Para Augusto Aras, as medidas previstas no Decreto Estadual 27.795/2001 e no Decreto 46.775/2019 não têm amparo constitucional e afrontam o direito à dignidade, à vida, à igualdade e à segurança.
Do STF
Para o PGR, uso de helicóptero para atirar e fim do adicional para agentes com redução de letalidade em operações são inconstitucionais
O procurador-geral da República, Augusto Aras, entendeu que há inconstitucionalidade em duas diretrizes da política de segurança pública adotada pelo governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC). São elas: o fim do adicional pago a agentes públicos que apresentem redução em índices de letalidade em operações policiais e a utilização de helicópteros como plataformas de tiro. A manifestação do PGR foi apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira (2) no âmbito de Arguição de Descumprimento de Preceitos Fundamentais (ADPF) 635, proposta pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). A Procuradoria-Geral da República (PGR) defende o conhecimento parcial da ADPF.
Para Augusto Aras, as medidas previstas no Decreto Estadual 27.795/2001 e no Decreto 46.775/2019 não têm amparo constitucional e afrontam o direito à dignidade, à vida, à igualdade e à segurança. No documento, o procurador-geral da República sustenta que os decretos não atendem padrões mínimos de razoabilidade e de proporcionalidade e, por isso, merecem ser declarados inválidos pela Suprema Corte. Segundo o PGR, os decretos, assim como as declarações públicas do governador do Rio de Janeiro, “evidenciam desvio de finalidade nas práticas administrativas adotadas em matéria de segurança pública na localidade, afrontando os preceitos fundamentais da dignidade humana e da vida”.
Desde 2011, havia premiações com gratificações a integrantes de batalhões e de delegacias que apresentassem redução de homicídios decorrentes de oposição a intervenções policiais, no Rio de Janeiro. Em setembro do ano passado, no entanto, o governador alterou a norma e suprimiu a redução da letalidade policial do cálculo do Índice de Desempenho de Metas (IDM). Para Augusto Aras, apesar de o governador ter legitimidade para editar decretos, a alteração do cálculo está em descompasso com a Constituição – principalmente no contexto atual da segurança pública no estado, e considerando a condenação pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso da chacina da Favela Nova Brasília.
Inconstitucionalidade semelhante também pode ser identificada na autorização para policiais atirarem enquanto estiverem embarcados em helicópteros. Nesse caso, o governo fluminense optou por manter a política de segurança praticada durante a intervenção federal na segurança do estado, em 2018. Para a Procuradoria-Geral da República, no entanto, “a utilização de tiro embarcado como estratégia de rotina em operações não se harmoniza com a perspectiva constitucionalizada de discricionalidade administrativa”. Augusto Aras ressalta ainda que dados estatísticos colhidos pelo Centro de Pesquisa de Letalidade Policial do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP/RJ) demonstram que o Rio de Janeiro tem a polícia mais letal do Brasil, embora não esteja entre os dez estados mais violentos do país.
Atos e declarações – Na manifestação, Augusto Aras lembra que defendeu o não conhecimento da APDF 594, proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol), por entender que esta não seria a via adequada para questionar declarações e condutas do governador. Por outro lado, a ação proposta pelo PSB não se limita a aspectos relacionados às entrevistas e publicações em redes sociais, mas indica atos concretos e objetivos praticados por Wilson Witzel. Dessa maneira, Augusto Aras avalia que a ADPF apresentada pelo PSB deve ser conhecida, uma vez que apontou concretamente atos do Poder Público supostamente lesivos a preceitos fundamentais.
Na ADPF 635 são citados 17 itens como sendo inconstitucionais. Augusto Aras explica que os outros 15 itens já são objeto de atuação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, ou contam com outros meios eficazes para sanar as lesividades apontadas. O parecer detalha, por exemplo, que o uso de mandados de busca e apreensão coletivos e genéricos já tem atuação do MPRJ como amicus curiae nos autos do habeas corpus 154.118/RJ, que tramita sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes, no STF. “Nota-se que o MPRJ, no exercício de suas atribuições constitucionais, tem adotado medidas com vistas ao controle externo da atividade policial; à promoção da dignidade, saúde e segurança de civis e de agentes públicos; à aproximação dos membros da carreira aos cidadãos; à responsabilização de indivíduos pela prática de atos incompatíveis com o ordenamento jurídico, dentre outras atividades imprescindíveis à promoção de direitos e garantias fundamentais”.