Sexta, 23 de agosto de 2013
Se a conta-corrente é antiga, ativa e tem
movimentação financeira razoável, o banco não pode, sem que haja motivo
justo, encerrá-la de maneira unilateral e mediante simples notificação. A
decisão, unânime, é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ).
Dois correntistas entraram na Justiça depois de receber
notificação do Banco Santander informando que sua conta-corrente, ativa
desde 1969, seria encerrada no prazo de dez dias por desinteresse
comercial. A ação foi aceita pela primeira instância, que determinou a
manutenção da conta e fixou indenização de mais de R$ 8 mil por danos
morais. O banco recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que
entendeu como possível o encerramento unilateral das contas pelo banco e
afastou a indenização.
Ao analisar a legitimidade da rescisão
unilateral do contrato baseada exclusivamente no desinteresse comercial
da instituição financeira, a Terceira Turma, depois de um longo debate,
reverteu a decisão do TJSP.
Abuso de direito
O
ministro Paulo de Tarso Sanseverino entende que o banco só poderia
encerrar unilateralmente a conta se houvesse algum problema cadastral ou
de inadimplemento dos correntistas. Simplesmente dizer que perdeu o
interesse no contrato, sem qualquer outra justificativa, não seria
suficiente. “Em pleno século XXI, adotou-se uma postura que seria
razoável no século XIX, encerrando abruptamente uma relação contratual
de longos anos”, afirma.
Sanseverino reconhece abuso de direito
no caso. Para ele, a liberdade contratual deve ser exercida levando em
consideração a função social do contrato e deve respeitar as regras
éticas e da boa-fé objetiva.
Liberdade de contratar
Para
a ministra Nancy Andrighi, a situação é diferente da contratação
inicial, quando a instituição financeira pode aplicar a liberdade de
contratar, por se tratar de uma atividade de risco e que exige diversas
medidas de segurança.
No caso, afirma a ministra, falta uma
justificativa razoável para a perda de interesse no contrato de
conta-corrente por parte do banco após mais de 40 anos de relação
contratual, mesmo que a rescisão unilateral por qualquer uma das partes
esteja prevista em resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN).
“Não
há como compreender como legítimo exercício do direito de não
contratar, sem qualquer alegação de alteração da situação fática das
partes, que o interesse comercial por tantos anos existente, tenha se
perdido”, esclareceu.
Em seu voto, Andrighi ainda cita que,
mesmo que o planejamento estatal sirva apenas de indicativo ao setor
privado, a extinção imotivada de conta-corrente contraria o atual
movimento do governo brasileiro pela inclusão bancária.
Dever de manutenção
O
ministro Sidnei Beneti, relator do processo, primeiramente votou pela
manutenção do acórdão do TJSP. Com o debate gerado, Beneti convenceu-se
de que a solução legal mais adequada seria aquela dada pela sentença de
primeiro grau, uma vez que o caso apresenta particularidades não
presentes nos precedentes jurisprudenciais citados em seu primeiro
entendimento.
Após enaltecer a importância do julgamento
colegiado, que possibilita, segundo ele, uma formação da vontade
jurisdicional mais profunda do que o julgamento que se atenha à análise
inicial individual, o relator concordou com os pontos levantados por
seus pares e entendeu que é necessário proteger o correntista como
consumidor.
Para o ministro, o fato de ser uma conta-corrente
vinda de longo tempo e mantida em constante atividade afasta a faculdade
do banco de, imotivadamente, por seu próprio arbítrio e com uma simples
notificação, encerrá-la: “A pura e simples conclusão de que o banco não
teria o dever de manutenção das contas-correntes de longa duração,
vivas e com razoável movimento, dada a pretensa liberdade unilateral de
contratar, encerraria rendição do intérprete judiciário à
inquestionabilidade do positivismo jurídico”.
Com a decisão,
fica restabelecido o que foi determinado pela sentença de primeiro grau,
que condenou o Banco Santander a manter as contas-correntes e, levando
em consideração o dano à honra sofrido pelos correntistas, reconheceu o
direto à indenização por danos morais.