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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Tudo que você precisa saber sobre o caso Battisti para não ter a cabeça feita pelos fascista de lá e daqui

Sexta, 20 de outubro de 2017
Do Blog Náufrago do Utopia
Por Carlos Lungarzo



EM DEFESA DE CESARE BATTISTI

Por Carlos Lungarzo
Durante a década de 1970, com cerca de 20 anos de idade, Cesare Battisti entrou nos grupos de esquerda que lutavam contra o fascismo em toda a Itália.

Depois do final da 2ª Guerra Mundial, os fascistas perderam o direito de usar seus símbolos, bandeira, escudos e a denominação Partido Fascista, mas eles continuaram tendo poder e fundaram novos partidos políticos nos quais não aparecia o nome fascista.

Seu escudo e outros símbolos foram levemente alterados, para evitar críticas. Porém, sua ideologia e suas tradições continuavam sendo tão fascistas como antes. Aliás, sua ação foi igual ou pior que a de antes da guerra.
Os novos fascistas (chamados neofascistas) queriam evitar o avanço da esquerda, que se tornou muito forte depois da guerra. Tinham o apoio dos grandes magnatas, dos altos escalões da polícia, dos chefes militares e da Igreja. Dispondo, ademais, de muito dinheiro, foram os que produziram os atuais partidos da direita italiana.

Durante algum tempo, os fascistas tiveram poucos representantes entre os juízes, mas, a partir de 1974, os velhos juízes conservadores e fascistas ficaram donos do espaço jurídico.

Berlusconi: expoente da reaglutinação fascista.
A política fascista consistia em atacar grupos de esquerda, trabalhadores, intelectuais, estudantes, favelados, etc., mas também realizaram numerosos atos terroristas. Esses atos foram chamados de estragos. Num prazo de 12 anos, os estragos fascistas deixaram centenas de mortos e milhares de feridos.

A polícia assassinou estudantes e trabalhadores numa proporção maior que a ditadura brasileira. Num país com a quinta parte de habitantes do Brasil, as vítimas feitas pela direita foram mais de 1.400 mortos. [No Brasil, essas vítimas são estimadas em mais ou menos um milhar. Ou seja a proporção de mortos na Itália foi cerca de quatro vezes maior.]
Os grupos de jovens que lutavam contra o fascismo eram muitos. Houve na Itália dos anos 70 mais de 100 grupos de esquerda (refiro-me aos grupos que lutavam pelos direitos dos trabalhadores, não àqueles que queriam tomar o poder político, como as Brigadas Vermelhas).

Battisti entrou num grupo chamado Proletários Armados para o Comunismo, que atuava na região norte da Itália. Apesar de estarem armados, os PAC somente atuavam em defesa própria.

Os PAC pertenciam a uma tendência ampla, chamada Autonomia, que lutava contra a opressão do Estado. Tal tendência reuniu muitos jovens independentes, além de antigos militantes do Partido Comunista Italiano, que abandonam esta agremiação quando ela guinou à direita, após 1974, na esperança de compartilhar o poder com a Democracia Cristã.
1980: atentado direitista em Bolonha mata 85 e fere 200.
Os PAC tinham um compromisso de não usar violência letal, mas apenas a necessária para neutralizar torturadores, terroristas de Estado e semelhantes. No entanto, em 1978, um grupo de cerca de 20 militantes dos PAC decidiu mudar de filosofia, executando um torturador da polícia (Santoro), e dois membros de grupos terroristas fascistas (Sabbadin e Torregiani). Também mataram um motorista da polícia, sobre cuja participação em tortura não havia nenhuma prova. Essas são as quatro vítimas das que falam os italianos.

Battisti e vários outros membros do PAC se manifestaram contra esta política, e foram se afastando do grupo. No entanto, Cesare era muito conhecido pelos juízes, promotores e policiais, por tratar-se de um dos mais ativos na denúncia de torturas, do papel da máfia, e dos crimes cometidos pela polícia contra cidadãos pobres (pancadas, estupros, fuzilamentos sumários, etc.)
As quatro mortes atribuídas a Battisti tiveram como autores outros membros dos PAC, que foram condenados e cumpriram suas penas há alguns anos. Cesare foi alvo de delatores premiados, que o acusaram de participação e até de ter planejado os quatro crimes. O principal deles, Pietro Mutti (que os juízes chamavam carinhosamente de Pierino) parece ter tido toda sua pena perdoada.
Battisti (esq.): condenado em 1979 e julgado de novo em 1988.  
Cesare foi condenado a duas penas de prisão perpétua em julgamentos marcados por todo tipo de ilegalidades:
1. Ele não estava presente no julgamento. Encontrava-se exilado, e havia casado com uma moça francesa, da qual tem hoje duas filhas adultas;
2. Ele não teve advogados verdadeiros. Os advogados foram impostos pelos juízes;
3. Não houve provas nem testemunhas reais que declarassem contra ele. Os autos mencionam depoentes quaisquer, apenas pelo sobrenome. É como se, no Brasil, falassem que elas são Silva, Barbosa, Almeida, etc.;
4. As únicas denúncias contra ele provieram de delatores premiados, que obtiveram grandes reduções de suas penas;5. Duas procurações usadas no julgamento como se fossem de Battisti não passavam de falsificações.

