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(Millôr Fernandes)

domingo, 31 de março de 2024

Golpes e democracias na história do Brasil

Domingo, 31 de março de 2024

Golpes e democracias na história do Brasil

Do Pátria Latina - Papo do Dia - 30 de março de 2024
Pedro Augusto Pinho*

Há certo assanhamento midiático pela proximidade dos 60 anos do movimento que destituiu João Goulart, em 31/março-1º de abril, da presidência da República e lá colocou o Marechal Castelo Branco.

Donos de jornais, rádios e emissoras de televisão, como o Sistema Globo, que deram aos militares todo apoio em 1964, fazem agora críticas aos “anos de chumbo”, como se tivessem se posicionado contra os governos militares.

Esta é nossa história. De pouquíssima consciência política, da incompreensão dos habitantes de seus direitos de cidadania e considerar a soberania brasileira como verdadeira manifestação divina.

Fomos sempre o país de analfabetos, ao iniciar a República eram 65% da população, ao fim do Governo Vargas (1950), em torno de 40%, e, 30%, em 1970, conforme dados do IBGE. Hoje são quase 6% os analfabetos no Brasil, enquanto países mais pobres como Bolívia, Cuba, Venezuela, já zeraram esta estatística que nos envergonha. Isso no sentido mais literal da palavra, o que dizer então do analfabetismo político?

Poucos momentos da nossa história foram de desenvolvimento nacional. Ela é narrada, quase exclusivamente, pela espoliação estrangeira, com ajuda de pequena casta nativa que se satisfaz com as gorjetas.

E 1964 representou um desses momentos de exceção, o que não era esperado pelos Estados Unidos da América (EUA), que viam no golpe mais uma demonstração da “Doutrina Monroe” (1823), a América para os Estadunidenses, complementada pelo “Destino Manifesto” (1845).

Realmente, no governo Castelo Branco houve muitos entreguistas ocupando funções importantes na administração, mas a decisão não estava com estes, preferencialmente era dos tenentistas de 1920 e revolucionários de 1930, agora generais ou marechais. Um exemplo: Adhemar de Queiroz, marechal que presidiu a Petrobrás, de 07 de abril de 1964 a 30 de junho de 1966.

E foram estes nacionalistas que deram o golpe de 1967, abrindo espaço e recursos para o extraordinário desenvolvimento brasileiro de 1967 a 1980.

A sucessão do Presidente Geisel foi o momento do terceiro golpe, aplicado pelas finanças, que assumiram o poder com a “redemocratização” no Governo Collor de Mello e, desde então, dirigem o Brasil.

ALGUNS FATOS E CONCEITOS RELEVANTES

Desde o iluminismo, um Estado Nacional só pode ser Soberano ou Colônia. Não existe estágio intermediário. Estado Soberano tem o poder nas mãos de nacionais que agem sem restrições, pois sabem constituir o estado com capacidade de se defender militarmente, politicamente, ideologicamente das tentativas de submetê-lo a qualquer poder estrangeiro.

Esta consideração não é devida somente à submissão a outro estado. Desde os anos 1980/1990, o poder financeiro neoliberal submete os Estados às finanças apátridas, colocando o mercado e não outro Estado Nacional como condutor das decisões. Assim, é uma centena de trilionários, anônimos, quem governam os Estados que aceitam o mercado como poder supranacional.

O Brasil é uma colônia. Como são os Estados Unidos da América (EUA). Mas Israel e Irã estão mais para estados ideológicos, como todos religiosos, sendo o primeiro também racista.

Um exemplo de Estado Nacional é a Rússia, que defende a cultura de seu povo e seus interesses econômicos, tecnológicos, sociais, militares, desenvolvendo-os para enfrentarem ações dominadoras estrangeiras. Não é o mercado universal que governa a Rússia, mas a estrutura de administração constituída para tal, coerente com os valores nacionais.

Mas perguntamos: quais são os valores nacionais e como estão representados na estrutura de administração do Brasil do século XXI?

Um País independente, soberano, não é um país de analfabetos. Ao contrário, é o País onde todos têm educação laica, destacando o conhecimento da história e a construção dos valores nacionais. Seria o Brasil dos CIEPS, conforme idealizados por Darcy Ribeiro, Oscar Niemeyer e implantados por Leonel Brizola no Rio de Janeiro.

Porém, o que aconteceu com os CIEPS? Foram destruídos para que o Brasil não saísse do estado colonial e mantivesse a oligarquia que o dirige, em nome das finanças apátridas, que verdadeiramente lucram com as imensas riquezas brasileiras.

A história do Brasil tem sido a de uma colônia, com poucos momentos de soberania, sempre desfigurada e combatida pelos “liberais” brasileiros.

Nesta nossa Nação, as palavras ganham sentido ambíguo, destoante das raízes filológicas, gerando imensa confusão, da qual se aproveitam aqueles que vivem das gorjetas. E, o pior, é serem tão baratos, tão medrosos, incultos e pouco ambiciosos. Pois apenas com pequeno esforço poderiam viver em verdadeiro paraíso. Bastava acreditar no trabalho e na participação popular.

São o trabalho e a participação popular, que oferecia à Nação o presidente João Goulart, que levou um grupo de civis, militares, com apoio da Embaixada dos EUA, a promoverem o golpe de 1964.

Porém este conjunto impatriótico não se sentia capaz de assumir o controle do País e se valeu dos militares nacionalistas que, para governar, deram o golpe de 1967. Um golpe que durou 13 anos e que transformou o Brasil.

QUAL ESTADO É LIBERAL: DE LOCKE, DA SÍNTESE DOS SONG, DE FICHTE, KELSEN OU ESTÁ POR SURGIR?

Os liberais são diversos, não constituem um conjunto homogêneo.

A crença de Confúcio (551 a.C.-479 a.C.) no homem, que antecede Sócrates (470 a.C.-399 a.C.), pode ser entendida como a mais antiga manifestação liberal: “não há razão fora do mundo, e este é uma construção humana” (Anne Cheng, “Histoire de la Pensée Chinoise”, 1997).

No entanto, com John Locke e Adam Smith o liberalismo toma a feição econômica. Não é a liberdade para o desenvolvimento do homem, mas para seu enriquecimento, ou seja, para se apropriar da liberdade dos outros para seu proveito. A este liberalismo se insurge a defesa dos direitos humanos, Voltaire e Rousseau, que dão sustentação teórica à Revolução Francesa. Porém, diante do materialismo dialético, de Marx e Engels, os franceses Montesquieu e Diderot passam a ser liberais, no sentido do pluralismo político.

E Fichte, que defendia o direito natural, é visto como formulador do autoritarismo, das bases para ditadura no estado moderno.

Nesta pequena súmula, o prezado leitor pode ver que há ideias para sustentar a vida livre e a vida escrava, sob a mesma designação liberal. O que dizer dos neoliberais, Ludwig von Mises e Friedrich Hayek, para quem tudo se resume no ganho financeiro, apenas o lucro motiva o homem.

E vem então um general, senador brasileiro, e diz que o principal problema do Brasil, neste século XXI, é o comunismo. Além do Tio Patinhas e do Mickey Mouse, o que mais lerá este senhor?

Pois seu colega de farda, Tenente-Brigadeiro do Ar Francisco Joseli Parente Camelo, presidente do Superior Tribunal Militar (STM), explicitamente disse ao entrevistador da Rede Bandeirante não ser o comunismo algo que deva preocupar os poderes brasileiros. Mas a educação.

Vê-se a distância dos que querem gerar antagonismo entre civis e militares quão longe estão dos reais problemas nacionais. São simples oportunistas que merecem nosso repúdio.

A QUESTÃO NACIONAL

O problema do Brasil, de ontem e de hoje, continua sendo a colonização que se entranhou profundamente em nossa sociedade e que beneficia poucos mas prejudica quase todos.

Estes mínimos beneficiários são os arautos de doutrinas importadas, de conceitos imprecisos, quando não absurdos, mas que têm a seu favor os sistemas escolar e das comunicações.

Fica difícil; uma luta desigual que extingue os CIEPS e tira a Questão Nacional, a mais relevante pauta política, dos debates em todos os níveis.

A privatização, que exporta o poder brasileiro das decisões sobre nossas riquezas, não é discutida pois a questão nacional não entra em pauta.

A educação, universalmente considerada prioritária, dos mais conservadores aos mais revolucionários, também está fora das pautas, pois não se pode tratar da educação sem discutir seu objetivo, que é uma questão nacional.

Os rumos do desenvolvimento brasileiros repetem os slogans do financismo apátrida, pois entender a energia, a industrialização, as relações internacionais, exigem compreender a questão nacional.

Neste 1º de abril, mais uma vez, não se discutirá o Brasil, a questão nacional, mas as ações ignóbeis do estado onde houve torturadores – e não é este das atuais milícias, ora aparecendo cautelosamente, porém mais danoso – e assassinos – sendo o estado dos traficantes o maior deles, recebendo dízimos do pastor Silas Malafaia, aquele dos 150 milhões de dólares estadunidenses, conforme a revista Forbes, mas negado por ele, na sua Igreja Neopentecostal, a cada quinzena.

O jornalista Marcos de Oliveira, dá como título, para sua coluna “Fatos & Comentários”, no Monitor Mercantil, na quinta-feira, 28 de março de 2024: “Os críticos ladram e a China segue crescendo”.

Isso significa que, após intensos debates entre as forças políticas chinesas, iniciado a partir da Revolução Cultural de Mao Tse Tung, chegou-se ao modelo que vem sendo seguido há mais de 20 anos. E tem levado aquele país, continental como o Brasil, e muito mais populoso, ao pódio do desenvolvimento em todos os campos, e, especialmente, ao econômico e tecnológico.

Reconstruamos pois o Brasil para o século XXI, colocando a Questão Nacional como principal item da pauta política brasileira.

* Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.