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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Finanças no Século 21 — série de quatro artigos publicados pelo VIOMUNDO. Autor: Pedro Augusto Pinho

Quarta, 17 de agosto de 2022

Ilustração: Carlos Lopes  


Finanças no Século 21 — série de quatro artigos publicados pelo VIOMUNDO

Pedro Augusto Pinho 17 de agosto de 2022

FINANÇAS NO SÉCULO 21


08/08/2022  

Pedro Augusto Pinho: A perda do poder financeiro no século 20 


Da Redação de Viomundo

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A partir desta segunda-feira, 08/08, o administrador Pedro Augusto Pinho, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet), publica aqui no Viomundo uma série de quatro artigos exclusivos sobre o sistema financeiro no século 21. 

“Não é apenas a história de fatos e pessoas, é a história do poder”, frisa. 

— E quem é poder? 

“É aquele que está por trás dos governos, dos Estados, da construção de seu pensamento, pelo que denominamos “pedagogia colônia”, expõe. 

Em resumo: é aquele que efetivamente manda. 

— Mas isso é teoria da conspiração! — rebaterá um incrédulo. 

Pedro Augusto Pinho responde com a fina ironia de um grande amigo, o jornalista Beto Almeida: “eu só conheço a prática, não a teoria da conspiração”. 

— Por quê? 

Porque a história do poder, diz ele, é a história de disputa que prefere não se identificar. 

Os poderes usam máscaras, fantasias, assumem diferentes ideais para que não sejam identificados. Só o tempo os deixa mais vulneráveis. 

Um exemplo disso é o poder do cristianismo na Idade Média. 

O Papa era seu mais alto dignitário. O Papa é que coroava os reis e, assim, lhes dava autoridade para dirigir a sociedade. A Igreja combatia os que disputavam com ela esta força, chamando-os de hereges, infiéis, renegados, até, a suprema injúria, ateus. 

Pedro Augusto Pinho antecipa: 

1. Caro leitor, o artigo que se segue apresenta a história como uma aventura, a luta dos poderes, aqueles que estavam em combate do fim do século 19 até o fim do século 20, e o que nos sucedeu depois, neste início do século 21 

2. Esta aventura lhes demonstrará o sentido das guerras, os verdadeiros vencedores e a astúcia dos derrotados, as máscaras e fantasias do poder. Fatos desconexos passarão a ter sentido. 

3. Nosso principal personagem é o sistema financeiro, que irá também se transformando ao longo do tempo. 

O que chamávamos de a banca na Inglaterra do século 20, hoje é um sistema apátrida e seus agentes são os “gestores de ativos”, que captam suas suadas poupanças para lhes impor o desemprego, a miséria, a doença e a morte. 

Segue o artigo número 1. A cada dois dias, será publicado um novo. 

A PERDA DO PODER FINANCEIRO NO SÉCULO 20 

Por Pedro Augusto Pinho*, especial para o Viomundo 

O mundo que existia na passagem do século 19 para o século 20 era multipolar, ainda que o financismo do Império Colonial Britânico tivesse predominância, mas, na Europa, encontrávamos os Impérios da França, da Holanda, da Dinamarca, da Alemanha, da Itália, de Portugal, da Espanha, parte do Império Otomano e, fora da Europa, o Império Japonês e a expansão fora das fronteiras dos Estados Unidos da América (EUA). 

Países independentes, ou seja, fora desses impérios subordinavam-se ao poder de algum deles. 

O Brasil se curvava aos banqueiros ingleses, donos da dívida contraída desde a Independência, em 1822. Estimava-se que, em 1900, a população mundial tinha 1.633 milhões habitantes. 

Nos primeiros 20 anos do século 20 houve enorme transformação provocada pela disputa colonial europeia, conhecida como I Grande Guerra, e o surgimento do socialismo dentro da Europa, com a Revolução na Rússia, em 1918, e a criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). 

O poder detido pelas finanças, que desde o século 17 dominava a Inglaterra, e se espalhava por boa parte do mundo, perde força para o poder industrial, que impulsionava um novo imperialismo, começando a formar o mundo bipolar, que se acentuará com o fim da II Grande Guerra, em 1945, e dominará quase todo restante do século 20 

Data marcante para o processo que hoje prejudica toda população ocidental ocorreu em 1919, com a derrota financista da I Grande Guerra e o triunfo socialista marxista no Império Russo; a reunião no Hotel Majestique, em Paris, de banqueiros, empresários, economistas, entre eles Maynard Keynes, e jornalistas especializados, no que ficou conhecida como Round Table Group, uma referência à Távola Redonda do Rei Arthur. 

