Segunda, 18 de março de 2013
Carlos Newton
Vem recebendo seguidos elogios da crítica o livro da historiadora
Maria Alice Rezende de Carvalho intitulado “Irineu Marinho, Imprensa e
Cidade”.
Nessa linha, um interessante comentário do jornalista e professor
Carlos Costa, publicado pelo site Conjur, mostra que Irineu Marinho foi
perseguido por Hermes da Fonseca (teve de se esconder na Embaixada da
Argentina em 1914) e preso em 1922 por Epitácio Pessoa, passando uma
temporada de quatro meses na Ilha das Cobras, que abalou profundamente
sua saúde desde sempre débil.
Irineu partiu para o auto-exílio na Europa durante a presidência de
Artur Bernardes. Seu jornal, voltado para o povão, não deixava de se
engajar na discussão de um país que ele torcia para ver mais moderno.
Em 1924, Irineu levou um golpe aplicado pelo sócio Geraldo Rocha, a
quem transferira temporariamente o controle acionário do jornal A Noite.
Traduzindo em miúdos, o jornal deixara de ser seu: 17 de março de 1925
foi a última vez que seu nome saía na primeira página do jornal. E
Irineu Marinho então recomeçou tudo de novo, fundando O Globo.
OUTRO GOLPE
Passados 40 anos do golpe do jornal “A Noite”, Roberto Marinho, filho
mais velho de Irineu, tomou providência semelhante e assumiu o controle
da TV Paulista S/A, por meio de uma assembléia à qual não compareceu
nenhum de seus 670 acionistas majoritários e minoritários. Ou melhor,
apenas esteve presente um acionista proprietário de duas ações, Armando
Piovesan, que a redigiu a ata ilegal para beneficiar Marinho.
A irregularidade da transferência da TV Paulista nunca foi resolvida,
a ponto de há alguns anos o Ministério Público Federal ter produzido
parecer no qual assinalou que “tal como se deu, esteado em
documentação falsificada, o ato de concessão estaria eivado de nulidade
absoluta. Em sendo assim, responderia o órgão federal responsável por
sua outorga por negligência – na medida em que se limitou a condicionar a
concessão para funcionamento à regularização do quadro societário da
empresa”.
Disse mais a Procuradoria da República: “Nessa seara, verifica-se
que houve irregularidade na falta de fiscalização do CONTEL, pois este
deveria ter tomado providências não permitindo que a emissora ficasse
por mais de doze anos sem regularizar, junto ao devido órgão público
federal, matéria afeta ao aumento do capital social da concessionária”,
ou seja, a transferência do controle para Roberto Marinho, que agiu de
má-fé, diferentemente de seu pai, que por inexperiência ou boa-fé foi
trapaceado pelo outro acionista do jornal “A Noite”.
PRESCRIÇÃO
No caso do golpe da TV Paulista (hoje, TV Globo de São Paulo), estão
totalmente prescritas as irregularidades cometidas por Roberto Marinho
para usurpar e emissora – esses crimes, admitidos pelos próprios
advogados do jornalista, foram apagados pelo tempo.
Mas, administrativamente, a questão não foi definitivamente
encerrada. Em Brasília, que as ilegalidades praticadas por Roberto
Marinho entre 1964 e 1977, apossando-se das ações dos acionistas
fundadores sem pagamento algum, chegaram ao conhecimento do Gabinete da
Presidência da República e já estariam sendo examinadas pelo Ministério
das Comunicações, onde há dois processos relativos à concessão de
outorga e à transferência do controle majoritário da antiga TV Paulista.
Nesse caso, tem despertado interesse uma enfática decisão do Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos da apelação nº
141.845-1/9, em que a TV Globo figurou como ré: “Não pode ter
subsistência um negócio jurídico cujo proprietário da coisa objeto do
negócio sequer participou da cogitada alienação. A entender-se de outra
forma, estar-se-ia proclamando a legalidade do enriquecimento ilícito, o
que não é possível sancionar-se, irrefutavelmente”.
E mais: “A Assembleia Geral Extraordinária não dispõe de poderes para determinar a alienação do que não lhe pertence”,
como promovido por Roberto Marinho na AGE de 30 de junho de 1976, ao
arrepio da legislação e dos estatutos e em prejuízo dos 670 acionistas
regulares e fundadores da Rádio Televisão Paulista S/A. Esta é a
realidade dos fatos.
Fonte: Tribuna da Imprensa