Terça, 15 de abril de 2014
Do Blog do Hélio Doyle
Os que por ingenuidade, ignorância, desinformação, má-fé ou posição
política veem a crise na Venezuela como uma luta do bem absoluto (a
oposição) contra o mal total (o chavismo) deveriam ler o artigo de Mark
Weisbrot na Folha de S. Paulo de domingo. Weisbrot é diretor do Centro
de Pesquisa Econômica e Política em Washington e presidente da Just
Foreign Policy.
O primeiro parágrafo já fala da “narrativa encantadoramente simples”
com que a imprensa tem tratado do assunto. “De acordo com essa história,
manifestantes pacíficos se sublevaram contra o governo por conta da
escassez, inflação elevada e crime. Saíram às ruas e foram recebidos por
repressão brutal da parte de um governo que também controla a mídia.”
“Não é preciso pesquisar muito para derrubar essa narrativa”, diz
Weisbrot. Segundo ele, cerca da metade das 39 vítimas fatais são civis e
membros das forças de segurança aparentemente mortos pelos
manifestantes, e não pela repressão. A emissora estatal de televisão da
Venezuela tem apenas 10% de audiência. As emissoras privadas contrárias
ao governo chegam a pedir sua derrubada.
Ele observa também que os mais prejudicados pela inflação e pela
escassez, que são os mais pobres, estão ao lado do governo. “São as
classes mais altas e menos afetadas” que lideram os protestos. Os
líderes das manifestações, que não são nada pacíficas, são Leopoldo
López e a ex-deputada Maria Corina Machado, que “decidiram que o momento
era propício para a derrubada do governo por meio de protestos de rua”.
“Os dois”, lembra Weisbrot, “estiveram envolvidos no golpe militar de
2002 contra o então presidente Hugo Chávez” e “Machado até assinou o
decreto do governo golpista que aboliu a Assembleia Nacional, a
Constituição e o Supremo Tribunal”.
Weisbrot deixa claro que não defende a detenção de López ou a
cassação de Machado. “Mas devemos ser honestos sobre quem são esses
líderes e o que procuram fazer”. E faz um parêntese: “Os brasileiros são
felizardos por não terem hoje extremistas comparáveis com grande apoio
nacional”.
“A estratégia da extrema direita venezuelana é tornar o país
ingovernável, de modo a ganhar pela força aquilo que não foi capaz de
conquistar nas 18 eleições realizadas nos últimos 15 anos”. O único
caminho, diz Weisbrot, é o diálogo entre o governo e a oposição.
É lógico que há erros e excessos do lado governista, e não é à toa
que vários agentes de órgãos de segurança foram presos. Mas os
manifestantes na Venezuela querem mesmo é o acirramento dos conflitos
para justificar a derrubada do governo eleito livremente. Por isso
agridem, matam e depredam e queimam prédios públicos, inclusive
universidades e postos de saúde, o que geralmente a nossa imprensa não
conta. Recusam o diálogo, aceito pelo opositor Henrique Capriles,
“considerado conciliador demais pela extrema direita”, porque não lhes
interessa outra solução que não o golpe. E Corina Machado, incensada
vergonhosamente aqui pelos tucanos e pelo DEM, é uma antidemocrata e
direitista raivosa, e perto dela Jair Bolsonaro fica preocupado com sua
moderação.