fonte: Blog do Adriano Benayon