Domingo, 4 de agosto de 2013
Karine Melo, repórter da Agência Brasil
Sob a descrença de movimentos sociais, os deputados que
fazem parte do grupo de trabalho da reforma política da Câmara terão o
desafio de chegar na próxima semana a um texto que concilie os
interesses dentro e fora do Congresso. O Movimento de Combate à
Corrupção Eleitoral (MCCE) questiona o sucesso da discussão do tema no
Congresso. “Há um pessimismo sobre o que este Congresso pode produzir
sobre reforma política”, disse o advogado especialista em direito
eleitoral do MCCE, Luciano Santos. Para ele, até agora, todas as vezes
que deputados e senadores se movimentaram “foi para retroceder,
facilitar a vida de quem hoje já detém mandato”.
O advogado lembrou que a mais recente comissão fracassada sobre o
tema, que teve como relator do deputado gaúcho Henrique Fontana (PT),
trabalhou por mais de dois anos. A proposta foi engavetada antes de ser
votada em plenário. “Foi gasto muito dinheiro nisso, a comissão realizou
audiências públicas em todo o país”, disse.
Hoje o projeto (PL 5735/13) que serve de base para a discussão do
novo grupo que trata do assunto tem vários pontos polêmicos como o que
autoriza candidatura de quem teve as contas rejeitadas pela Justiça
Eleitoral. Ainda pela proposta, as despesas pessoais do candidato, como
deslocamento em automóvel próprio, remuneração de motorista particular,
alimentação, hospedagem e chamadas telefônicas de até três linhas
registradas no nome do candidato não precisarão ser comprovadas na
prestação de contas.
Na avaliação de movimentos que militam nessa causa, a única
alternativa viável para uma verdadeira reforma política é a aprovação de
um projeto de iniciativa popular. Duas propostas estão em fase de
recolhimento de assinaturas. A do MCCE batizada
de eleições limpas, sugere em um dos pontos a adoção do sistema
eleitoral em dois turnos para o legislativo. “No primeiro turno o
eleitor votaria só na plataforma do partido e no segundo turno
escolheria que candidato deveria executar o plano”, explicou Luciano
Santos.
A outra proposta, elaborada pela Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema
Político, propõe um texto mais amplo que do MCCE: defende que
determinados temas como, por exemplo, aumento dos salários dos
parlamentares, grandes obras e privatizações, só possam ser decididos
pelo povo por meio de plebiscito e referendo. Para que um projeto de
iniciativa popular seja apresentado ao Congresso é necessário que ele
venha avalizado por 1,5 milhão de assinaturas.
Para que as novas regras tenham validade nas eleições de 2014, o texto
teria de ser votado pelo Congresso e sancionado pela presidenta Dilma
Rousseff até o dia 3 de outubro. A dois meses do fim desse prazo
representantes dos movimentos reconhecem que as chances são pequenas.
Na avaliação da Plataforma dos Movimentos Sociais apesar de chamar de
reforma política, o Congresso até hoje só propôs mudanças restritas à
questão eleitoral. “O Congresso nunca aceitou, por exemplo, o
fortalecimento de mecanismos democráticos de participação popular. Uma
proposta de reforma política tem que pensar numa melhor representação
dos grupos: mulheres, negros, indígenas e homoafetivos”, ressaltou José
Antônio Moroni, membro da Plataforma.
Na tentativa de mostrar transparência e disposição de ouvir a
sociedade foi lançada há pouco mais de uma semana, dentro do portal da
Câmara dos Deputados, uma comunidade virtual
para discutir o tema. A ferramenta já teve mais de 16 mil acessos. O
financiamento de campanha e sistema eleitoral são os assuntos que mais
despertaram interesse até agora.
Sobre financiamento de campanha, Geraldo César Rodrigues,
participante de um dos fóruns, defendeu que ele passe a ser
exclusivamente público. “Doações podem sugerir sutilmente tráfico de
influência e troca de favores - ou intenções de favorecimento - no meio
político”. Para ele, campanhas eleitorais financiadas exclusivamente com
recursos públicos inibem essas práticas.
“Penso que não se deva proibir a doação de pessoas físicas. Foi com
base nessas doações que Obama se elegeu. O que é preciso é estabelecer
limites. Além disso, a doação de pessoas físicas pressupõe a
participação efetiva do cidadão que puder contribuir. O financiamento
exclusivo não impede a existência de caixa-dois pelos candidatos
poderosos”, avaliou outro participante, Claudionor Rocha.
Para a coordenadora da Frente Parlamentar pela Reforma Política com
Participação Popular, deputada Luiza Erundina (PSB-SP), o canal virtual
que foi aberto para receber sugestões da sociedade não supre a
necessidade de novos debates com a sociedade. Ela acredita que a
proposta em discussão é um grande retrocesso para o país já que estimula
o abuso do poder econômico e flexibiliza a Lei da Ficha Limpa.
Ainda segundo a deputada, os protestos de junho, realizados em várias
cidades brasileiras, não explicitaram com força a necessidade de
realização de uma reforma política no país. Erundina lembrou ainda que
na legislatura passada, a Frente apresentou uma proposta que nem sequer
chegou a ser votada na Comissão de Legislação Participativa da Câmara.
“Na verdade não há vontade política. O Congresso não vai dar uma
resposta a todo esse marco legal que está obsoleto. Lamentavelmente será
mais uma frustração que só contribui para desqualificar o poder
legislativo”, disse.