Quinta, 22 de agosto de 2013
Do Correio da Cidadania
Libra: o povo não sabe de nada |
Escrito por Paulo Metri |
O povo não sabe nada sobre Libra e, se depender da mídia comercial,
continuará inocente para sempre. Sugiro uma enquete feita por um
instituto de pesquisa confiável, com uma única pergunta à população: “O
que você acha do leilão de Libra, que vai ocorrer em 21 de outubro
próximo?”. Aposto que, no mínimo, 95% dos entrevistados não saberão o
que é Libra. No entanto, o leilão de oito a doze bilhões de barris de
petróleo, que se convencionou chamar de campo de Libra, não poderia
passar despercebido. Está em jogo a possibilidade de muito mais recursos
estarem disponíveis, no futuro, para educação, saúde, habitação,
saneamento e outros programas sociais, se este campo for bem
aproveitado. Se for leiloado, a maior parte destes recursos irá para as
petrolíferas estrangeiras.
Este importante fato não é divulgado, simplesmente, porque a mídia
comercial existente é subordinada aos interesses do capital e, neste
assunto, as petrolíferas estrangeiras determinam que a sociedade deve
permanecer em total ignorância. Desta forma, informações confiáveis,
hoje, só na mídia alternativa. O que será desviado da sociedade com o
leilão de Libra corresponde à maior apropriação de um patrimônio público
desde a nossa independência. Só não digo desde a descoberta do país,
porque não sei quanto ouro foi levado das nossas terras para Portugal.
A totalidade do petróleo de Libra vale, no mínimo, US$ 1 trilhão,
mas, provavelmente, chegará a US$ 1,5 trilhão. Nem tudo será desviado,
pois existem o Fundo Social e os royalties. Mas poderia retornar mais
para a sociedade, se Libra fosse entregue sem licitação à Petrobras, que
assinaria um contrato de partilha com a União, satisfazendo o artigo 12
da lei 12.351, e com a máxima contribuição para o Fundo Social.
Qualquer valor abaixo deste máximo que a Petrobras pode entregar deve
ser considerado como um desvio de patrimônio da nossa sociedade.
Assim, o desvio de Libra, se o governo teimar em leiloá-lo para as
empresas estrangeiras, será maior que a transferência de todo manganês
da Serra do Navio no Amapá para formar uma montanha em outro país. Será
maior que o roubo da privatização da Vale, que chegou a US$ 100 bilhões,
ou o das teles, que dizem ter sido em torno de US$ 40 bilhões. Se for
tomado o desvio ou o caixa 2 dos chamados mensaleiros, da ordem de uma
ou duas centenas de milhões de reais, o leilão de Libra significa uma
subtração de recursos da ordem de 10.000 vezes maior que o tão divulgado
rombo do “mensalão”.
Contudo, no caso de Libra, temos o desvio institucionalizado, uma vez
que o leilão não é a melhor aplicação da lei 12.351, mas ele também
está previsto nesta lei. Se o argumento de que o leilão não traz o
melhor impacto para a sociedade for levado a um juiz, ele poderá
indeferir o pedido de sustação do leilão, alegando que este é previsto
em lei e, se a lei é injusta, não cabe a ele, juiz, modificá-la. Aliás,
todas as 11 rodadas de leilões da ANP já ocorridas, seguindo a lei
9.478, excetuando a oitava, tiveram respaldo legal. O Congresso
Nacional, tão comprometido com o poder econômico quanto a mídia, só irá
reverter esta lei se houver grande pressão popular ou se a população
passar a votar melhor, inclusive se deixar de votar contra si própria.
Para descrever a apropriação indevida, há uma correspondência clara
entre este ciclo do ouro negro com o que aconteceu no ciclo do ouro
passado, pois a Coroa são os atuais países-sede das petrolíferas
estrangeiras, a Colônia é a mesma; a administração da Coroa na Colônia
é, hoje, o atual governo brasileiro; os agentes da usurpação são, ontem e
hoje, os estrangeiros; e os usurpados de hoje são os descendentes dos
usurpados do ciclo passado.
Fatidicamente, ficamos sempre com pouco usufruto sobre a riqueza que
nos entrega a natureza ou o Criador. Espoliado desde a invasão europeia
de 1500, o Brasil está no grupo das nações supridoras de grãos e
minérios para os opulentos, que têm tecnologia, indústrias e serviços
com alto conteúdo tecnológico e forças armadas persuasivas e opressoras.
Não há risco em Libra, pois não há dúvida sobre a existência deste
petróleo. Não há pressa, a menos que o governo esteja com dificuldade
para fechar suas contas, inclusive, o superávit primário. Mas, se este
for o caso, lembre-se que se estão comprometendo realizações futuras
durante muitos anos por uma questão conjuntural. Se a Petrobras estiver
com sua capacidade de envolvimento em novos negócios esgotada, pode-se
esperar, pois o abastecimento do país está garantido graças a ela
própria por, no mínimo, uns 40 anos.
Aproveito para salientar que nenhuma empresa estrangeira se dispõe a
abastecer o país, a construir refinarias, contratar plataformas e outros
bens aqui. Querem unicamente o petróleo e seu lucro, em exploração
completamente desvinculada da população que habita a região. Minha
esperança, hoje, são os sindicalistas, os filiados a entidades de
classe, os integrantes de movimentos sociais, os jovens que estão na
rua, os internautas do bem, os perceptivos e honestos da mídia
alternativa e o ex-presidente Sarney, a quem passo a fazer um pedido de
público, já que não tenho canais de interlocução.
Vossa Excelência, durante sua vida pública, deu claras demonstrações
de compreender a importância de se preservar a soberania do país e que
esta posição nacionalista era necessária para se conseguirem avanços
progressistas, tendo o seu governo se norteado por estes princípios. De
memória, cito algumas medidas soberanas e progressistas do governo de
Vossa Excelência: criação do Mercosul; determinação do domínio completo
da tecnologia do Ciclo do Combustível Nuclear; decisão da construção do
submarino nuclear; acordo com a China para o lançamento conjunto de
satélite; moratória da Dívida Externa; lançamento do Plano Cruzado com o
controle dos preços; reatamento com Cuba; criação do Ministério da
Reforma Agrária; criação do Ministério da Cultura, com a nomeação do
economista Celso Furtado para exercer o cargo de ministro; legalização
de todos os partidos antes clandestinos e reconhecimento das centrais
sindicais; nomeação de um nacionalista como Renato Archer para o
Ministério da Ciência e Tecnologia; defesa da Causa Palestina e da
Nicarágua Sandinista nos fóruns internacionais; defesa na ONU da
autodeterminação e independência do Timor Leste; e reserva de mercado da
informática, com a criação da Secretaria Especial de Informática,
reserva esta mal interpretada até hoje.
Assim, peço a Vossa Excelência, político respeitado e de muitos
aliados, que tem a sensibilidade necessária para compreender os
argumentos de soberania, que é imprescindível para o progresso social
colocar todo o seu peso político adquirido, em anos de atuação no nosso
cenário, para que o leilão de Libra seja suspenso e este campo seja
entregue à Petrobras, sem licitação prévia, através de contrato de
partilha, como permite a lei 12.351. O povo brasileiro, no dia que
ganhar consciência plena, será muito agradecido a Vossa Excelência.
Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia Blog do autor: http://www.paulometri.blogspot.com.br/ |