Desta reunião, saíram duas organizações básicas para convencer os intelectuais, os governantes e políticos de todo mundo da indispensabilidade da globalização financeira e da necessária redução das ações dos Estados Nacionais: o Council on Foreign Relations, nos USA, e o Royal Institute of International Affair, no Reino Unido. 

Coronel Nandel House, amigo íntimo de Woodrow Wilson, que coordenou o encontro do Round Table Group, se expressou como transcrito: “Há um poder oculto tão organizado, tão sutil, tão atento, tão fechado em torno de si próprio, tão completo, tão corruptor que não se pode elevar a voz quando se desejar criticá-lo”. 

E esse poder, que se defende com a ironia das teorias da conspiração, estabelece os paradigmas para o que seja Liberdade e Democracia, duas cínicas mentiras do capitalismo global. 

Globalização que John Galbraith não considerava um conceito sério. “É um artifício que nós, norte-americanos, montamos para controlar o mercado dos outros países”. 

Este artigo inicia uma sequência de análises que objetivam demonstrar o quanto o Brasil e os brasileiros estão longe de agir em seu proveito, isto é, na defesa da autonomia decisória da Nação, que chamamos Soberania, e na defesa do povo brasileiro, que denominamos construção da Cidadania, pois é um processo permanente. 

Acabemos com a mentalidade colonial, já identificada num dos primeiros historiadores brasileiros, Capistrano de Abreu, e que está sempre sendo reforçada pela pedagogia colonial, facilmente encontrada nas mídias hegemônicas no Brasil. 

Galbraith chamava a atenção para as pessoas que se enrolam em ideologias, em vagos conceitos como direita e esquerda, e deixam com isso de ter o claro conhecimento da realidade que, ao fim, se imporá sempre. 

A pedagogia colonial sempre aposta na desinformação, como ocultar o caráter nacional das forças produtivas, da geração de energia, que entra em contradição com sistemas transnacionais, como o das finanças. 

Não é por acaso que o poder financeiro que se instalou nos anos 1990 prega o estado mínimo. Estado apenas para a repressão aos miseráveis que, com seu poder, se multiplicam. 

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado. 

 

Diário da Resistência

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Ilustração: Carlos Lopes/Viomundo  

Você escreve 11/08/2022  

Pedro Augusto Pinho: As alianças e máscaras na luta pelo poder 


Por Redação  

O segundo artigo da série Finanças no século 21 

Por Pedro Augusto Pinho* 

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Tratamos das finanças no particular entendimento de um poder. Ou seja, de um segmento da sociedade que busca impor aos demais sua vontade. 

Neste caso, sua existência é muito antiga. Já encontramos em Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), nos “Econômicos”, tomo  II, quando trata, nas formas da economia, dos rendimentos: “a principal fonte de rendimento é a terra; em seguida está o lucro das atividades periódicas; por último os juros de empréstimos em dinheiro” (adaptação para publicação no Brasil, da tradução das Obras Completas de Aristóteles por Delfim F. Leão, para Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 2004; WMF Martins Fontes, SP, 2011). 

E quanto a esta última, ele considera a mais censurável, pois procura criar dinheiro a partir do próprio dinheiro, forma contrária à natureza. 

O filósofo grego apontava as formas de rendimento numa sociedade escravista, onde as mulheres e os escravos não tinham renda do trabalho. Seriam estas o aluguel da propriedade, o lucro do comércio, a venda de quem tem para aquele que necessita, e a mais censurável, a forma negativa da crematística: os juros. 

Antes do capitalismo se impor como economia no ocidente, ainda no modo medieval de gerar riqueza, as rendas fundiárias já tinham esta característica das finanças: eram estéreis, nada produziam que não fosse o acúmulo de rendas. 

Também incentivavam guerras para conquistar mais terras. Ter-se-ia então, de um lado, as rendas da produção e do comércio: o lucro e o salário do trabalho. De outro, aquelas pela simples propriedade de bens – terra e moedas, o rentismo, com receita de aluguéis e juros. 

