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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 14 de março de 2013

O papa Francisco

Quinta, 14 de março de 2013
Por Ivan de Carvalho
Na noite de 11 de fevereiro, data em que o papa Bento XVI anunciou que renunciaria em 28 do mesmo mês, uma forte tempestade desabou sobre parte da Europa, incluindo Roma. Um raio caiu na cúpula da Basílica de São Pedro e foi filmado, exibido no mundo inteiro, em velocidade normal e em câmera lenta. Muitos viram nisso mera coincidência, outros perguntaram se seria ou não coincidência e ainda outros quiseram ver um sinal dos céus.

Vale recordar que haviam sido intensos e eram ainda muito recentes os rumores de que o mundo iria “acabar” em 21 de dezembro, enquanto para outros a data assinalada no chamado Calendário Maia indicava o fim de uma Era e o início de outra. O “final dos tempos” anunciado na Bíblia se produziria com uma destruição radical da atual civilização e o retorno de Cristo Jesus para julgar a todos e dar início à nova Era.

A renúncia de Bento XVI, hoje Papa Emérito, a não pouca gente pareceu um sinal, até mais que o raio. E levou uma parte dessa gente a mais uma vez buscar a profecia de São Malaquias, que a partir do papa Celestino II elaborou uma lista de 112 papas, dos quais, pelas contas dos intérpretes, Bento XVI seria o penúltimo e seu sucessor, “Petrus Romanus”, o último. Então, se ontem, ao ser eleito, o cardeal Jorge Mario Bergoglio escolhesse o nome de Pedro II, estaria, presumivelmente, confirmando a profecia – seria o último, morreria nos porões da Barca (os subterrâneos do Vaticano), a cidade das Sete Colinas (Roma) seria destruída e o “juiz tremendo” julgaria o povo. E daria início aos tempos novos.

Para quem acredita na profecia, a opção do novo papa pelo nome de Francisco – um nome rico de simbolismos e, pelo que dele se diz, em notável afinidade com o seu comportamento e modo de ser, especialmente a humildade de São Francisco de Assis e a sua identidade com os pobres e doentes – desnorteia e pode sugerir (peço perdão por falar em tom jocoso de coisa muito séria) que o fim dos tempos haja sido ligeiramente adiado. Vale assinalar, no entanto, que o papa Francisco disse em sua saudação: “Parece que os meus irmãos, os cardeais, foram buscar quase no fim do mundo, um papa” – referindo-se à distância de Roma à Argentina, onde fazia oposição ao governo de Kristina Kirchner. Quase no fim do mundo...

Anote-se, ainda, que o novo papa tem 76 anos – uma idade avançada. Mas convém lembrar que o genoma humano está programado, não havendo erros, uma vida saudável de 120 anos. A duração de 120 anos está revelada na Bíblia, no final do drama do Dilúvio – “e todos os seus dias serão de 120 dias” –, para as gerações pós-diluvianas (as antediluvianas viviam várias centenas de anos) e a programação genética para 120 anos é hoje confirmada pela ciência.

Sobre as saudações de chefes de Estado e outras personalidades que desabaram sobre o Vaticano logo após o anúncio da eleição do arcebispo de Buenos Aires para papa, vale destacar três: Esta semana, em plebiscito, 99,9 por cento aprovaram em plebiscito continuar integrando o Reino Unido. Houve só três votos contra. O monsenhor da Igreja Católica em Port Stanley, nessas ilhas, Michael Bernard McPartland, parabenizou o papa Francisco, observando que ele não será visto como argentino, mas como papa. Outro parabéns notável, e talvez amargo, foi o da presidente Cristina Kirchner, com cujo governo o papa, quando cardeal, tinha severas divergências – que não vão desaparecer. Entre elas o apoio de Kirchner à instituição do casamento homossexual na Argentina.

O mais surpreendente cumprimento, no entanto, partiu da Venezuela. O “presidente” interino Nicolás Maduro disse que Hugo Chávez, morto na semana passada, “influenciou no Céu para que seja eleito um papa latino-americano”. Disse mais: “Alguma nova mão (sic) chegou e Cristo disse que chegou a hora da América do Sul. Nós sabemos que nosso comandante subiu às alturas e está frente a frente com Cristo”. Anunciou, ainda, que em breve deve ser convocada “uma constituinte no céu para mudar a igreja”.

Maduro me parece muito imaturo.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.