Da Tribuna da Internet
Pedro do Coutto
Ao conversar com jornalistas em Nova York, pouco antes de
seguir para Washington, a presidente Dilma Rousseff tentou confundir o delator
com o conteúdo da delação, produzido pelo empresário Ricardo Pessoa e publicado
no sábado com grande destaque pela Revista veja que se encontra nas bancas,
reproduzidas pelos três principais jornais do país.
Uma coisa nada tem a ver com a outra. Tentando desfocar o
episódio fortemente chocante para o governo, a presidente da República –
excelente reportagem de Isabel de Luca, O Globo edição de ontem – confundiu-se
a si mesma. Basta ler o texto com atenção. “A Justiça, afirmou, tem que pegar
tudo que ele (Pessoa) disse e investigar tudo, sem exceção. A Justiça, o
Ministério Público, a Polícia Federal.”
Ora, a contradição presidencial é evidente. Se a Justiça,
o Ministério Público têm que investigar tudo, sem exceção, é porque,
tacitamente, a chefe do Executivo considera importante a denúncia de Ricardo
Pessoa. A explosão contra a figura do delator, assim, não destrói o peso da
delação. Dilma Rousseff recorreu a episódios históricos que incluem a delação.
Citou Tiradentes, inclusive, numa comparação extremamente forçada. A
Inconfidência Mineira não foi traída por corruptos e corruptores. Além do mais,
agora, dois séculos depois, Ricardo Pessoa inspirou-se na lei que implantou a
figura jurídica da delação premiada.
EXIGIR EXPLICAÇÕES
Dilma Rousseff, diante das evidências, deveria, antes de
mais nada, isso sim, exigir explicações do ministro Edinho Silva. Pois dizer
que as doações foram legais não é suficiente. É indispensável saber a forma com
que foram conseguidas. Edinho Silva, na verdade, deve explicação ao país, se
puder fazê-la. Até agora não desmentiu a versão do dono da UTC.
E a versão trata diretamente de uma ação de chantagem,
torpe como todas as chantagens são. Aliás, é preciso, acima de tudo, confrontar
as doações registradas na Justiça Eleitoral com as quantias efetivamente
recebidas pelos chantagistas e pelos intermediários. É claro que não vão
conferir. E a parte de quem transporta o dinheiro? Fica com quem? Isso de um
lado clássico, em matéria de dinheiro sujo. De outro, as doações em dinheiro
colidem com a Lei Eleitoral de 97. As doações só podem ser feitas através de cheques
nominais cruzados ou por intermédio de depósitos identificados em contas
bancárias. Tais princípios foram observados?
Não creio haver necessidade de se cobrar uma resposta.
Está claro que não. Caso contrário, não haveria necessidade de troca de senhas
de acesso, tampouco João Vaccari picotar papeis em que os valores de “doações”
estavam numericamente descritos.
PREJUÍZOS NO BALANÇO
E tanto esse processo de corrupção estava – e está –
configurado que, ao publicar o balanço da Petrobrás relativo a 2014, o atual
presidente da empresa, Aldemir Bendine, incluiu os prejuízos causados pelos
assaltos praticados na escala de 6 bilhões de reais. Sua antecessora no cargo,
Graça Foster, projetava-os em mais de 80 bilhões de reais. Assim, a presença da
corrupção torna-se indiscutível, iluminada pelo próprio balanço da estatal.
Negar a corrupção, portanto, é impossível.
E não pode haver corrupção sem corruptos. Eles estão sendo
expulsos das sombras todos os dias. Uma sequência de personagens movimenta as
cenas como num filme. Não de ficção, mas um documentário. Nele não faltam
corruptos, corruptores, ladrões e delatores. O delator só existe porque existe
algo a delatar. Não fora isso, não apareceria.