No artigo anterior, vimos que o rentismo havia perdido seu poder como consequência da I Grande Guerra e da Revolução na Rússia em 1918. 

E, já na década de 1920, começa articular sua volta. 

No fundamental livro “1984”, de George Orwell, há uma receita de poder: quem quiser controlar o futuro precisa controlar o passado, porém para controlar o passado é necessário controlar o presente. 

As finanças derrotadas buscam alianças e o domínio da pedagogia colonial, para construir o passado e apresentar sua projeção de futuro. 

Desde o final do século 19, como decorrências da industrialização na Inglaterra, surgiram movimentos que pediam a despoluição de águas e do ar, a proteção contra doenças respiratórias, o saneamento urbano, limitados geograficamente e ao conhecimento tecnológico da época. 

Foi este tema que serviu às finanças, antes mesmo da II Grande Guerra, para iniciar seu combate ao industrialismo. 

O domínio das mentes já estava ocorrendo desde o século 19, sendo marco ambientalista a criação do Parque Yellowstone, em 1872, nos Estados Unidos da América (EUA). 

No domínio da Commonwealth, surgiram no Canadá (1885), na Nova Zelândia (1894) e na Austrália e na África do Sul, em 1898, que também criaram parques nacionais, entendidos como de proteção à natureza selvagem. 

A terceira década do século 20 foi particularmente conturbada. As fronteiras europeias, longe de se fixarem pelos armistícios e tratados de paz, ficaram ainda mais contestadas. Dos “grandes impérios” surgiam separações étnicas e de interesses políticos, militares e mesmo familiares. Formaram-se pequenas e “grandes” ententes. 

A tentativa da Liga das Nações foi logo descartada pelos EUA, que desenvolviam um sistema industrial próprio, desde a Guerra da Secessão (1861-1865) denominado “American System of Manufacturing”. 

Na linguagem atual seria da obsolescência programada, que fez rapidamente colocar no poder o industrialismo e seu sistema de gestão integrada e formação de cartéis. 

Tabela constante do livro de Harry Magdoff (“L’âge de l’impérialisme”, Maspero, Paris, 1970) sobre o percentual de capitais investidos no exterior, bem mostra a redução das finanças diante do industrialismo. 

A Grã-Bretanha cai de 50,4%, em 1914, para 43,8%, em 1930. A França, outra grande potência colonial, de 22,2% para 8,4%, nos mesmos anos. Alemanha, derrotada, de 17,3% para 2,6%. 

Por outro lado, os EUA que investiram 6,3%, em 1914, passaram para 35,3%, em 1930, mesmo a modesta economia canadense, aproveitou o recuo europeu para crescer de 0,5% para 3,1% nos mesmos anos. 

Apenas os Países Baixos mantiveram seu padrão de exportadores de capital, com 3,1%, em 1914, e 5,5%, em 1930. 

Nas palavras, nas propagandas, em fatos que indiretamente se relacionavam, o financismo vai construindo na mente das pessoas as ideias de sistema mundial, globalização, Estado Nacional desnecessário, limite populacional, ameaça ecológica. Enfim, de um sistema rentista malthusiano que irá construindo pelas décadas seguintes. 

Em 17 de setembro de 1928, na Escócia, no Castelo Achnacarry, reuniram-se as maiores empresas do mundo no estratégico bem que movimentaria todo processo industrial e logístico — o petróleo. 

Estavam lá a estadunidense Standard Oil de Nova Jersey, a anglo-holandesa Royal Dutch Shell e britânica Anglo-Persian Oil Company. 

Vê-se ainda a dominância do capital inglês. Logo se associaram a elas a Standard Oil da Califórnia, a Standard Oil de Nova York, a Gulf Oil e a Texaco, mostrando a imensa transformação que acarretaria a saída das finanças e a assunção da indústria no poder mundial. 

Este poderoso cartel, conhecido como das sete irmãs, não supera os trinta anos gloriosos, pelo despontar, pelo surgimento das nações independentes, dos Estados Nação do pós-guerra. 

Na sequência veremos as consequências da II Grande Guerra na disputa pelo poder entre o financismo e o industrialismo, camuflada na defesa da família, da religião, da liberdade no mundo ocidental. 

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado. 

