Segunda, 11 de abril de 2016
Da Auditoria Cidadã da Dívida
* por Gregório Grisa
Prezado(a),
A corrupção que estampa suas manchetes matinais todos os dias não é o maior problema do Brasil. Sinto lhe dizer isso.
Essa corrupção não está entre os maiores ralos de recursos públicos que existem. Nem perto.
Essa corrupção é uma cortina de fumaça a serviço de um moralismo
seletivo comprado e reproduzido raivosamente por muita gente, quiçá por
você.
A corrupção é um elemento cultural complexo simplificadamente
apresentado e noticiado. Tornando-se assim algo de fácil digestão, que
capta raiva, produz pré julgamentos e mobiliza passionalidades mesmo em
corruptos.
A corrupção é um bode expiatório colocado na pauta pública para que
os temas que realmente merecem atenção da cidadania não sejam levados em
conta.
A corrupção que te irrita é muito menor, proporcionalmente, do que a corrupção que naturalizas ou desconheces.
A corrupção legal é imensamente maior do que a corrupção ilegal.
Darei-lhe quatro exemplos, alguns deles podem ser melhor entendidos no artigo publicado pelo jornal a Gazeta do Povo, “O Banco Central está suicidando o Brasil“.
1 – O mecanismo financeiro chamado “swap cambial” (contratos que
pagam perdas cambiais para bancos e investidores) praticado pelo Banco
Central do Brasil gastou R$ 207 Bilhões em 2015. BC paga isso gerando
títulos da dívida.
2 – Segundo o Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda
Nacional, em 2015 foram sonegados mais R$ 420 Bilhões em impostos no
Brasil. De acordo com a consultoria Global Financial Integrity a saída
ilícita de capitais chegou a US$ 226,6 bilhões em dez anos no Brasil
(2004/2013).
3 – O Estado brasileiro pagou em 2015 apenas de juros da dívida pública R$ 501,8 Bilhões (Fonte: BCB).
4 – As chamadas operações compromissados ou de mercado aberto do
Banco Central (BC enxuga toda sobra de caixa dos bancos que excede 5% do
PIB e os paga gerando dívida pública) já custam R$ 1 trilhão, isso
mesmo, um trilhão de reais.
Caro indignado com a corrupção, nenhum escândalo que o irrita
representa algo minimamente próximo aos gastos do Estado (com nossos
impostos) em rolagem e pagamento de juros da dívida pública.
Detalhe, esses gastos ocorrem sem que nenhuma contra-partida para o
resto da sociedade seja garantida, é uma escolha de política
macroeconômica de uma plutocracia (pesquise) que mesmo plenamente
agraciada pelo atual governo quer trocá-lo por um mais leal aos seus
interesses.
Todo esse gigante volume de recursos dos quatro exemplos citados
beneficia uma pequena elite que vive de renda, de juros e da fraterna
estrutura tributária que a exime de impostos. Ver este estudo da ONU.
Agora você tem algumas razões para refinar qualitativamente sua
raiva, bradar por um outro tipo de corrupção, que não tem um partido só
como produtor, mas um sistema bem mais complexo que talvez você defenda
sem saber.
* Gregório Grisa Pós-Doutorando em Sociologia na UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul