Quinta, 17 de janeiro de 2013
Por Ivan de Carvalho
Lá vêm os ingleses outra vez. O jornal Financial Times, no seu blog Beyond
Brics, qualificou os dois principais agentes da equipe econômica brasileira – o
ministro da Fazenda, Guido Mantega e o presidente do Banco Central, Alexandre
Tombini, de “profissionais do jeitinho brasileiro”.
Depois de uma breve explicação sobre
o significado de “jeitinho brasileiro”, o Financial
Times afirmou que as duas autoridades estão usando artifícios pouco usuais,
ainda que legais, na condução da política econômica e financeira do Brasil. “Com
crescimento ainda lento e preços subindo mais do que esperado, o presidente do
Banco Central e o ministro da Fazenda também estão ficando profissionais do
jeitinho, embora de forma legal”.
É evidente que à conta do jeitinho
brasileiro, ainda que não haja explicitado, o jornal inglês creditou as
recentes cambalhotas financeiras feitas pelo governo para dizer que atingiu –
sem haver atingido, na realidade – a meta de superávit primário, destinado ao
pagamento do serviço da dívida pública.
De acordo com o jornal inglês,
Mantega pode ser considerado um “expert” no jeitinho, pois passou os últimos
anos “brincando” com impostos para tentar gerenciar o crescimento econômico e o
câmbio. Uma dessas brincadeiras certamente consistiu nas desonerações
temporárias de certos produtos (a exemplo do IPI nos automóveis e
eletrodomésticos) para, ao lado do crédito fácil e a longo prazo, induzir ao
consumo.
Outro exemplo do “jeitinho
brasileiro” na economia está sendo dado agora e foi citado pelo jornal
britânico. O governo federal pediu às prefeituras de São Paulo e do Rio de
Janeiro (cujos prefeitos, o primeiro do PT e o segundo, do PMDB, atenderam)
para adiarem o aumento que ia ser aplicado nos valores das tarifas dos ônibus.
O objetivo do adiamento para meados do ano é evitar o impacto que esse reajuste
de tarifas teria sobre a inflação ela superaria os 0,80 por cento previstos
para janeiro, atingindo ou ultrapassando 1 por cento e ficaria muito perto de
6,5 por cento no acumulado dos últimos 12 meses, o que, presume-se, deixaria os
investidores desconfiados.
Claro, adiar o aumento das tarifas
dos ônibus em São Paulo e no Rio de Janeiro por uns meses é legal, mas se
enquadra na filosofia do “jeitinho brasileiro”. Em São Paulo, a tarifa está em
R$ 3,00 há dois anos e se fosse reajustada para corrigir toda a inflação do
período, iria para R$ 3, 36. No Rio, uma correção de 5,5 por cento e a nova
tarifa de R$ 2,90 já haviam sido anunciadas para entrar em vigor a primeiro de
janeiro, mas o ministro da Fazenda, arrancando alguns dos últimos fios de
cabelo, pediu o adiamento ao prefeito Eduardo Paes. Em tempo: na capital baiana
a prefeitura mexeu nas tarifas em junho passado.
O que o Financial Times e, um pouco antes dele, a revista The Economist vêm apontando é um
artificialismo financeiro e econômico, praticado dentro da lei, mas com o
propósito evidente de driblar a realidade, que certamente estará esperando na
próxima esquina para dar o bote. A revista chegou a sugerir, em editorial, a
demissão do ministro Guido Mantega como, digamos, um “jeitinho” para a
presidente Dilma Rousseff recuperar a confiança dos investidores e conseguir um
segundo mandato. The Economist chegou a chamar a economia brasileira de
“criatura moribunda”, ao se referir ao crescimento do PIB em apenas 0,6 por
cento no terceiro trimestre do ano passado, metade do que previra Mantega.
Mas vamos – embora admitindo como
verdadeiras as acusações das duas publicações britânicas – ser francos. Em
matéria de “jeitinho”, o Financial Times
e a The Economist inglesas deveriam
estar muito mais preocupadas com a economia americana, onde, nos últimos anos,
outra coisa não se faz a não ser aplicar “jeitinhos” sucessivamente superados
pela realidade, que leva o governo a novos jeitinhos, não havendo a menor
garantia de que tudo vai acabar bem.
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Este
artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan
de Carvalho é jornalista baiano.