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Política 14/08/2022 -  

Pedro Augusto Pinho: Cronologia do golpe contra a soberania e a cidadania 


Por Redação  

 

SÉRIE ”AS FINANÇAS NO SÉCULO 21” 

Cronologia do golpe contra a soberania e cidadania 

Por Pedro Augusto Pinho*, especial para o Viomundo 

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Para que a Inglaterra assumisse o poder no século 21 foi importante submeter o Estado ao interesse privado. Sempre, na vigência do capitalismo, Estado e corporações privadas disputaram o poder. 

A diferença está na dimensão e nomenclatura que recebem. Quando os Estados saem de suas fronteiras, denominamos Império. 

Os grupos privados já foram vistos como cartéis, oligopólios e monopólios. Porém, hoje, existe a integração de empresas, universidades, mídias, até religiões atuando no mesmo sentido. 

Daniel Estulin denomina Empresa Mundial S.A. na linha da criação do Clube Bilderberg, da “One World Company Ltd.”. 

Como vai muito além da ação empresarial, denominaremos Corporação Global. 

Justifico: na continuidade da permanente concentração, típica das finanças, as Corporações Globais tendem a ser uma única. Um Chief Executive Office (CEO), um Reitor e um Papa, para os três ramos da Corporação: empresa, educação e religião. 

Após a II Grande Guerra, nova derrota recairá sobre o financismo inglês: o sucesso do industrialismo, no capitalismo e no socialismo, além da libertação das colônias europeias na África, Ásia e nos mares do Pacífico e Caribe. A Associação Francesa de Economia Política denominou o período de 1945 a 1975 dos “trinta gloriosos anos”. 

Algumas das mais importantes iniciativas, como um projeto de desenvolvimento humano – na economia, relações de trabalho, solução de problemas sociais e desenvolvimento cultural – foi levado à estagnação (décadas perdidas) e ao retrocesso econômico, social e moral. 

Seguem os principais eventos que nos conduziram, dialeticamente, ao século 21, a partir a II Grande Guerra. 

1944 – Entre 1º e 22 de julho, acordos de Bretton Woods, criação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial. Fixam-se regras para 44 países, buscando a garantia econômica e aceitando a intervenção estatal. Consagra também a hegemonia estadunidense para todo bloco capitalista. 

1945 – Friedrich Hayek, que lançara no ano anterior seu livro contra o Estado intervencionista e do bem-estar, na eleição para o parlamento, na Inglaterra, proclama: “apesar de suas boas intenções, a socialdemocracia moderada inglesa conduz ao mesmo desastre que o nazismo alemão – uma servidão moderna”. 

1945 – Os Estados Unidos da América (EUA) lançam na cidade de Hiroshima (Japão), em 06/08, a primeira bomba atômica, e, três dias depois, a segunda na cidade de Nagasaki. Estas agressões absolutamente inúteis constituíam  ameaça à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), na situação bipolar de poder na qual o mundo mergulhará até 1991. 

1947 – Funda-se a Sociedade de Mont Pèlerin, na Suíça, para combater todo tipo de sistema econômico que não fosse livre de regras e de qualquer cerceamento à liberdade. Não seria democrático e livre se promovesse a defesa do trabalhador, tivesse a participação do Estado, e restringisse o lucro por qualquer meio. 

1947 – Fundado o Instituto Tavistock, desmembrado da Tavistoc Clinic, em Londres, para pesquisas sociais e desenvolvimento organizacional. Trabalhou com a Fundação Rockefeller (constituída em Nova York, em 1913) na implementação de projetos de pedagogia colonial. 

1948 – Criação do Estado de Israel em área ocupada por palestinos, no Oriente Médio. Com a justificativa de “reparação ao povo judeu pelos padecimentos do nazismo”, as finanças colocam um quisto étnico e belicoso no ponto central das reservas de petróleo.  

1948/1949 – A primeira Guerra Árabe-Israelense surge como resposta das nações árabes à criação do Estado de Israel. Depois, ocorreram a Guerra do Suez (1956), dos Seis Dias (1967) e do Yom Kippur (1973), embora muitas escaramuças tenham e continuem a acontecer naquele espaço, envolvendo a Organização para a Libertação da Palestina ou Autoridade Palestina, Egito, Síria, Jordânia, Líbano e Iraque. 

