Sábado, 26 de abril de 2014
Jornal do Brasil
Davison Coutinho*
"Aos poderosos eu lanço um desafio
Viver um dia de pobre e o pobre um dia de rei
Mas eu só peço a esse moço, por favor,
Antes de bater na cara,
respeite o trabalhador"
Davison Coutinho
É
claro que não podemos deixar impune o que aconteceu com Douglas Rafael
da Silva, mais conhecido como "D.G", dançarino de um programa de uma
grande emissora de televisão do Brasil. Triste e revoltante é perceber
que quando se trata de pessoas com reconhecimento ou com alguma ligação
com a elite brasileira, a cobrança e a busca pela solução do caso é de
maior importância do que quando as vítimas são os invisíveis de nossa
sociedade.
Ainda não ouvi falar do cidadão que foi morto no
protesto pela morte do jovem Douglas. Pelo que parece teve uma morte
heroica, perdeu sua vida lutando em protesto pela morte de um
companheiro e pela melhoria de sua comunidade. Não merecia esse rapaz
igual tratamento que todos estão dando ao caso de D.G? Não sei se ele
tinha família, quantos filhos terá deixado? E sua mãe, será que tinha? ,
será que choram a morte do rapaz, será que merecia morrer de tal forma,
ou será só mais um invisível?
Acontece é que quando se trata de
mais um favelado, negro, pobre o caso não tem visibilidade, vira número.
Aliás, a frase é sempre "era só mais um traficante". No entanto,
estamos falando de vidas, sangue igual a de qualquer ser humano. Na
Rocinha, houve negligência e demora em resolver o caso Amarildo, que só
foi resolvido por muita pressão da população nas manifestações. A morte
de Edilson Rodrigues da Silva, morto da porta de casa na Rua 3 quando
saia para fumar, não rendeu mais que um dia nas páginas de jornais. A
mãe de família Claudia Silva também não teve quem lutasse por sua
morte.
O programa em que DG trabalhava é mais um da linha dos
comerciais do governo que vendem a favela como pitoresca e exótica, onde
todo mundo dança funk e curte samba, usa roupa curta, toma banho na
laje e solta pipa. Estereótipos da favela, onde todos são felizes, assim
como mostrou a última novela da mesma emissora que falou sobre o
Alemão. Ninguém quer mostrar a dura realidade desses lugares
completamente abandonados pelo poder público.
O governador quer
receber a família, o secretário de segurança já prometeu que a
investigação será rigorosa. E aos demais mortos? Enterramos seus corpos e
suas lembranças sem ao menos o consolo de que a justiça foi feita?
#paz
"Pois a metralhadora que ainda interrompe
Ameaça jovem, velho, criança, mulher e homem
O problema que era deles, passa a ser problema meu
Ter que aturar uns caras que nem sabem quem sou eu" (Cidinho e doca - Meus Direitos)
*Davison
Coutinho, 24 anos, morador da Rocinha desde o nascimento. Bacharel em
desenho industrial pela PUC-Rio, Mestrando em Design pela PUC-Rio,
membro da comissão de moradores da Rocinha, Vidigal e Chácara do Céu,
professor, escritor, designer e liderança comunitária na Comunidade,
funcionário da PUC-Rio.