Sábado, 25 de julho de 2015
Por Sergio Augusto G. Pereira de Souza
Procurador da Fazenda Nacional
No momento em que defendemos a estruturação da advocacia
pública do Brasil temos que, necessariamente, nos preparar para,
institucionalmente, defender o Estado nacional e a população brasileira contra
um atentado ao Sistema Tributário Nacional e aos Princípios Tributários
estabelecidos na Constituição Federal.
Por meio da Medida Provisória 683, de 13 de julho de 2015,
iniciou-se o procedimento de destruição de qualquer justiça, isonomia ou
capacidade contributiva ainda existentes no Sistema Tributário Nacional,
através da transformação de tal Sistema em uma “lavanderia oficial” de dinheiro
sonegado.
Se a carga tributária é alta, se é necessário acabar com a “guerra
fiscal”, então façamos uma ampla reforma do STN, mas nunca transformá-lo em
instrumento de lavagem de dinheiro fruto de sonegação e evasão fiscal, sob pena
de erosão de qualquer “dever geral de contribuição” que se queira, por meio da
CF, atribuir à população.
Durante anos o Sinprofaz, eu e vários outros colegas, nos
esforçamos em mostrar as conexões entre a evasão fiscal, a corrupção, a lavagem
de dinheiro e os paraísos fiscais. O Sinprofaz, especificamente, foi feliz em
criar o SONEGOMETRO e mostrar à Sociedade o tamanho da sonegação no Brasil,
consignando claramente que uma Procuradoria da Fazenda Nacional estruturada,
equipada e valorizada, poderia ser um efetivo instrumento contra essa enorme
sonegação.
Infelizmente, a opção do “governo de plantão” não é
instrumentalizar e estruturar a Advocacia Pública Nacional para, fazendo
cumprir a CF e a Lei, alcançar a recuperação de tais valores ilegalmente
desviados, cobrando-se integralmente os impostos e multas previstos e, com
isso, mostrando ao contribuinte honesto, que em dia pagou todos os seus
tributos, a seriedade com a coisa pública e a efetividade isonômica do STN.
A opção do “governo de plantão” foi continuar relegando à
Advocacia Pública Nacional a função de mera “batedora de carimbos de juridicidade”
aos seus desmandos, convidando todos aqueles que, durante anos sonegaram
tributos e evadiram divisas, a “oficializar” os respectivos valores, com baixa
tributação e penalidade nula, como que escarnecendo do rosto do cidadão honesto
que foi retido na fonte durante o mesmo período e jogando-lhe na cara que neste
Pais mais vale fraudar e sonegar do que trabalhar e ser honesto. Esse não é o
“plano Levy”, é a oficialização da “lei de Gerson”.
Para a Sociedade criam-se situações absurdas: o governo
pretende oficializar a lavagem de dinheiro ilegalmente transferido para fora do
Pais com o mero pagamento de 17,5% de IR e 17,5% de multa, incidentes sobre o
valor total oficialmente “lavado” por uma mera declaração de existência de tal
valor. Não é necessário, sequer, reintroduzir tal valor na economia nacional.
Ou seja, 35% “resolve a fatura” e ainda implica em “anistia” de todos os crimes
correlatos (sonegação, evasão de divisas e lavagem de dinheiro).
Por outro lado, o cidadão honesto que no mesmo interregno recebeu
mensalmente mais de R$ 10.000,00 pagou, inevitavelmente, 27,5% de IR. Se ele
errou em sua Declaração, ou teve suas despesas médicas por alguma razão
glosadas pela fiscalização, foi onerado com multa de, no mínimo, 50% sobre os
27,5% já devidos. Esse cidadão é pior que aquele que desviou fortunas para fora
do Pais ?? Porque ele deve pagar mais por sua “infração”, apenas porque não
usou os serviços de um “doleiro”??
Agora, pensemos em todas as autuações fiscais de IR feitas
nos últimos anos e que estão em discussão em Processos Administrativos ou
Judiciais. Todo autuado que assumir a sonegação e declarar que os valores
sonegados estão no exterior poderá se beneficiar da “lavagem oficial”?? Pense
no volume de autos de infração que simplesmente cairá. Que mensagem se envia à
fiscalização??
Isso sem contar que a “lavanderia oficial” resolve a fatura
com meros 35%, apagando por completo todas as outras repercussões de tais
valores em relação a outros tributos, no caso das pessoas jurídicas, uma vez
que o valor “oficialmente lavado”, em que pese ser a base de cálculo do IR, não
repercutirá na tributação por CSSLL, COFINS, PIS, ou mesmo ICMS e ISS. Ou seja,
além de criar uma isenção indireta em seus próprios tributos, a União cria uma
“isenção heterônoma” proibida constitucionalmente relativamente ao tributos dos
outros entes federados.
Amigos, cabe a nós, institucionalmente, impedir tal
descalabro, inclusive como forma de mostrar à população e à Sociedade o nosso
valor como Advogados Públicos, defensores do Estado Nacional e da Sociedade
Civil.
Não tenhamos ilusões: o empresariado apoiará a “lavanderia
oficial”; o Congresso Nacional terá poucas vozes contrárias e será feito um
“acordão”; a mídia econômica exaltará a medida; o governo defenderá sua
necessidade para o equilíbrio do “caixa” da União; o MPF nada fará, até porque
já foi afastado jurisprudencialmente das questões tributárias.
A população, o contribuinte honesto, ficará indefeso e com o
gosto amargo da mentira e do engodo na boca.
Cabe a nós, Advogados Públicos, impedir que isso aconteça:
denunciando à população e à Sociedade a tentativa de construção da “lavanderia
oficial”; chamando o povo à rua para protestar contra tal descalabro;
manifestando-nos em todos os foros possíveis contra tal tentativa;
recusando-nos a “bater o carimbo de juridicidade” a todos os atos
administrativos e legislativos que busquem a implementação de tal medida;
propondo, através de nossas associações de classe, as medidas judiciais
cabíveis para estancar o procedimento que já se iniciou; especialmente,
oferecendo-nos à Sociedade como instrumento de efetiva repatriação de tais
valores, com o pagamento de todos os tributos e multas incidentes, bem como com
a disponibilização dos dados necessários à persecução penal dos responsáveis
por tais desvios.
Diante da efetividade da “lavanderia oficial”, qual de nós
terá coragem de “tocar” uma execução fiscal ou pedir um redirecionamento a
sócios ??
Gostaria de ter uma resposta dos colegas, do nosso Sindicato
e das nossas Associações.
Construir uma Nova AGU requer a coragem de comprar brigas,
não apenas em defesa de nós mesmos e de nossas prerrogativas, mas especialmente
em defesa da Sociedade brasileira.
Sergio Augusto G. Pereira de Souza — Procurador da Fazenda Nacional
Fonte: Facebook de Aldemario Araujo