Terça, 18 de junho de 2013

Texto e fotos pelo celular de Chico Sant’Anna
Há muito, a Capital Federal não vivenciava uma mobilização dos
brasilienses de tal envergadura. A marcha de milhares de jovens ao
Congresso Nacional na tarde de segunda-feira, 17/6, foi de proporção
similar ao dia da votação das Diretas Já e da promulgação da
Constituição, em 1988. O jardim frontal ao edifício do Congresso
Nacional abrigou uma multidão calculada no seu momento de pico entre
oito e dez mil manifestantes. Não só a parte frontal ficou totalmente
tomada, como também as laterais inclinadas do gramado do Parlamento
serviram de arquibancada para centenas de jovens.
Só jovens: esta foi outra marca desta segunda-feira. Muitos eram menores de idade, secundaristas e a grande maioria tinha idade de 1vinte e poucos anos, não mais. Nenhuma bandeira de partido ou central sindical. Nem mesmo a UNE, que se notabilizou pelos caras pintadas se fazia formalmente

Sem lideranças tradicionais, os jovens tinham em comum um objetivo: demonstrar sua indignação. Uma indignação potencializada, no caso de Brasília, pelos gastos bilionários para sediar um único jogo da Copa das Confederações, em detrimento da

Cantando slogan, hinos nacionais ou mesmo refrãos comuns aos estádios de futebol devidamente adaptados ao momento político e gritando palavras de ordem não pouparam ninguém. Os alvos principais foram a presidente Dilma e o governador Agnelo, mas sobrou para as principais lideranças

Também a imprensa tradicional não foi poupada. A Rede Globo, como na época das Diretas Já era constantemente tema de palavras de ordem que demonstravam a perda de credibilidade da rede midiática. Por sinal, à tarde, mensagens veiculadas em outras redes, as sociais, orientavam os manifestantes a que eles mesmos documentassem e divulgassem informações e imagens

Nada de faixa confeccionada de forma profissional. Os cartazes, feitos a mão, em cartolinas e com pincel atômico, também demonstraram que a indignação popular é motivada por múltiplos temas da conjuntura nacional. Foram questionados desde os gastos com a Copa do Mundo, a votação da PEC 37, que reduz o poder de investigação do Ministério Público; mensaleiros, concessões de rádio e televisão a políticos, a corrupção no poder públco, reeleição…
Assunto para motivar insatisfação é que não faltou.

Cordão Policial
A Polícia Militar do Distrito Federal, formou um cordão de isolamento com 400 homens, segundo um comandante no local. Era uma linha de contenção, às margens do laguinho que separa o Congresso Nacional do gramado em frente. Por de trás dela a Polícia do Legislativo e viaturas perfiladas como se fossem barricadas.
À frente da PM os manifestantes, cujo objetivo era ocupar o Congresso e acampar no Salão Verde.
Várias investidas foram feitas contra o cordão de isolamento, repelidas muitas vezes com spray de pimenta. Os jovens só conseguiram êxito quando dezenas de pessoas conseguiram subir na marquise do Congresso Nacional.

A tomada da marquise foi festejada como uma apoteose. Há muitos anos a marquise é espaço proibido até para turistas.
Aos gritos de o Congresso é do Povo, dançaram em torno da cupula da Câmara dos Deputados como se fosse um troféu, uma taça. Depois, se concentram na beirada da grande laje que abriga as cúpulas do Senado e da Câmara e a sombra dos manifestantes trazia um simbolismo que encantava os demais manifestantes que em milhares continuavam no gramado e de lá ligavam seus celulares na função lanterna. Os celulares são hoje as velas que marcaram manifestações do passado.

Ao
mesmo tempo em que ocorria a tomada da marquise outro grupo de
manifestantes entrou na via de acesso à Chapelaria da Câmara, principal
entrada de carro ao Congresso e que fica abaixo do nível dos jardins.
A ocupação da marquise do Congresso parece ter desnorteado por algum
tempo o esquema de segurança, que além da Polícia Militar contava com
agentes da Polícia do Legislativo das duas Casas do Parlamento. O certo é
que os manifestantes conseguiram romper o cordão de isolamento,
atravessar dos laguinhos, que foram construídos para dificultar a
aproximação de manifestantes, e chegaram até à varanda do Congresso. De
lá, um grande número saltou para o acesso de carro à Chapelaria da
Câmara dos Deputados, se somando aos que haviam entrado antes.
Senadores
Um grupo de parlamentares formado pelos senadores, Paulo Paim e Eduardo Suplicy, do PT, e Inácio Arruda, do PCdoB, chegou a ir até à varanda na expectativa de poder dialogar com os líderes dos protesto. Não tiveram êxito. Foram dissuadidos pelos seguranças que consideravam a situação perigosa e desaconselharam os três parlamentares a sair para o contato com os jovens. Outro problema é que não era possível identificar na multidão quem eram as lideranças.

Um medo reinou entre os presentes que temiam que a manifestação pudesse transformar-se numa grande catástrofe e com muitos feridos. Não havia canais de interlocução. Nenhuma liderança política local ou nacional se fez presente temendo ser mal recebida. Entre os manifestantes e o interior do Congresso Nacional apenas as grandes janelas de vidro da Chapelaria do Congresso e um cordão de isolamento policial menor do que o existente do lado de fora e que já fora subjulgado. Embora bem inferior aos manifestantes, estavam bem armados com pistolas taser, pistolas tradicionais, cassetetes, sprays de pimenta – que foram largamente utilizados – e outros apetrechos.
Além desses policiais, nas laterais externas, o Congresso estava literalmente cercado por soldados e viaturas da Patrulha Tático Móvel – Patamo, do Batalhão de Operações Especiais – Bope e do Corpo de Bombeiros. No Congresso Nacional correu, inclusive, a informação de que o presidente em exercício da Câmara, deputado André Vargas, havia autorizado a entrada do Bope na Casa, caso o Parlamento viesse a ser invadido. Durante muitas horas o clima de tensão foi grande e a falta de uma perspectiva de como a manifestação acabaria deixou muita gente preocupada.
Por fim, os manifestantes foram se dispersando, por volta das 22 horas, após mais de seis horas de protesto. Foram embora, mas deixaram uma mensagem forte e que não deve ser ignorada nem pelos políticos da Capital Federal nem do governo Federal. O brasiliense que foi às ruas não acredita mais nos partidos, não confia nas autoridades constituídas e estão descontentes com as prioridades adotadas pelos governos do Distrito Federal e do Brasil em detrimento das necessidades sociais.

Esta avaliação estava bem clara nos cartazes. “Brasília Acordou”, diziam uns. “Este foi apenas o primeiro dia” diziam outros. Não foi a voz rouca das ruas, como se costuma classificar os clamores populares, mas sim um grito uníssono, bastante audível e que pode se repetir por mais vezes se novos rumos não forem adotados pelas autoridades constituídas.