Sexta, 22
de março de 2013
Por Ivan de Carvalho

A
segunda coisa é que as dores do carismático papa Francisco, que tem dado – e
não só após a sua eleição para suceder Bento XVI, mas desde muito antes –
admirável testemunho de humildade, simplicidade e preocupação pelos pobres,
ainda não começaram.
Mas as
dores virão, e fortes, se ele aprofundar-se até as últimas consequências no
caminho que vem percorrendo. Se imitar a atitude de Jesus em relação aos
mercadores do templo. Precisa, primeiro, fortalecer-se para em seguida cumprir
algumas obrigações que o colocarão (ou colocariam) em choque com parte da mais
alta hierarquia da Igreja Católica Apostólica Romana e especialmente com
setores da Cúria extremamente poderosos.
Claro
que, devotando-se a cumprir corajosamente as obrigações que os vários aspectos
da crise na Igreja lhe impõem, ele terá a abençoá-lo um poder muito maior que o
dos que terá de enfrentar. Mas este poder maior muitas vezes, ainda que dando
força à missão e ao missionário, permite que haja a dor. Seja a da carne, seja
a da alma. No caso do papa Francisco, aparentemente seria bem maior a da alma
que a da carne, mas nem sequer é possível descartar esta última.
A
Igreja Católica Romana sofre com os escândalos que integrantes do clero
produziram. Sofre com o avanço galopante do ateísmo em seu tradicional domínio
da Europa mediterrânea e algumas adjacências. Sofre com a perda acelerada de
fiéis para denominações evangélicas (principalmente as pentecostais e
neopentecostais), especialmente na América Latina, notadamente no Brasil, o
maior país católico do mundo.
Continua a sofrer com a crescente separação dos
cônjuges, na palavra de Jesus só aceitável em caso de prostituição. Sofre com o
avanço da permissão para a matança dos inocentes indefesos pelo aborto, um
pecado e crime em lugar de honra na lista dos mais repugnantes que podem ser
cometidos. Sofre em crescendo com perseguições iniciais a católicos romanos e
outros cristãos em vários lugares do mundo, perseguições que vão aumentar numa
escala hoje impensável. Sofre com o avassalador ativismo homossexual, a
estabelecer uma cultura que a Igreja não pode deixar de se opor, pela
condenação expressa, múltipla e incisiva no Antigo e no Novo Testamento – no
Eclesiastes, em Paulo, no Apocalypse. Sofre com a tentativa de amordaçá-la para
que não interfira nesse debate, sob o pretexto de homofobia, ainda que
demonstre a Igreja todo o respeito pelos homossexuais, o respeito devido a todo
ser humano e ao seu livre arbítrio.
Estas são dores externas da Igreja. Mas o papa
Francisco terá de enfrentar também, e parece-me que com muito mais urgência, as
dores internas da Igreja, revelando e combatendo sem reservas o pecado (e
crime) terrível da pedofilia que escala os vários graus da hierarquia, saneando
as finanças do Instituo para Obras Religiosas (IOR, o Banco do Vaticano, que
não é grande, tem uns R$ 16 bilhões ante R$ 1 trilhão do Itaú), onde ocorreram falcatruas
e lavagem de dinheiro, inclusive da máfia, nomeando um Secretário de Estado que
administre ajudando o papa, ao invés de sabotá-lo como se suspeita que
aconteceu com Bento XVI.
A Igreja revelou, a conta-gotas, partes da chamada
Terceira Mensagem de Fátima, mas retém secretas outras partes. Há suspeitas de
que têm sido omitidas porque são muito duras com a própria Igreja e porque
também existiriam itens ainda mais impactantes. Revelará Francisco tudo que
está no texto?
Se revelar, seguramente haverá muitas dores, talvez
inclusive físicas, mas que podem produzir purificação.
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Este artigo foi publicado originariamente na
Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.