1950 – Tem início em junho a Guerra da Coreia, que concluirá com a divisão da península em dois países, em julho de 1953. Os EUA terão participação ativa com pretexto de evitar a expansão do comunismo. 

1954 – Constituído o Clube Bilderberg, com cerca de trinta membros e participação de até igual número de convidados. 

1955 – Os EUA iniciam a Guerra no Vietnã, da qual terminará derrotado em 1975. Esta guerra com muitas mortes provocou grandes manifestações oposicionistas em todo mundo. 

1960 – Em 15 de setembro de 1960, Irã, Iraque, Kuwait, Arábia Saudita e Venezuela fundam em Bagdá a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), que a partir de 1965 será sediada em Viena, na Áustria. Em 1968, como instrumento da cooperação árabe cria-se no Líbano a Organização dos Países Árabes Exportadores de Petróleo (Opaep). 

1961 – Os príncipes consortes do Reino Unido e dos Países Baixos, respectivamente Philip e Bernardo Leopoldo, criam com Godfrey Rockefeller, Julian Huxley, Peter Scott, Guy Mountford e poucos mais o World Wildlife Fund – WWF, para atuação internacional na defesa da preservação ambiental. 

1968 – O industrial italiano Aurelio Peccei e o cientista escocês Alexander King fundam o Clube de Roma, que se tornou conhecido em 1972 com a publicação do relatório “Os Limites do Crescimento”. Elaborado por uma equipe do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), o relatório foi contratado pelo Clube de Roma e  coordenado por Dana Meadows. 

1968 – Este ano marcou diversas transformações devido às intensas ebulições políticas e sociais, sendo o mês de maio, na França, a data icônica. Muitos consideram o ponto alto da Guerra Fria. A juventude via o mundo em crise e temia por seu futuro. Tudo deveria ser feito agora. Vários slogans surgem como “é proibido proibir”. Sem dúvida, as finanças preparavam a Europa sobretudo para sequência de crises que se desencadeariam na década seguinte. 

1971 – É fundada a Organização Não Governamental (ONG), Greenpeace, em Vancouver, na Colômbia Britânica (Canadá), com sede em Amsterdã (Países Baixos). Objetivo: atuação internacional em questões relativas à preservação do meio ambiente, desenvolvimento sustentável, proteção das áreas de floresta, do clima, dos oceanos, do controle da energia nuclear, da engenharia genética, de substâncias tóxicas, de transgênicos, agrotóxicos e propugnar pela energia renovável. 

1971 – Klaus Martin Schwab, professor de administração na Suíça, constitui o Fórum Econômico Mundial. Além de reuniões anuais, o Fórum produz vários relatórios de pesquisa e engaja seus membros em iniciativas setoriais específicas. Tem posição de observador no Conselho Econômico e Social das Nações Unidas e está sob a supervisão do Conselho Federal suíço. O Fórum é financiado por suas 1000 empresas-membro. 

1973 – Primeira crise do petróleo. Foi um evento crucial para mudança do poder no mundo, do industrialismo para o financismo. Sua origem remete ao Acordo de Achnacarry, criador do cartel das Sete Irmãs, as grandes empresas de petróleo no mundo, em 1928. 

Desde então, o preço do petróleo cru enfrentou guerra e crises praticamente estável. O petróleo era extraído nas colônias, especialmente no Oriente Médio, e processado no mundo desenvolvido; quanto menor o custo da matéria prima, maior o lucro do vendedor do produto final. 

A apropriação da renda petroleira era, portanto, integralmente feita pela Sete Irmãs. 

Com a inflação que tomou conta do mundo após os EUA romperem unilateralmente os Acordos de Bretton Woods, em 15 de agosto de 1971, o preço do barril de petróleo ficou ainda mais distante da realidade econômica, dos 30 anos gloriosos. 

Os preços nominais sobem de 3 para 12 dólares por barril. Mas estes 12 dólares não representavam 400%, porém pouco mais de 200%, tomando-se os preços de 1928. 

Só o rompimento decidido por Richard Nixon já representava 10% com base nos preços ao consumidor estadunidense. Mas as finanças e sua mídia, com o auxílio dos movimentos ambientalistas, fizeram enorme pressão contra o petróleo, e indiretamente contra a principal fonte de energia para a economia produtiva. 

