Terça, 29 de novembro de 2011
Da Agência Brasil
Daniella Jinkings - Repórter
Embora sejam usadas como uma forma alternativa de
tratamento de pessoas viciadas em drogas, as comunidades terapêuticas
registram graves violações de direitos humanos de dependentes químicos. A
denuncia é do Conselho Federal de Psicologia (CFP), que divulgou hoje
(28) o Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos.
Em setembro, membros da Comissão de Direitos Humanos do CFP
visitaram 68 instituições de internação para usuários de drogas, em 24
estados e no Distrito Federal. De acordo com a conselheira do CFP e
membro da comissão, Ana Luiza Castro, foram observados indícios de
violações em todas as instituições visitadas, como imposição de credo,
desrespeito à orientação sexual, além de casos de violência física,
castigos e torturas.
O relatório aponta que em alguns locais há espaços de isolamento, ou
seja, quartos fechados com cadeado, escuros e pouco arejados para os
quais são levados os usuários recém-chegados ou os que têm comportamento
agressivo. Em outras instituições, os internos são enterrados até o
pescoço e sofrem castigos como beber água do vaso sanitário, comer
refeições preparadas com alimentos estragados. O trabalho forçado, sob o
nome de laborterapia, é outra característica recorrente dos tratamentos
propostos.
Para Ana Luiza, os dependentes químicos não são tratados nas
comunidades terapêuticas. “Eles [os usuários de drogas] estão sendo
mantidos em lugares baseados na fé religiosa e no trabalho sem
remuneração. A maioria [das comunidades terapêuticas] não tem
psicólogos, assistentes sociais, médicos ou técnicos em enfermagem”.
Segundo a conselheira, não há dados sobre a quantidade de
comunidades terapêuticas existentes no Brasil. Algumas ainda têm
convênios e recebem verbas públicas. Para Ana Luiza, isso é uma falha na
elaboração de políticas públicas para o setor. “A gente desconfia de
que tem muitas instituições funcionando à margem da lei, de qualquer
regularização. A maioria desses locais é afastada. Não conseguimos
localizar o site ou não tem telefone”.
O governo federal está planejando criar unidades de acolhimento para
usuários de álcool e outras drogas usando como referência a experiência
de comunidades terapêuticas. O objetivo é implantar tais unidades
dentro do Sistema Único de Saúde (SUS).
Além de um debate amplo sobre a inclusão das comunidades
terapêuticas no SUS, os membros do CFP cobram planejamento e
investimentos governamentais nos serviços de saúde pública. “Não temos
Caps [centros de Atendimento Psicossocial] que funcionem 24 horas, não
temos consultórios de rua, não temos vagas em hospitais gerais. A
ausência dessa política traz uma fragilidade”, disse Ana Luiza.
As denúncias feitas pelo CFP foram repassadas ao ouvidor nacional de
Direitos Humanos, Domingos da Silveira. “Vou encaminhar o relatório à
ministra Maria do Rosário[da Secretaria de Direito Humanos] e vou
estudá-lo e, é meu dever, percebendo alguma consistência nas denúncias,
instaurar um procedimento coletivo de apuração”.
Para o diretor executivo da Federação Brasileira das Comunidades
Terapêuticas, Maurício Landre, os conselhos regionais e Federal de
Psicologia estão fazendo um movimento para atacar o nome das comunidade
terapêuticas. “O que eles [os membros do CFP] têm observado na maioria
dos casos de violação e problemas com a questão manicomial não são
comunidades terapêuticas”, disse à Agência Brasil.
Segundo ele, algumas instituições se apropriam do título de
comunidade terapêutica de maneira irregular, pois a comunidade
terapêutica pressupõe que a pessoa queira fazer o tratamento. “Tudo que é
involuntário, ou seja, o caso das internações compulsórias não é
comunidade terapêutica mesmo que use esse nome. Eles resolveram colocar
tudo no mesmo saco e tratar do mesmo jeito”.