Durante seu exílio na França, Cesare trabalhou como zelador de prédios e restaurantes, bem como em diversos empregos, todos legais. No final dos anos 80 começou a ter sucesso como romancista, tendo hoje publicados cerca de 20 títulos, deles, três no Brasil, além de um novo em via de publicação, sobre a região de Cananeia, no litoral Sul paulista.
Battisti diz que pretende passar o resto da vida no Brasil
DESDE 2005 NO BRASIL

Cesare chegou ao Brasil em 2005, e foi capturado pela polícia em 2007, por ordem da Itália. Esteve quatro anos na prisão da Papuda, em Brasília, sendo alvo dos ataques da mídia, dos partidos de direita e de pessoas pagas pela Itália. Seu julgamento foi influenciado pela embaixada italiana e ao menos quatro dos juízes mantinham relações amistosas com os diplomatas. Em compensação, Cesare fez grandes amigos na esquerda, nos setores populares, entre cidadãos progressistas e intelectuais. A petição por sua liberdade em 2009 conseguiu milhares de assinaturas. Cesare teve muito apoio de sindicatos, partidos de esquerda e de centro-esquerda, ONGs de direitos humanos, de advogados e jornalistas, bem como de todos os movimentos sociais. O PT aprovou uma moção oficial apoiando sua libertação em 2009.
Já no final de seu mandato (31/12/2010), o presidente Lula assinou um decreto recusando  a extradição exigida pela Itália.
Esse decreto foi aprovado pelo STF, por 6 votos a favor e apenas 3 contrários.

Os melhores brasileiros estão ao lado de Battisti...
Solto em 2011, Cesare adquiriu o direito de ser residente permanente no Brasil, recebendo documentos normais de validade ilimitada. Até o dia de hoje, Cesare tem vivido dos direitos autorais de seus livros, especialmente dos que provém da França, eleva uma vida totalmente normal. Ele não registra qualquer irregularidade em território brasileiro, salvo uma multa por estacionamento incorreto (mas não por excesso de velocidade).

Tem um filho, Raul Battisti, com quatro anos de idade. Ele nem sempre pode vê-lo, pois no interior da São Paulo, onde a criança vive com sua mãe, Cesare sempre é provocado pela mídia local, por elementos da classe alta, por militantes de partidos de direita (como os tucanos) e, em alguns casos, pela polícia daquele município. 
Cesare precisa tratamento médico regular por causa de sua hepatite, mas tem sofrido discriminação no hospital público de São José do Rio Preto.

...mas os piores italianos, instigados pelos neofascistas, insistem na vendeta. 
Por que Battisti não deve ser extraditado?


A perseguição a Battisti é o que se chama uma vendeta. E ninguém deve ser preso, perseguido nem morto por causa de uma vingança. Isso é uma forma primitiva e bárbara de lidar com os problemas.
Cesare tem um filho brasileiro, menor de idade, de mãe brasileira. De acordo com o Estatuto do Estrangeiro, nenhuma pessoa que tenha um filho no Brasil pode ser expulsa, deportada ou extraditada. Nem mesmo a ditadura militar violou este princípio. Lembremos o caso de assaltante do trem-correio de Londres, Ronald Biggs, que aqui permaneceu a salvo quanto tempo quis e só saiu quando quis.
O decreto assinado por Lula no último dia do seu mandato está em plena vigência. Alguns decretos podem ser modificados, mas só durante os cinco anos seguintes; o decreto do Lula, contudo, está prestes a completar sete anos. 

Estes cinco decidirão se a Justiça brasileira é independente ou se verga a razões de Estado
Além disto, de tal decreto decorreram direitos adquiridos. Portanto, ele não pode ser revogado, anulado nem modificado. Não poderia ser anulado nem mesmo pelo próprio Lula!
O que o governo brasileiro pretende fazer, de forma tortuosa e recorrendo a tratativas sigilosas, é ilegal:
Cesare não é refugiado. Esta é uma mentira usada pela mídia, pelo governo e por alguns juízes. O refúgio de Cesare foi anulado pelo Supremo Tribunal Federal. Desde junho de 2011, Cesare é um residente permanente, ou seja, imigrante. Ele é um estrangeiro com os mesmos direitos que tiveram os pais de Temer, de Dilma e de vários milhões de pais e avós de brasileiros.

Vamos reeditar uma ignomínia ou dela nos redimir?
A viagem a Bolívia não quebrou nenhuma relação de confiança, pois o Cesare tinha total direito de sair e entrar do país quantas vezes quisesse. É algo que todos nós, estrangeiros de nascença, sempre fizemos e fazemos. Aliás, os valores em dinheiro que os três amigos portavam, na casa de R$ 25 mil, eram inferiores ao teto permitido (R$ 10 mil cada).
Caso fosse aprovada, a extradição de Battisti arranharia profundamente nossa soberania. Pensem nisto: seria violar a vontade do ex-presidente e do plenário do STF, que referendou o decreto de Lula. E para quê? Apenas para obedecer ao embaixador italiano e às forças políticas que ele representa.
Devemos difundir estes pontos entre todas as pessoas conhecidas, grupos políticos, comunicadores, representantes populares, movimentos sociais, etc., tornando-os o mais conhecidos possível nas redes sociais e outros meios ao nosso alcance.