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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Países não estão fazendo o suficiente para garantir vida saudável às crianças, diz estudo

Quarta, 19 de fevereiro de 2020
Da ONU Brasil
Nenhum país está protegendo adequadamente a saúde das crianças, seu ambiente e seu futuro, constatou relatório divulgado nesta quarta-feira (19) por uma comissão de mais de 40 especialistas em saúde de crianças e adolescentes de todo o mundo.
A comissão foi convocada por Organização Mundial da Saúde (OMS), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pela revista científica The Lancet.
O relatório conclui que a saúde e o futuro de cada criança e adolescente em todo o mundo estão sob ameaça imediata por causa da degradação ecológica, das mudanças climáticas e de práticas de marketing que estimulam o consumo de alimentos ultraprocessados, bebidas açucaradas, álcool e tabaco.
Crianças transportam livros durante as inundações em Bangladesh em 2019. Foto: UNICEF
Crianças transportam livros durante as inundações em Bangladesh em 2019. Foto: UNICEF
Nenhum país está protegendo adequadamente a saúde das crianças, seu ambiente e seu futuro, constatou relatório divulgado nesta quarta-feira (19) por uma comissão de mais de 40 especialistas em saúde de crianças e adolescentes de todo o mundo. A comissão foi convocada por Organização Mundial da Saúde (OMS), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pela revista científica The Lancet.

O relatório “Um futuro para as crianças do mundo?” conclui que a saúde e o futuro de cada criança e adolescente em todo o mundo estão sob ameaça imediata por causa da degradação ecológica, das mudanças climáticas e de práticas de marketing que estimulam o consumo de alimentos ultraprocessados, bebidas açucaradas, álcool e tabaco.
“Apesar das melhorias na saúde da criança e do adolescente nos últimos 20 anos, o progresso parou e deve dar marcha à ré”, disse Helen Clark, ex-primeira ministra da Nova Zelândia e co-presidente da Comissão.
“Estima-se que cerca de 250 milhões de crianças menores de 5 anos em países de baixa e média renda correm o risco de não atingir seu potencial de desenvolvimento, com base em medidas proxy de baixa estatura e pobreza. Mas com uma preocupação ainda maior, cada criança no mundo todo agora enfrenta ameaças existenciais decorrentes das mudanças climáticas e das pressões comerciais”.
“Os países precisam revisar sua abordagem à saúde da criança e do adolescente, para garantir que não apenas cuidemos de nossas crianças hoje, mas também protejamos o mundo que eles herdarão no futuro”, acrescentou Clark.

Intensificação das mudanças climáticas

O relatório adotou um novo índice global de 180 países, comparando o desempenho no desenvolvimento de crianças, incluindo medidas de sobrevivência e bem-estar infantil, como saúde, educação e nutrição; sustentabilidade, como emissões de gases de efeito estufa, além de dados sobre desigualdade de renda.
Segundo o relatório, enquanto os países mais pobres precisam fazer mais para apoiar a capacidade de suas crianças viverem vidas saudáveis, as emissões excessivas de carbono — desproporcionalmente maiores entre os países mais ricos — ameaçam o futuro de todas as crianças.
Se o aquecimento global exceder os 4°C até o ano 2100, de acordo com as projeções atuais, isso levaria a consequências devastadoras para a saúde das crianças, devido ao aumento dos níveis dos oceanos, ondas de calor, proliferação de doenças como malária e dengue e desnutrição.
O índice mostra que crianças de Noruega, Coreia do Sul e Holanda têm as melhores chances de sobrevivência e bem-estar, enquanto crianças de República Centro-Africana, Chade, Somália, Níger e Mali enfrentam as piores chances.
No entanto, quando os autores levaram em consideração as emissões de CO2 per capita, os principais países ficaram para trás: a Noruega ficou em 156º, a Coreia do Sul em 166º e a Holanda em 160º. Cada um dos três emite 210% a mais de CO2 per capita do que sua meta para 2030. Estados Unidos, Austrália e Arábia Saudita estão entre os dez piores emissores.
“Mais de 2 bilhões de pessoas vivem em países onde o desenvolvimento é dificultado por crises humanitárias, conflitos e desastres naturais, problemas cada vez mais associados às mudanças climáticas”, disse o ministro Awa Coll-Seck, do Senegal, co-presidente da Comissão.
“Enquanto alguns dos países mais pobres têm uma das menores emissões de CO2, muitos estão expostos aos impactos mais severos de um clima em rápida mudança. Hoje, promover melhores condições para que as crianças sobrevivam e prosperem nacionalmente não tem de ter o custo de corroer o futuro das crianças globalmente”.
Os únicos países a caminho de atingir as metas de emissões de CO2 per capita até 2030, além de apresentar um desempenho razoável (entre os 70 principais) em medidas de crescimento infantil, são: Albânia, Armênia, Granada, Jordânia, Moldávia, Sri Lanka, Tunísia, Uruguai e Vietnã.

