Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 18 de março de 2013

Memórias da Imprensa. Em 1925, Irineu Marinho, vítima de um golpe, perdeu o jornal A Noite. Em 1965, seu filho Roberto Marinho deu um golpe e tornou-se controlador da TV Paulista

Segunda, 18 de março de 2013 
Carlos Newton
Vem recebendo seguidos elogios da crítica o livro da historiadora Maria Alice Rezende de Carvalho intitulado “Irineu Marinho, Imprensa e Cidade”.
Plim-plim…
Nessa linha, um interessante comentário do jornalista e professor Carlos Costa, publicado pelo site Conjur, mostra que Irineu Marinho foi perseguido por Hermes da Fonseca (teve de se esconder na Embaixada da Argentina em 1914) e preso em 1922 por Epitácio Pessoa, passando uma temporada de quatro meses na Ilha das Cobras, que abalou profundamente sua saúde desde sempre débil.

Irineu partiu para o auto-exílio na Europa durante a presidência de Artur Bernardes. Seu jornal, voltado para o povão, não deixava de se engajar na discussão de um país que ele torcia para ver mais moderno.

Em 1924, Irineu levou um golpe aplicado pelo sócio Geraldo Rocha, a quem transferira temporariamente o controle acionário do jornal A Noite. Traduzindo em miúdos, o jornal deixara de ser seu: 17 de março de 1925 foi a última vez que seu nome saía na primeira página do jornal. E Irineu Marinho então recomeçou tudo de novo, fundando O Globo.

OUTRO GOLPE

Passados 40 anos do golpe do jornal “A Noite”, Roberto Marinho, filho mais velho de Irineu, tomou providência semelhante e assumiu o controle da TV Paulista S/A, por meio de uma assembléia à qual não compareceu nenhum de seus 670 acionistas majoritários e minoritários. Ou melhor, apenas esteve presente um acionista proprietário de duas ações, Armando Piovesan, que a redigiu a ata ilegal para beneficiar Marinho.

A irregularidade da transferência da TV Paulista nunca foi resolvida, a ponto de há alguns anos o Ministério Público Federal ter produzido parecer no qual assinalou que “tal como se deu, esteado em documentação falsificada, o ato de concessão estaria eivado de nulidade absoluta. Em sendo assim, responderia o órgão federal responsável por sua outorga por negligência – na medida em que se limitou a condicionar a concessão para funcionamento à regularização do quadro societário da empresa”.

Disse mais a Procuradoria da República: “Nessa seara, verifica-se que houve irregularidade na falta de fiscalização do CONTEL, pois este deveria ter tomado providências não permitindo que a emissora ficasse por mais de doze anos sem regularizar, junto ao devido órgão público federal, matéria afeta ao aumento do capital social da concessionária”, ou seja, a transferência do controle para Roberto Marinho, que agiu de má-fé, diferentemente de seu pai, que por inexperiência ou boa-fé foi trapaceado pelo outro acionista do jornal “A Noite”.

PRESCRIÇÃO

No caso do golpe da TV Paulista (hoje, TV Globo de São Paulo), estão totalmente prescritas as irregularidades cometidas por Roberto Marinho para usurpar e emissora – esses crimes, admitidos pelos próprios advogados do jornalista, foram apagados pelo tempo.

Mas, administrativamente, a questão não foi definitivamente encerrada. Em Brasília, que as ilegalidades praticadas por Roberto Marinho entre 1964 e 1977, apossando-se das ações dos acionistas fundadores sem pagamento algum, chegaram ao conhecimento do Gabinete da Presidência da República e já estariam sendo examinadas pelo Ministério das Comunicações, onde há dois processos relativos à concessão de outorga e à transferência do controle majoritário da antiga TV Paulista.

Nesse caso, tem despertado interesse uma enfática decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos da apelação nº 141.845-1/9, em que a TV Globo figurou como ré: “Não pode ter subsistência um negócio jurídico cujo proprietário da coisa objeto do negócio sequer participou da cogitada alienação. A entender-se de outra forma, estar-se-ia proclamando a legalidade do enriquecimento ilícito, o que não é possível sancionar-se, irrefutavelmente”.

E mais: “A Assembleia Geral Extraordinária não dispõe de poderes para determinar a alienação do que não lhe pertence”, como promovido por  Roberto Marinho na AGE de 30 de junho de 1976, ao arrepio da legislação e dos estatutos e em prejuízo dos 670 acionistas regulares e fundadores da Rádio Televisão Paulista S/A. Esta é a realidade dos fatos.
Fonte: Tribuna da Imprensa