Luciano
Nascimento - Repórter da Agência Brasil
O
presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), voltou a negar
hoje (17) que tenha recebido propina do empresário da Toyo Setal Júlio Camargo,
um dos delatores da Operação Lava Jato. Nesta quinta-feira, em depoimento
ao juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, que julga as causas
ligadas à operação, Camargo disse que Cunha pediu US$ 5 milhões de propina para
que um contrato de navios-sonda da Petrobras fosse viabilizado.
“Qualquer coisa que seja a versão que está
sendo atribuída é mentira. É mais um fato falso, até porque esse delator
[Camargo], se ele está mentindo, desmentindo o que ele delatou, ele por si só
já perde o direito à delação”, disse Cunha, ao falar com os jornalistas.
O presidente da Câmara também acusou o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, de ter “obrigado” Camargo a mentir. “É
muito estranho, às vésperas da eleição do procurador-geral da República e às
vésperas de pronunciamento meu em rede nacional, que as ameaças ao delator
tenham conseguido o efeito desejado pelo procurador-geral da República, ou
seja, obrigar o delator a mentir”, disse Cunha, ao ler trecho de uma nota que
divulgou à imprensa. O mandato de Janot na Procuradoria-Geral da República
(PGR) acaba no dia 17 de setembro e ele pode ser reconduzido ao cargo pela
presidenta por mais dois anos.
Eduardo Cunha disse ver no depoimento uma ação da PGR em
articulação com o Planalto para constranger o Congresso Nacional sobre um
eventual pedido de impeachment da
presidenta Dilma Rousseff. “Há um objetivo claro de constranger o Poder
Legislativo, que pode ter o Poder Executivo por trás, em articulação
com o procurador-geral da República”, afirmou.
Desde a divulgação da lista encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF) por Janot, com os
nomes de políticos envolvidos na Operação Lava Jato, o presidente da Câmara diz ter havido motivação política para a citação de seu
nome na lista. “Tem muitos fatos estranhos desde o início que me colocaram
nessa operação da atuação do Poder Executivo. Há muito estranheza com relação a
isso. Desde o início, nós estranhamos isso. Eu não gosto de fazer acusação que
não posso provar.”
Segundo Cunha, as ações buscaram fragilizá-lo. “A mim não
vão fragilizar e, geralmente quando tentaram fazer isso com a instauração do
inquérito há quatro meses, o efeito foi reverso. Foi bumerangue”, disse ele. Na
opinião do deputado, o depoimento de Camargo foi nulo por ter sido
prestado na Justiça de primeira instância. Cunha lembrou que, por ter foro
privilegiado, todas as investigações envolvendo seu nome têm que passar pelo
STF. “Essa delação dele não existe, é nula porque foi homologada por autoridade
incompetente, porque, se eu faço parte da delação dele, não é o juiz [Sergio
Moro] que deveria homologá-la, mas, sim, o Supremo Tribunal Federal.”
No depoimento, Camargo disse que pagou ao doleiro Alberto
Youssef US$ 5 milhões em nome de Cunha. De acordo com o empresário, o dinheiro
seria usado em campanhas políticas e Youssef foi acionado porque a operação
precisava ser feita com agilidade, e o doleiro tinha dinheiro disponível.
Mais US$ 5 milhões teriam sido pagos por meio de outro
operador, Fernando Soares, o Baiano, a quem Camargo acusou de ser sócio oculto
de Eduardo Cunha. O presidente da Câmara nega e disse que só teve dois
encontros com Baiano para tratar de questões relativas à Medida Provisória (MP)
dos Portos
“Ele [Baiano], aliás em depoimento que ele deu, em
inquérito envolvendo o senador Edson Lobão [PMDB-MA], explica a relação que
teve comigo, e eu confirmei. Apenas fiz uma correção mínima de detalhes
publicamente quando foi divulgada em abril. Ele esteve duas vezes comigo para
falar, na época em que estava sendo discutido o problema de MP dos Portos, que
trata de contratos de concessão e arrendamento de terminais em portos
públicos."
Aos jornalistas, Cunha disse não temer uma possível
acareação com Camargo. “Eu faço, olho no olho, com quem quiser. Eu não tenho
dificuldade nenhuma de rebater quem quer que seja. Quem não deve não teme, e
ele está mentindo, e o delator tem que provar a sua mentira. Não cabe. O ônus
da prova é de quem acusa, não de quem tem que se defender”, afirmou.
O dinheiro das propinas teria vindo das empresas Samsung e
Mitsui. Em depoimento, Youssef disse que Cunha era destinatário de propina paga
pelas empresas Samsung e Mitsui num contrato de aluguel de sondas celebrado com
a Petrobras.
Os presidentes das empresas, J. W. Kim (Samsung) e Shinji
Tsuchiya (Mitsui), vão depor no início de agosto na Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) da Petrobras. “Eu espero que vão o mais rápido possível e que
quebrem todos os sigilos deles e de quem quer que seja; que se investigue a
fundo. Eu não tenho nenhuma preocupação com isso. Zero de preocupação”, afirmou
Cunha, que não descartou a possibilidade de voltar a prestar esclarecimentos na
CPI. “Se a CPI entender que é preciso explicar, que ficou alguma dúvida, eu vou
lá amanhã, pode reunir extraordinariamente, e eu vou lá”, acrescentou.
Em nota, a PGR esclareceu que o depoimento prestado por
Júlio Camargo na Justiça Federal do Paraná não tem relação com as investigações
do STF. Segundo a nota, a audiência referente à ação penal da primeira
instância – que tem réu preso, ou seja, tem prioridade de julgamento – foi
marcada pelo juiz federal Sergio Moro em 19 de junho, a pedido da defesa de
Fernando Soares. E a "PGR não tem qualquer ingerência sobre a pauta de
audiências do Poder Judiciário, tampouco sobre o teor dos depoimentos prestados
perante o juiz".
Já o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência
República, Miguel Rossetto, ao comentar as declarações de Eduardo Cunha, disse:
"O que é fundamental, e que a sociedade vem acompanhando, é o correto
funcionamento das instituições. Correta aplicação das diversas legislações, que
haja transparência nas ações e iniciativas de todas as estruturas de poder. Que
os organismos de fiscalização respondam a essas legislações e trabalham de uma
forma eficiente."
O Palácio do Planalto, por meio da Secretaria de Imprensa,
informou que não vai se manifestar sobre o assunto.
Edição: Aécio Amado