1973 – Em reforço a esta situação de dificuldades, é constituída a Comissão Trilateral, por iniciativa de David Rockefeller. O conjunto de membros é dividido em quantidades proporcionais para cada uma das três áreas regionais (América do Norte, Europa e Ásia/Oceania). 

Nestes membros se incluíam presidentes de corporações, políticos dos grandes partidos, acadêmicos e presidentes de universidades, líderes de uniões de trabalhadores e ONG’s. A primeira reunião do comitê executivo foi em Tóquio, em outubro de 1973. 

1973 – Também como fosse um contraponto à OPEP, é criada a Agência Internacional de Energia (AIE), com sede  em Paris. Ligada à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a finalidade da AIE é coordenar as medidas a serem tomadas com a crise do petróleo. 

O que ocorreu efetivamente foi o enorme crescimento na disponibilidade de dinheiro nos bancos ingleses, estadunidenses e suíços, os petrodólares, gerados pelas exportações dos países, sempre em dólares, como ficara acertado, em 1971, com os EUA, no rompimento do Acordo de Bretton Woods. 

Essa montanha de dinheiro irá constituir a dívida com a qual as finanças reverterão, ainda na década de 1970, o crescimento econômico e social do ocidente no pós-guerra. O grande articulador dessas estratégias foi o bilderberguiano Henry Kissinger, de quem transcrevo pensamento citado pelo coronel Gélio Fregapani, em artigo de 22/04/2012, no Defesanet: “Controle o petróleo e controlará as nações; controle o alimento e controlará as pessoas”. 

1979 – Ocorre a segunda crise do petróleo, com o preço nominal do barril aumentando de 13 para 34 dólares (hoje corresponderia a aproximadamente US$ 120,00). O pífio pretexto foi a desestruturação da produção iraniana pela deposição de xá Reza Pahlevi, aliado do complexo anglo-estadunidense. 

Na sequência trataremos da transferência do poder para o sistema financeiro e as consequências para o mundo ocidental no século XXI. 

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado. 

A série “As finanças no século 21*, de Pedro Augusto Pinho, é composta de quatro artigos.  

Abaixo, os links do primeiro e do segundo. 

Pedro Augusto Pinho: A perda do poder financeiro no século 20 

Pedro Augusto Pinho: As alianças e máscaras na luta pelo poder 


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Ilustração: Carlos Lopes/Viomundo  

Política 17/08/2022  

Pedro Augusto Pinho: A vitória das finanças apátridas 

SÉRIE ”AS FINANÇAS NO SÉCULO 21” 

A vitória das finanças apátridas 

Por Pedro Augusto Pinho* 

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As crises do petróleo provocaram grande excesso de dinheiro nos bancos do Atlântico Norte que se dirigiram, a princípio com taxas atraentes, para os países do terceiro mundo – América Latina e África –, sequiosos de modernidade, desenvolvimento social e econômico. 

A Guerra Irã-Iraque (1980-1988), países com imensas reservas de petróleo, serviu de pretexto para o “oil glut”, a redução da produção de petróleo, em 1980, e para a disparada das taxas de juros. 

Quanto aos juros, instrumento tradicional de controle das finanças (dívidas), verifiquem as taxas nominais cobradas pelo “banco central privado dos Estados Unidos da América (EUA)”, o Federal Reserve (FED): 

Março de 1971, 3,25% ao ano 

Maio de 1974, 11, 64% ao ano 

Junho de 1981, 19,83% ao ano 

Agosto de 1984, 11,53% ao ano 

Mais do que explicadas as “décadas perdidas” de 1980-1990, as mudanças de governo e a chegada do neoliberalismo como salvador da pátria, trazendo o estado mínimo, desregulações dos controles financeiros por todo mundo e o  “mercado financeiro”, pontificando  como o grande senhor, o “supremo construtor”, governador da sociedade humana. 

Vimos que o primeiro auxílio para as finanças partiu dos movimentos que tratavam da questão ambiental. 

Recordemos, aqui, uma frase famosa dita em 1973 por Henry Kissinger, então secretário de Estado dos EUA: “o controle do petróleo levava ao controle das nações”.  

Em 1973, quando ocorre o primeiro choque do petróleo, a demanda por combustíveis fósseis era imensa. Representava 82% do consumo de energia no mundo. 

