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(Millôr Fernandes)

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Dilma ficou boazinha

Terça, 20 de agosto de 2013
Por Ivan de Carvalho
Quando estava no Senado (e na oposição ao governo Lula), Antonio Carlos Magalhães, o avô, quase solitariamente defendia a adoção do que chamava “orçamento impositivo”, como uma maneira de evitar que o Executivo barganhasse o apoio e evidentemente os votos dos congressistas pela liberação de recursos que atendessem às “emendas parlamentares” apresentadas individualmente pelos integrantes do Legislativo e incluídas, por aprovação no Congresso, no Orçamento da União.

         A bem da verdade, ou do que penso ser a verdade pelo que conheci do senador Antonio Carlos Magalhães, se ele não estivesse na oposição, mas no governo e, principalmente, se ele fosse o governo, o presidente da República, ele não estaria de acordo com a sua insistente proposta como senador da oposição. Ele seria contra o “orçamento impositivo” e a favor de persistir o arbítrio do Executivo na escolha das emendas que atenderia e das que desprezaria.

ACM, o avô, gostaria – talvez tanto quanto o ex-presidente Lula, seu governo e seu partido gostaram e como a presidente Dilma Rousseff e o núcleo de seu governo gostaria que continuasse – de manter esse poderoso instrumento orçamentário de cooptação do apoio de deputados e senadores que pleiteiam recursos para obras nas localidades ou regiões em que recebem votação expressiva.

Ontem, reportagem da Folha de S. Paulo dá conta de que (devido ao seu abismal enfraquecimento ante a opinião dos eleitores e consequentes dificuldades no Congresso, onde os aliados pressionam e pelo menos a Câmara parece haver tomado o freio nos dentes, Deus sabe por quanto tempo), somente nos primeiros nove dias de agosto, a soma dos valores liberados para essas emendas parlamentares individuais supera, “com folga”, o montante liberado em qualquer outro mês deste ano. O dado mais impressionante é que, naqueles nove dias de agosto, “as 20 iniciativas orçamentárias que mais concentram emendas receberam R$ 1,2 bilhão, pouco menos que o R$1,4 bilhão autorizado em todo o período que abrange os sete meses anteriores”.

O “orçamento impositivo”, aprovado este mês na Câmara, será apreciado e votado pelo Senado, onde possivelmente sofrerá mudança. Havendo mudança, voltará à Câmara, que tende a aprovar a mudança, se esta for produzida no Senado por meio de negociação que inclua a Câmara.

De qualquer modo, o “orçamento impositivo” não pode entrar em vigor antes de 2014. Assim, a presidente Dilma, que era durona com essas emendas, fica boazinha. E aproveita o instrumento arbitrário que o Executivo ainda tem nas mãos para agradar a deputados e senadores com a liberação de recursos para emendas de aliados e prováveis aliados, em um esforço para recompor sua base parlamentar e partidária com vistas a votações no Congresso e, muito mais do que isso, visando às eleições presidenciais do ano que vem.

E neste último caso a presidente Dilma Rousseff tem mesmo razões muito graves para preocupação. Foram muito divulgadas as quatro últimas pesquisas Datafolha que mostraram a máxima ascenção e a queda da presidente Dilma Rousseff na opinião dos eleitores. Em março, a presidente chegara ao seu recorde, com 65 por cento. Até a primeira semana de junho, quando foi feita a segunda pesquisa, caiu oito pontos percentuais e no fim de junho, após atravessar as três semanas de manifestações populares em âmbito nacional, caiu mais 27 pontos percentuais, chegando assim ao piso de 30 por cento de aprovação de seu governo (ótimo+bom).

Finalmente, na pesquisa mais recente do Datafolha, Dilma mostra uma discreta recuperação – sobe dos 30 por cento para 35 por cento. O governo fez praticamente uma festa de marketing político para comemorar isso. No entanto, tão discreta quanto a recuperação de cinco pontos percentuais da presidente ante a queda total anterior de 35 pontos percentuais foi a divulgação que teve a rejeição encontrada pela pesquisa para a candidata à reeleição Dilma Rousseff. A presidente-candidata “conseguiu” 45 por cento de rejeição – 45 por cento dos eleitores representados na amostragem da pesquisa não votariam nela de jeito nenhum. Isso é um desastre.

Claro que ela tem aí algum tempo, mas pouco, para reverter essa situação. A economia e as finanças estão complicadas, o caos na saúde, a profunda decadência da educação, a total insegurança pública e a imobilidade urbana não são coisas que se resolvem em um piscar de olhos – ainda mais quando é notório que não são as prioridades do governo.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.