Domingo, 30 de abril de 2017
Por*
É possível vislumbrar uma nova correlação de forças, apta a alterar a atual luta política
Seu
 sucesso excedeu as melhores expectativas das forças populares, 
constituindo-se numa das mais expressivas manifestações políticas da 
nossa História, porque nacional, abrangente, unitária, madura e 
democrática. Nada a ver, portanto, com a versão tendenciosa dos grandes 
meios de comunicação.
            
Setores
 até aqui silenciosos, como a Igreja Católica e outros credos, passam a 
se contrapor a seitas pentecostais comprometidas, no púlpito e na 
atividade parlamentar, com a pauta conservadora e reacionária.
            
Apesar
 de voltada para a defesa de interesses objetivos dos assalariados 
(repúdio a uma terceirização perversa e a uma reforma da previdência que
 mantém privilégios e só prejudica os mais necessitados), trata-se de 
uma greve política, com apoio popular.
            
Este
 é o fato novo e a partir de hoje, portanto, podemos vislumbrar uma nova
 correlação de forças, apta a alterar a atual luta política.
            
O
 protesto, ademais, valeu por seu significado simbólico e como processo 
de politização e organização dos trabalhadores, levando-os à ação para 
além dos seus interesses imediatos, a etapa superior da batalha 
sindical. Neste ponto se dá a transição da reivindicação econômica 
corporativa para a afirmação política.
            
Tratou-se da afirmação de um sonoro “não” ao governo de fato. Foi este, igualmente, um dos fatores do apoio popular.
            
A
 greve já seria um sucesso pelo simples fato de haver-se realizado na 
esteira da captura do poder pelas forças do atraso, com características 
desconhecidas pela História recente da República, tal o somatório de 
intervenientes adversos: monopólio ideológico dos meios de comunicação 
de massa, donde a deslavada manipulação da informação; governo 
reacionário e repressor, ademais de ilegítimo; e Congresso que, não 
obstante a ausência de representatividade, enceta, sob o comando da 
súcia que ocupa o poder, o criminoso processo de revogação de direitos e
 garantias conquistados desde os anos 40 do século passado e 
consolidados pela Constituição de 1988.
            
Agindo
 em uma razia, o Governo, sem origem na soberania popular, rejeitado 
pelo país (segundo pesquisa IPSOS, 92% da população dizem que o governo 
está no rumo errado), manobrando a peso de ouro (e cargos) a vontade 
parlamentar, intenta destruir a ordem constitucional democrática, os 
direitos dos trabalhadores e a soberania nacional.
            
A
 greve ecoou o sentimento das ruas. Mais que isso, como disse, percorreu
 o país de Norte a Sul, foi abrangente, unitária e democrática, 
cimentando o apoio que logrou na sociedade.
            
Também
 foi pedagógica, ao deixar claro para certas forças da esquerda 
brasileira que o caminho da vitória passa pela política de Frente, tão 
ampla quanto possível, articulando – independentemente de filiações 
partidárias e outras – todas as correntes de pensamento e ação que se 
disponham a dar sua mão aos trabalhadores e aos democratas e 
progressistas na luta contra o desmonte do país, ameaçado por um 
retrocesso de décadas.
            
Do ponto de vista do sindicalismo, constituiu importante instrumento de consciência de classe, conditio sine qua non para
 a intervenção política. De outra parte, haverão de ter aprendido as 
direções sindicais esta lição primária: a liderança não pode afastar-se 
do ‘chão de fabrica’.
            
O
 antídoto da alienação é o diálogo permanente, assim como é a 
organização que assegura a ação. A adesão massiva à greve foi o 
resultado de meses de preparação, de debates, de assembleias e de muita 
‘porta de fábrica’.
            
Esta
 greve – e eis outro grande mérito seu – foi também um sucesso como 
política de Frente na ordem sindical, reunindo todas as centrais 
sindicais, reunindo, por exemplo, CUT-CTB e Força Sindical (tão 
antípodas do ponto de vista estratégico) e reunindo essas forças aos 
camponeses do MST, à Frente Brasil Popular, ao MTST (Movimento dos 
Trabalhadores sem Teto) e à CMT (Central dos Movimentos Populares). E, a
 partir daí, a um sem número de organizações sociais-populares 
espalhadas por todo o país.
            
A
 greve precisa ser comemorada como momento importante da resistência ao 
governo antinacional: pôs em patamar elevado a luta contra suas 
políticas e a defesa da Constituição agredida diariamente pelo 
presidente e sua trupe, pelo Congresso e por setores do Poder 
Judiciário, desde o piso aos tribunais superiores.
            
Para
 as forças populares não há alternativa de combate fora da democracia e,
 na democracia, não há alternativa às crises políticas fora das 
eleições. A organização do povo, ponto de partida para a ação, é a única
 garantia para a restauração constitucional/democrática.
            
O
 que nos cabe é insistir em mais do mesmo: mobilizar, unir e organizar 
as forças populares, em aliança com setores liberais e o capital 
produtivo, para isolar e derrotar o governo antipopular e antinacional, 
oferecendo ao país um novo pacto, que assegure a democracia, o 
desenvolvimento e a soberania, no rumo de uma sociedade mais justa, 
sonho do qual não abrimos mão.
*Roberto Amaral é escritor e ex-ministro de Ciência e Tecnologia

 
 
 