Em 2021, após campanhas para substituição e redução do petróleo como fonte primária, ele ainda representava 55% do consumo do planeta, segundo a estatística de energia mais lida do mundo (2021, bp Statistical Review of World Energy, 71ª edição). 

 Ora, encarecer o preço do petróleo era lançar todo mundo na carestia e na economia de um bem indispensável para iluminar e aquecer as residências, mover máquinas e veículos, para que todo conforto do mundo moderno fosse reduzido, pela indisponibilidade ou pelo preço. Resultado: as finanças colocavam as populações contra o petróleo. 

A total liberdade de movimentação do capital financeiro foi a terceira iniciativa das finanças: a primeira foi o domínio das consciências em relação ao meio ambiente (WWF, Greenpeace) e à liberdade (1968); a segunda foi endividar as nações no afã de galgarem patamares mais elevados de bem estar, com juros baixos. 

Agora parte para as desregulações aproveitando governos favoráveis nos dois maiores centros financeiros: Reino Unido (Margaret Thatcher) e EUA (Ronald Reagan). 

Ao fim da década, 1989, elaboram um decálogo para o mundo: o Consenso de Washington. 

Conforme esses dez mandamentos a principal incumbência das nações era o equilíbrio fiscal: nada de gastar o que não tem. E para obter este equilíbrio, a dívida sempre crescente, por artifícios de toda sorte (legais e ilegais, legítimos e falaciosos), era um obstáculo quase intransponível. A dívida passa a dirigir as nações. 

Uma sequência de “crises” fará a transferência de recursos estatais e empresariais para o sistema financeiro: 

 1987 – Na Bolsa de New York, que despenca 22,6% 

1990 – Da bolha imobiliária japonesa 

1992 – No sistema monetário europeu 

1994 – “El Horror de Diciembre”, no México 

1997 – “Crise dos gigantes do sudeste asiático” 

1998 – Nas finanças da Rússia, não mais comunista 

1999 – Da reeleição de FHC, no Brasil 

2000 – Estouro da bolha da internet, a PontoCom 

2001-2002 – “A crise argentina” 

Assim, o sistema financeiro chega emponderadíssimo ao século 21.  

Mas, agora, quem é o sistema financeiro? 

A partir da última década do século 20, com as desregulações, os capitais “marginais” (de origem ilícita) saem de armários, malas, porões onde eram guardados para contas bancárias. 

Em nosso entendimento, tais capitais, sempre alvo de interesses econômicos e políticos, começaram testando esta “abertura”, esta possibilidade de lavagem que lhes era oferecida pela desregulação. 

Em levantamento que fizemos nas transações internacionais ocorridas entre 1991 e 1999, identificamos US$ 4 trilhões  sem origem conhecida. 

Não é muito para quem lida com tráfico de drogas, contrabando de pessoas, órgãos humanos, armas e muitos outros bens, prostituição e outros ilícitos. Mas serviu para ter a confiança desses “investidores”. 

Na mesma década de 1991-1999, o número de paraísos fiscais multiplica-se por dez. 

E o volume cresce. Tanto que um novo gestor, fora de bancos e financeiras tradicionais, é criado. São os gestores de ativos, que hoje superam os Produtos Internos Brutos (PIBs) de quase todos ao países do mundo. 

Os dois maiores — BlackRock e Vanguard– já igualam o PIB estadunidense. 

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o mundo que começara o século 20 com uma população de 1,663 bilhão de habitantes, chega 100 anos a 6,55 bilhões. 

O fator demográfico passa a ser um grande inimigo das finanças apátridas, surgem as epidemias. 

Expansão da dengue, surgimento de dengue hemorrágica, novas doenças (algumas delas, como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), surto de Ebola (África Ocidental) e, mais recentemente, Chikungunya e Zika, doenças virais até então consideradas raras e restritas a regiões geográficas delimitadas. 

Hoje se luta contra o SARS-CoV-2, o vírus da Covid-19 e suas múltiplas transformações. 

Em nosso modesto entender, a crises de 2008 a 2010 (tiveram como epicentros os EUA e a União Europeia, particularmente Grécia, Espanha, Itália) representam o rearranjo interno das finanças pela ascendência do capital marginal. 

Esta nova configuração ainda não se completou o que nos indica, com outras situações, o eclodir de breve e nova “crise”. 

