Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 1 de setembro de 2020

Enfim, homenagens para quem merece

Terça, 1º de setembro de 2020
Foto: Arquivo Público do DF
Projetada em 1967 por Oscar Niemeyer, a ponte batizada com o nome do ditador Costa e Silva teve os primeiros esboços feitos em 1973, mas só foi inaugurada em 1976, em plena vigência do AI-5 da ditadura 'bancos/militares'. 

Foto: Lúcio Bernardo Jr./Agência Brasília


Por
Fernado Tolentino, jornalista

A iniciativa do Ministério Público Federal em Rondônia de levar à prática decisão da Comissão Nacional da Verdade de anular homenagens a autoridades responsáveis por atrocidades do regime militar tem um alcance que talvez não tivesse sido inicialmente suposto. Talvez.

Está aberto felizmente um precedente, já que em Brasília as coisas são muito mais difíceis. Muito provavelmente, a proximidade de um poder autoritário torne mais remoto o sonho das relações democráticas.

Faz vários anos que os brasilienses deixam claro o incômodo com esse tipo de situação. 

O principal símbolo dessa luta tem sido a tentativa de mudar o nome da segunda ponte sobre o lago Paranoá.

Projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, acabou sendo imposto à bela ponte o nome do ditador Artur da Costa e Silva.

Contradição mais que inaceitável. Foi justamente Costa e Silva quem assinou o AI 5, que deu origem ao período de perseguições mais violentas. Professores universitários foram demitidos, parlamentares perderam mandatos, ministros de tribunais superiores foram aposentados. Claro que um número incontável de militantes políticos foram presos e torturados. Outros tantos desapareceram. Ou seja, foram eliminados.

Como aceitar que aquela ponte fosse batizada com o nome do ditador? Logo ela, saída da genial prancheta de Niemeyer, obrigado, ele próprio, a ser uma das dezenas de brasileiros a viver no exílio. 

A primeira tentativa de resgate histórico veio com a colocação por representantes do movimento popular do nome de Honestino Guimarães. Liderança brasiliense do movimento estudantil, Honestino chegou a presidente da UNE, a entidade máxima dos universitários brasileiros. Perseguido, fugiu e desapareceu. Nunca sua família teve o reconhecimento da sua eliminação. 

Mais recentemente, houve a tentativa de batizar a ponte com o nome de Marielle Franco. Nesta semana completaram-se 900 dias desde o assassinato político da vereadora carioca. Ainda não se chegou aos mandantes, embora haja indícios do envolvimento de gente muito próxima do presidente da República. O Brasil e o mundo têm cobrado uma resposta. 

Os franceses deram o seu nome a uma praça em Paris.

Talvez tenha chegado a oportunidade de um dos dois personagens ser oficialmente homenageado em Brasília.