Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 19 de janeiro de 2013

Tiro no pé

Sábado, 19 de janeiro de 2013
Por Ivan de Carvalho   
O deputado federal Jean Wyllys, do PSOL do Rio de Janeiro, autor de um projeto de lei que “legaliza a prostituição”, disse ao portal iG, ao avaliar as chances de aprovação de sua proposta, que 60 por cento dos congressistas homens usam os serviços de prostitutas.

            “Eu diria que 60 por cento da população masculina do Congresso Nacional faz uso dos serviços das prostitutas, então acho que esses caras vão querer fazer uso desse serviço em ambientes mais seguros”, afirmou o autor do projeto.

            Não tenho informações a respeito do percentual de congressistas que usa os serviços de prostitutas. Nem mesmo sei se foi feita alguma pesquisa para verificar isto, muito menos se o deputado Jean Wyllys teve acesso aos resultados de alguma que haja sido feita.

            Admitindo, claro, por evidente, que há congressistas que usam os serviços de prostitutas, creio ser muito difícil a realização de uma pesquisa a respeito, com a oitiva dos congressistas, mesmo sob a promessa de anonimato. Então, há um importante elemento de incerteza na estimativa do percentual revelado por Jean Wyllys. É um percentual quase certamente encontrado por intermédio do conhecido “chutômetro”. Ele aparentemente elevou uma impressão subjetiva ao status de dado objetivo público sobre o comportamento sexual dos congressistas.

            Além desse problema do percentual cuja veracidade ou exatidão provavelmente não pode demonstrar, creio que o deputado Jean Wyllys cometeu alguns erros, entre os quais o de escorar sua expectativa de aprovação do projeto na esperança de que os congressistas que usam os serviços de prostitutas votem em causa própria, vale dizer, em defesa de seus próprios interesses. Ora, a nação inteira tem reclamado de situações em que parlamentares votam para atender a seus interesses pessoais ou políticos e não aos do povo. Esse é um debate que está aí permanentemente.

            Essa esperança em que o interesse próprio dos congressistas leve o projeto à aprovação fica muito clara quando o deputado Jean Wyllys diz achar que “esses caras vão querer fazer uso desse serviço em ambientes mais seguros” como explicação para esperar que votem a favor da legalização da prostituição – a qual, diga-se de passagem, não é ilegal no Brasil. Se não é ilegal, é legal. Ilegal, proibida, é somente a exploração da prostituição, ou esta, se envolve pessoas com idade inferior a 18 anos. O que o deputado pode estar propondo é o reconhecimento oficial da profissão e sua regulamentação.

            Outro erro – esse quase inevitável nas circunstâncias, dado o número total de congressistas homens e o alto percentual que ele proclamou como o de congressistas do sexo masculino que usam os serviços de prostitutas – é o da generalização. Embora quase inevitável, a generalização provocou reações imediatas, que vão contra o autor do projeto, mas se transferem, por contágio, à sua proposta.

            É o caso da bancada evangélica, que reagiu à declaração do deputado e pretende trabalhar pelo arquivamento do projeto de lei. O deputado e ex-governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho, vice-presidente da Frente Parlamentar Evangélica, disparou: “Se ele sabe quem faz isso, por uma questão de responsabilidade eu o desafio a dizer os nomes dos deputados que vão aos prostíbulos”.

            Bem, por enquanto o que dá para concluir é que, se com suas declarações o deputado Jean Wyllys conseguiu estar em evidência, conquistando amplo espaço na mídia (incluindo este com o qual o leitor se ocupa agora), ele também tornou muito improvável a aprovação de seu projeto. Não sei se ele tinha consciência disso, mas ele sabe.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.