Sexta, 25 de janeiro de 2013
Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil
A juíza substituta da 9ª Vara da Justiça Federal em Belo
Horizonte (MG), Raquel Vasconcelos Alves de Lima, se declarou
incompetente para julgar os acusados de matar, em 2004, três fiscais do
Trabalho e um motorista, também servidor do Ministério do Trabalho.
Segundo a assessoria da juíza informou à Agência Brasil na tarde de hoje (25), o processo deve ser encaminhado para julgamento na Vara Federal de Unaí, criada em 2010.
Os quatro servidores públicos foram mortos a tiros em 28 de janeiro de
2004, quando faziam uma fiscalização de rotina na zona rural de Unaí, a
cerca de 500 quilômetros da capital mineira, Belo Horizonte, e a apenas
160 quilômetros da região central de Brasília (DF). O caso ficou
conhecido como a Chacina de Unaí.
Ainda não foi divulgada a justificativa da juíza para declinar da
competência do processo, decisão que ocorre a apenas três dias de o
crime completar nove anos. A decisão também é anunciada poucos dias após
o corregedor nacional de Justiça interino, Jefferson Kravchychyn, ter
declarado que a juíza se comprometera a marcar o início do julgamento
para fevereiro. A intervenção da Corregedoria Nacional de Justiça foi solicitada pelo Ministério Público Federal no início de janeiro.
A decisão da juíza foi criticada por entidades de classe e pelo
presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos
Deputados, Domingos Dutra (PT), que já havia agendado uma reunião com a
juíza para a próxima segunda-feira (28), quando o crime faz nove anos.
“Queremos que o Poder Judiciário cumpra seu papel, marque a data do
julgamento para o mais breve possível e que os acusados sejam condenados
como forma de inibir a impunidade. Nove anos para um crime que abalou o
país e que motivou a aprovação de um lei instituindo o Dia Nacional de
Combate ao Trabalho Escravo é muito tempo”, comentou o deputado.
Domingos Dutra acredita também que o julgamento em Unaí compromete a
isenção do processo, porque são pessoas influentes na comunidade.
Em nota, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho
(Sinait) anunciou que, junto com a Associação dos Auditores Fiscais do
Trabalho de Minas Gerais (Aafit), vai recorrer ao Tribunal Regional
Federal da 1ª Região (TRF1), ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao
Superior Tribunal de Justiça (SJT) e ao Conselho Nacional de Justiça
(CNJ) para evitar que o processo seja encaminhado para a Vara Federal de
Unaí, onde, de acordo com a entidade, “a possibilidade de
interferências políticas e econômicas é grande”.
A procuradora da República Miriam Moreira Lima, autora da denúncia
contra os nove réus que se transformou no processo aberto na 9ª Vara da
Justiça Federal em Belo Horizonte, também prometeu recorrer da decisão.
As vítimas da chacina foram os auditores do Trabalho Erastótenes de
Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva, e o
motorista Ailton Pereira de Oliveira.
A Polícia Federal concluiu as investigações do caso em seis meses e
pediu o indiciamento de nove pessoas por homicídio triplamente
qualificado: os fazendeiros e irmãos Antério Mânica (ex-prefeito da
cidade e um dos maiores produtores de feijão do país) e Norberto Mânica;
os empresários Hugo Alves Pimenta, José Alberto de Castro e Francisco
Elder Pinheiro; além de Erinaldo de Vasconcelos Silva e Rogério Alan
Rocha Rios, apontados como autores do crime; Willian Gomes de Miranda,
suposto motorista da dupla de assassinos, e Humberto Ribeiro dos Santos,
acusado de ajudar a apagar os registros da passagem dos pistoleiros
pela cidade.
Um dos réus, o empresário Francisco Elder, faleceu no último dia 7,
com 77 anos de idade. Ele aguardava o julgamento em liberdade. Dos
outros oito indiciados, Erinaldo, Rogério e Willian estão presos em
Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, à espera da sentença
judicial. Ribeiro dos Santos foi solto a pedido do Ministério Público
Federal, já que seu crime prescreveu.
Os outros quatro réus, coincidentemente os que têm maior poder
aquisitivo, aguardam o julgamento em liberdade, beneficiados por habeas corpus da Justiça. Pouco depois do crime, Antério Mânica foi eleito prefeito de Unaí, tendo sido reeleito em 2008.
Ao longo dos anos, os réus apresentaram sucessivos recursos e
apelações que contribuíram para a demora no julgamento. A demora levou a
subprocuradora-geral da República e coordenadora da Câmara Criminal do
Ministério Público Federal, Raquel Dodge, a recorrer ao Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) para que o caso seja julgado logo.
No ofício que enviou no último dia 8 ao corregedor nacional de
Justiça interino, conselheiro Jefferson Kravchychyn, a subprocuradora
classifica o crime como um “cruel assassinato”. Ela disse que, há pelo
menos seis meses, não há nenhum obstáculo que impeça a juíza Raquel
Vasconcelos de incluir o caso na pauta de julgamentos.
Para que impedir que crimes como esse caiam no esquecimento e fiquem
impunes, foi instituído o dia 28 da janeiro, data do crime, como Dia
Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, por meio da Lei 12.064/09.
Este ano, entidades de defesa dos direitos humanos e órgãos públicos
vão realizar atividades em mais de 15 cidades do país todo.