Para dar conta dos recursos disponíveis e das demandas pelas aplicações, o sistema financeiro precisou criar títulos sem lastro, ou seja, papéis que não tinham ativos reais para sustentá-los. 

E com a crescente demanda, com 85 paraísos fiscais para lavar e ficar isento de pagamento de impostos, com a corrupção, que além de ser modo de vida das finanças ainda se tornou instrumento de dominação de congressos e instituições públicas nacionais (judiciário, militares, receitas e tesouros etc.), houve necessidade de multiplicar papéis referenciados a um único bem. 

Na crise de 2008/2010 as múltiplas hipotecas de um mesmo imóvel foram a demonstração do que já ocorria com os derivativos das commodities. 

Esses papéis sem lastro caucionam fundos de investimentos e aplicações financeiras em todo mundo. Os mais conservadores analistas estimam em centenas de trilhões de dólares estadunidenses, já o think tank Instituto Schiller avalia estar em quatrilhões de dólares. Explosão à vista. 

As guerras que antecedem o domínio das finanças no século 21 foram travadas na Europa, mais especificamente na antiga Iugoslávia (31/03/1991 a 12/11/2001). 

No século 21 coube aos EUA realizarem invasões com falsos pretextos e voltadas para o petróleo: 

2001 – Guerra no Afeganistão, com o mote de “guerra ao terror”, que vai até 2021, com mais uma derrota dos EUA. 

2003 e 2011 – Invasão do Iraque pelos EUA, impedindo que este grande exportador de petróleo saísse da esfera do dólar estadunidense. 

2011 – Invasão da Líbia, destruindo um Estado Nacional que tinha o maior índice de desenvolvimento humano (IDH) da África, segundo a ONU. Atualmente a Líbia continua a ser rica em petróleo, mas deixou de ser um Estado. Tornou-se conjunto de tribos que disputam água e esmolas do sistema financeiro internacional. 

As invasões dos EUA e do Reino Unido na Síria se dão por terceiros, simulando disputa no meio islâmico. 

Aliás, pode-se afirmar com mais propriedade que as guerras e golpes de estado no século 21 já não devem ser atribuídos aos estados nacionais, mas a seus verdadeiros dirigentes: o sistema financeiro apátrida. 

Neste momento, em 2022, a situação é de espera pela próxima crise, que será travada entre os capitais marginais e os capitais tradicionais pelo controle dos paraísos fiscais, para apropriação de recursos públicos e particulares. O objetivo é reduzir o enorme montante incobrável dos fundos de investimentos e outras aplicações financeiras deste sistema. 

 Epílogo 

Henry Kissinger, secretário de Estado dos EUA, tinha um lado e não era do país que representava; era do capitalismo financeiro. Mas tinha a inteligência de compreender que o mundo girava em torno de duas necessidades: a energia e o alimento. 

Esta lição dele, que era membro do Clube Bilderberg, passou a ser a busca do controle pela finanças apátridas. 

Isso explica, por exemplo: 

— o golpe de 2016 que derrubou a presidenta Dilma Rousseff; 

— o desmoronamento do grande e exitoso projeto brasileiro na área da energia, a Petrobrás; 

–a privatização da Eletrobrás; 

— o fechamento das empresas brasileiras, estatais e privadas produtoras de fertilizantes e implementos agrícolas; 

— o controle pelas finanças apátridas do comércio exterior de grãos, sufocando as iniciativas nacionais, privadas e estatais (Interbrás). 

Enfim, o que vemos agora é o Brasil assumindo a sua condição de colônia, trocando o interesse nacional do mundo multipolar pelo mundo globalizado das finanças. 

Em vez de apoiar Rússia, China e Índia, seus parceiros no BRICS, o Brasil se submete ao mundo unipolar em crise, numa guerra para a qual não tem qualquer questão nacional envolvida. 

Apenas para mostrar sua submissão à Organização do Tratado  do Atlântico Norte (Otan), que nem quer sua participação. 

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado. 

A série “As finanças no século 21*, de Pedro Augusto Pinho, é composta de quatro artigos.  

Abaixo, os links do primeiro, segundo e terceiro. 

Pedro Augusto Pinho: A perda do poder financeiro no século 20 

Pedro Augusto Pinho: As alianças e máscaras na luta pelo poder 

Pedro Augusto Pinho: Cronologia do golpe contra a soberania e a cidadania 


Fonte: Viomundo