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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Dilma lamenta não atender pedido de cassação da TV Globo de SP e alega que só o Judiciário pode fazê-lo, mas isso não é verdade. A competência é mesmo da União.

Segunda, 20 de maio de 2013
Carlos Newton
Tribuna da Imprensa
Há algumas semanas, publicamos com absoluta exclusividade carta enviada pelo advogado e ex-deputado paulista Afanasio Jazadji, à presidente Dilma Rousseff, denunciando graves ilicitudes cometidas quando da transferência do controle acionário da TV Paulista (hoje, TV Globo de São Paulo), entre 1964 e 1977, para o jornalista Roberto Marinho, em detrimento dos indiscutíveis direitos de centenas de acionistas fundadores da emissora, que nada receberam. Tudo se passou sob as vistas e a concordância dos então governantes militares, que garantiram a efetivação da nebulosa transação, por meio de portarias impróprias, que nem foram cumpridas (163/65 e 430/77).


O ex-parlamentar, que desde 2002 tenta defender os direitos de propriedade dessas centenas de famílias, fez uma incisiva exposição de motivos, acompanhada de documentos e depois requereu que a Presidência da República cassasse a concessão irregularmente  transferida a Marinho, que negociou a compra da emissora com Victor Costa Junior, que nem era acionista e teve de montar a instalação de uma Assembléia Geral Extraordinária à qual só compareceram ele, como “vendedor”, Roberto Marinho como comprador e um funcionário da emissora, que, de acordo com a ata, representou, sem procuração, acionistas majoritários mortos há vários anos e outras centenas que nem souberam da realização desse importante ato societário. Ou seja, simulou representar os acionistas.

A RESPOSTA DE DILMA

Em papel timbrado do Gabinete Pessoal da Presidência da República, com data de 10 de maio de 2013, diz a resposta do Planalto:  “Prezado senhor,  em resposta a sua carta de 21/03/2013 dirigida à Presidenta Dilma Rousseff, informamos que ela lamenta não poder atender seu pedido por ser o assunto apresentado de competência do poder judiciário. Conforme determina a Constituição, o chefe do Executivo não pode intervir nas questões de outro poder. Contamos com a sua compreensão. Cordialmente, Cláudio Soares Rocha – Diretor”.

Em sua petição, Afanasio esclareceu que tal “compra” do canal 5 só foi exercida pelo jornalista Roberto Marinho e ao preço de Cr$ 1,00 por ação, ou seja, sem contrapartida alguma, verdadeira desapropriação à vista do elevado valor real de cada ação já à época, face ao constante reinvestimento dos lucros e dividendos não distribuídos entre 1965 e 1977 pelo competente empresário.

Ele aproveitou para chamar a atenção para um acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo sobre essa tomada de ações, na AGE de 30 de junho de 1976, presidida pelo próprio jornalista Roberto Marinho: “Não pode ter subsistência um negócio jurídico cujo proprietário da coisa objeto do negócio sequer participou da cogitada alienação. A entender-se de outra forma estar-se-ia proclamando a legalidade do enriquecimento ilícito, o que não é possível sancionar-se, irrefutavelmente”. “Essa AGE não dispõe de poderes para determinar a alienação do que não lhe pertence”.

COMPETÊNCIA

Sem querer polemizar e entendendo que é, sim, competência do governo federal investigar esses atos societários  implementados com documentação anacrônica, falsa, Afanasio lembra que essa transação foi concretizada sem a prévia aprovação da Presidência da República, e é da competência privativa da União a autorização de transferência do controle majoritário para a exploração de concessão de emissora de TV. No caso, infringiram os artigos 90 e 98 do Decreto-lei 52.795/63, o que é matéria da responsabilidade da Administração Federal e não do Poder Judiciário.

Por fim, disse o deputado que todas essas irregularidades e documentos falsos não estão relatados nos processos administrativos arquivados no Ministério das Comunicações, tratando da outorga da concessão  da Rádio Televisão Paulista S/A para os verdadeiros acionistas fundadores e da posterior controvertida transferência para o jornalista Roberto Marinho, entre 1964 e 1977, numa interminável sucessão de manobras ilegais e viciadas, como reconhecido até pelo Ministério Público Federal.

Com todo o respeito, se a Chefia da Casa Civil pode abrir processo administrativo para investigar supostos atos irregulares cometidos pela ex-chefe do Escritório da Presidência em São Paulo, Rosemary Noronha, por que este mesmo governo não tem competência para investigar as intermináveis irregularidades e ilicitudes cometidas para assegurar, a qualquer custo, a entrega do canal 5 de São Paulo ao jornalista-empresário Roberto Marinho?

O que o Poder Judiciário tem a ver com isso? Nada. O gabinete presidencial errou, pois quem tem competência para tratar desse assunto administrativo é, sim, o governo. A explicação do Planalto foi respeitosa, mas não é consentânea com a realidade.

PS – Para ler na íntegra o requerimento enviado à presidente Dilma, basta acessar o arquivo da Tribuna, no dia 25 de março deste ano.