Marketing comercial

O relatório também destacou a ameaça às crianças representada pelo marketing. As evidências sugerem que crianças em alguns países veem até 30 mil anúncios apenas na televisão em um único ano, enquanto a exposição dos jovens a anúncios de cigarros eletrônicos aumentou mais de 250% nos EUA em dois anos, atingindo mais de 24 milhões de jovens.
O acadêmico Anthony Costello, um dos membros da comissão, disse: “a autorregulação da indústria falhou”. “Estudos em Austrália, Canadá, México, Nova Zelândia e EUA — entre muitos outros — mostraram que a autorregulação não prejudicou a capacidade comercial de anunciar para crianças”.
“Por exemplo, apesar de a indústria ter se autorregulado na Austrália, as crianças e os adolescentes ainda estavam expostos a 51 milhões de anúncios de álcool durante apenas um ano de futebol, críquete e rúgbi televisionados. E a realidade pode ser muito pior ainda: temos poucos fatos e números sobre a enorme expansão da publicidade em mídias sociais e algoritmos voltados para nossas crianças.”
A exposição das crianças ao marketing comercial de junk food e bebidas açucaradas está associada à compra de alimentos não saudáveis, sobrepeso e obesidade, vinculando o marketing predatório ao aumento alarmante da obesidade infantil. O número de crianças e adolescentes obesos aumentou de 11 milhões em 1975 para 124 milhões em 2016 — um aumento de 11 vezes, com terríveis custos individuais e sociais.

Um manifesto pela ação

Para proteger as crianças, os autores independentes da comissão pedem um novo movimento global impulsionado por e para crianças. As recomendações específicas incluem:
Interromper com extrema urgência as emissões de CO2, para garantir que as crianças tenham um futuro neste planeta;
Colocar crianças e adolescentes no centro de nossos esforços para alcançar o desenvolvimento sustentável;
Novas políticas e investimentos em todos os setores para trabalhar em prol da saúde e dos direitos da criança;
Incorporar as vozes das crianças nas decisões políticas;
Endurecer a regulamentação nacional de marketing comercial prejudicial, apoiada por um novo protocolo facultativo da Convenção sobre os Direitos da Criança.

Richard Horton, editor-chefe da série de periódicos The Lancet, disse: “a oportunidade é ótima”. “A evidência está disponível. As ferramentas estão à mão. De chefes de Estado a governantes locais, de líderes da ONU às próprias crianças, esta comissão apela ao nascimento de uma nova era para a saúde da criança e do adolescente. É preciso coragem e compromisso para entregá-la. É o teste supremo da nossa geração.”
“Da crise climática à obesidade e ao marketing comercial prejudicial, as crianças em todo o mundo estão enfrentando ameaças que eram inimagináveis apenas algumas gerações atrás”, disse Henrietta Fore, diretora executiva do UNICEF. “É hora de repensar a saúde infantil, que coloca as crianças no topo da agenda de desenvolvimento de todos os governos e coloca seu bem-estar acima de todas as considerações”.
“Este relatório mostra que os tomadores de decisão do mundo estão, com demasiada frequência, falhando com as crianças e os jovens de hoje: deixando de proteger sua saúde, deixando de proteger seus direitos e deixando de proteger seu planeta”, disse Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.
“Isso deve ser um alerta para os países investirem em saúde e desenvolvimento infantil, garantir que as vozes das crianças sejam ouvidas, proteger seus direitos e construir um futuro adequado para meninas e meninos”.