Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 22 de novembro de 2011

A bagunça geral

Terça, 22 de novembro de 2011
 Por Ivan de Carvalho
O problema que enfrento neste momento é o de colocar no espaço restrito de que disponho – e numa quantidade de linhas que alguém possa se dispor a ler – a bagunça geral em que está o planeta. Resolvi, para sair do impossível para o improvável, excluir todos os fenômenos naturais, considerando apenas os humanos. E, destes, excluindo os individuais, bem como os coletivos aparentemente secundários, mesmo sob o risco de as aparências enganarem, como lhes é habitual.

            Creio que a bagunça geral, nos seus aspectos objetivos, pode ser vista em três fenômenos – a crise do sistema econômico-financeiro global; a “primavera árabe”, que já vai se tornando verão, acrescentando riscos extremos às suas iniciais promessas estimulantes (sinto menos entusiasmo com estas, porque frágeis, do que receio por aqueles, que são fortes e profundos); e os movimentos de opinião e manifestação popular que, por enquanto – e só por enquanto – espalham-se pela União Européia e os Estados Unidos, contestando o sistema, e, como já referido, pelo mundo árabe, combatendo o autoritarismo.

            Nos últimos dias caíram os governos grego e italiano, sem eleições e mudança das forças políticas que governam esses países, e a “esquerda” espanhola sofreu sua maior derrota, enquanto a direita, sua maior vitória histórica após a restauração da democracia. A esquerda, o PSOE, estava no poder. Se estivesse na oposição, teria ganho e o PP, que venceu, se estivesse no governo teria perdido. Na França – uma economia mais sólida, mas com seus problemas – o presidente Sarkozy está em baixa e seu provável adversário nas eleições presidenciais do ano que vem, um aspirante sem nenhum carisma, mais desenxabido do que brócolis, lidera as pesquisas.

            É a economia. A percepção de que os governos conduziram mal a crise e continuam assim é que está provocando as mudanças, estimuladas por mobilizações populares e protestos que já atingiram a Grécia, Itália, Irlanda, Portugal, Espanha, França e Estados Unidos. Nos EUA, o presidente Obama está com a popularidade em baixa, a economia se recupera mais lentamente do que o governo, o mercado e o povo esperavam. Se as coisas não se complicarem um pouco mais na Europa, as consequências saltarão o Atlântico e dificilmente Obama renovará o mandato nas eleições do ano que vem. Há uma interação econômica e política enorme entre Estados Unidos e Europa, incluída nesta a Inglaterra, que também está em dificuldades, apesar de não pertencer à “zona do euro”.

            Quanto à primavera árabe vai mudando para verão. É sua segunda fase. Enquanto a primeira fase dá um primeiro sinal no Kuwait e ainda se desenrola na Síria – onde os riscos fazem o que aconteceu e acontece na Líbia parecerem um jogo de frescobol – no Egito, um país-chave na região, começou a segunda fase. Os manifestantes voltaram à Praça Tahir. Sábado, domingo e ontem houve conflitos com a polícia, apoiada pelo Exército, o 12º do mundo. Cassetetes, gás lacrimogêneo.

          O governo provisório indicado pelo Exército renunciou e espera nos postos a aceitação da renúncia pelo Exército, que indicará outro governo provisório. A chefe da área política da União Européia pediu ontem que a autoridade egípcia cesse a violência contra os manifestantes e mantenha as eleições parlamentares marcadas para sábado. O Exército quer porque quer, na futura Constituição, autonomia orçamentária e outras autonomias. Não quer ficar reduzido à impotência a que foi relegado o antes poderoso Exército do Irã. Há duas forças organizadas no Egito – o Exército e a Irmandade Muçulmana, que estava fora da lei, mas agora deverá ganhar as eleições. A queda de braço já está em curso.

Mas e nós brasileiros com tudo isso? Bem, se as coisas complicarem na Europa, nos EUA, no mundo árabe, alguém acha que não seremos afetados? Ficam falando em Olimpíadas, Copa do Mundo, novelas, “políticas públicas”, protagonismo e em todas as outras coisas do circo, mas é bom lembrar que temos eleições no ano que vem. E, principalmente, em 2014.

Falar nisso, o que aconteceu com o PSOE?
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna de Bahia desta terça
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.