Quarta, 16 de março de 2016
Da Tribuna da Imprensa
Igor Mendes
As
manifestações ocorridas no último domingo, 13, superaram as de março do
ano passado, que já haviam sido as maiores realizadas desde o estouro
da Operação Lava-Jato e o início das movimentações pelo impedimento de
Dilma Roussef. Exalta-las simplesmente, como tremendo ato patriótico,
quando são encabeçadas pelos mesmos vendilhões de sempre, adoradores do
Tio Sam, seria atitude tão equivocada quanto denunciá-las e tachá-las
apenas como “coxinhagem”, pois que demonstram a ampla e inequívoca
insatisfação de setores expressivos da população com o atual
gerenciamento de turno, mas não só com ele.
O
fato de Aécio, Alckmin e outros canalhas do tipo, próceres da oposição
oficial, peessedebista, terem sido expulsos do ato, em plena Avenida
Paulista (sua cidadela), não poderia ser mais significativo. Revela que,
embora dividindo o mesmo espaço físico, há que encarar as marchas de
domingo não como uma única manifestação anticorrupção, mas como
múltiplas expressões de descontentamento, inclusive divergentes entre
si. Estava presente, sem dúvida, o viés aristocrático, fascistoide,
tendo na Rede Globo seu principal promotor, que visava imprimir às
marchas um caráter estritamente anti-PT, defensor da “moral e dos bons
costumes” –os chamados “organizadores”, gente oportunista, inexpressiva
politicamente, não merecem ser levados a sério. Havia grupos ainda mais
reacionários, organicamente vinculados à extrema-direita, reivindicando
golpe militar e bradando contra o “comunismo” (qual?!), porém
francamente minoritários em meio à multidão.
Mas
também havia, por debaixo dessa casca, ressaltada na cobertura dos
monopólios de imprensa, milhares e milhares de pessoas –a maioria, de
certo –honestamente convencidas de que as coisas no País vão de mal a
pior, e que é preciso tomar as ruas em vez de ficar de braços cruzados;
pessoas convencidas de que o atual sistema político-partidário não passa
de imenso balcão de negócios, perfeitamente conscientes que, se o PT
roubou, todas as demais siglas também o fizeram. Esses brasileiros,
pertencentes majoritariamente à classe média (a real, não aquela
inventada pelas estatísticas do governo), são as que sentem pesadamente
sobre seus ombros a carga tributária escorchante –daí sua sensibilidade
acurada para o problema da corrupção, que veem, ingenuamente, como a
fonte de todos os males –, pagam aluguéis exorbitantes para manter-se
nas regiões mais valorizadas das cidades, desesperam-se ao perceber que
seus filhos, dificilmente, poderão manter o padrão de vida por elas
estabelecido. Sua aparente hostilidade ao movimento operário-popular,
que identificam com o PT, não provém de um racismo hereditário, e sim do
pavor, tão comum em sua classe, de verem-se rebaixadas à condição
proletária.
Pretender
uma explicação diversa, supor que, no Brasil, há poucos dias, marcharam
milhões de pessoas organizadas em hostes fascistas, reivindicando em
uníssono um golpe militar, seria não apenas grosseira mistificação da
realidade, como nos levaria a conclusões práticas totalmente
equivocadas.
Temos
dito e repetido aqui nestas páginas, e o reafirmamos agora, que a maior
ajuda que podemos dar à direita seria deixar-lhe o monopólio da
oposição a esse (des)governo que temos, seguramente o mais impopular da
nossa história recente. A lamúria petista de que eles simplesmente fazem
o que todos os seus antecessores fizeram não merece a menor
consideração, porque eles, justamente, cavalgaram durante trinta anos o
movimento popular prometendo que, uma vez lá, agiriam diferente. São
merecedores, portanto, do repúdio que lhes recai, repúdio que pode ser
levado adiante, transformando-se em consciência de que a crise do atual
gerenciamento de turno é a crise de todo o capitalismo burocrático, que
só pode ser debelada pelo avanço dum processo revolucionário, ou para
trás, para ser manipulado pelos mesmos interesses que nos sangram há
quinhentos e tantos anos, os do imperialismo, da grande burguesia e do
latifúndio.
É dentro da luta, e não fora dela, com passividade ou choramingos, que se decidirá o desenlace dessa questão.