Quinta, 19 de
setembro de 2013
Por Ivan de Carvalho

O
que, como com suas palavras salientou à saciedade o ministro Marco Aurélio
Mello na sessão do STF de quinta-feira passada, se considerados esses embargos
válidos no STF e, por força de lei que a eles não se refere no STF,
inexistentes no STJ, está criada uma figura de teratologia jurídica e, mais
especialmente, processual. Disse e repetiu Marco Aurélio Mello que de tal
forma, “o sistema não fecha”.
Mas
isto não conseguiu abrir a cabeça do honrado e competente colega Celso de
Mello. Para ele, prevalecia o princípio de que os embargos infringentes são
válidos no STF porque os réus desse processo (e eventualmente de outros muitos
como este) devem ter assegurado um segundo grau de jurisdição. Como não é
possível recorrer do STF para um tribunal acima dele, recorre-se, por
intermédio dos infringentes, para ele mesmo. “O direito ao duplo grau de
jurisdição, conforme adverte a Corte Interamericana de Direitos Humanos, é
também invocável mesmo nas hipóteses de condenações penais em decorrência de
prerrogativa de foro”, disse Celso de Mello e este era o caso.
Bem,
o decano Celso de Mello deve estar sofrendo pelas sequelas que o voto que sua
consciência jurídica o obrigou a dar – na linha das garantias e da colocação de
obstáculos para que o Estado não passe como um rolo compressor sobre o
indivíduo –, mas com elas, as sequelas, devem estar sorrindo outras certas
pessoas. Afinal, conseguiram não pouca coisa. Conseguiram, principalmente,
tirar da lama em que aparentemente – graças ingentes esforços de alguns com
apoio de muitos milhões de brasileiros – começava a atolar-se a impunidade e a
recolocá-la sobre pedestal que no momento parece à quase totalidade da nação
inatingível.
Creio
que haverá (sem contar o governo e o PT) quem faça pesquisas de opinião pública
sobre a crença no STF, na Justiça e sobre a impunidade, depois que mudou a
composição do Supremo Tribunal Federal e entraram ministros que ajudaram alguns
minoritários que já estavam lá a virar o jogo. E creio, pelo sentimento que
percebi ontem nas pessoas, que os resultados são bem previsíveis – o STF e o
Poder Judiciário perderão feio e a impunidade ficará, isolada, sem a menor
concorrência, no topo das indicações dos entrevistados. Tudo que a duras penas
havia sido feito desde 2007, quando o STF recebeu a denúncia do Mensalão
apresentada pelo procurador geral da República foi desfeito.
De
um colega jornalista, a primeira coisa que ouvi, ao avistá-lo, ontem, foi uma
palavra que dizia tudo do seu ânimo e dispensava outras: “Acabou”. Trocando em
miúdos, trata-se exatamente do que já foi dito linhas atrás – a morte da
crença, a gloriosa reanimação da impressão nacional de impunidade. Esmagada por
esses dois sentimentos, ou fatos, como irá comportar-se a população, como irá
sentir-se a opinião pública? A resposta parece resumida na palavra “acabou”. A
população inerme e inerte, a opinião pública em profunda depressão. Ora, isso
era mesmo o que buscavam.
Bem,
ao despedir-me do colega que me saudara com aquele devastador “acabou”, ouvi-o
dizendo, sem maiores explicações: “Aqueles dois...”. Como ele não ofereceu
espontaneamente explicações, mas eu já estava, àquela altura, preocupado com a
iminência de consumar-se a colonização do Supremo Tribunal Federal pelo Poder
Executivo ou por algum partido e não atentei para perguntar o que, mesmo, ele
queria dizer com esse negócio de “aqueles dois”.
Mas,
gente, se o que desejam é que a população fique inerte e a opinião pública,
depressiva, o contrário é a única coisa digna que se pode fazer – mobilizar-se
a população e manifestar-se a opinião pública. Desistir? Que coisa feia...
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Este artigo foi
publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é
jornalista baiano.