Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Alinhados e desalinhados


Segunda, 28 de agosto de 2012
Por Ivan de Carvalho
Um dos pilares da campanha de Pelegrino, candidato à sucessão de João Henrique por uma coligação-monstro de 14 partidos liderada pelo PT, é o argumento de que o prefeito de Salvador deve ser alguém politicamente alinhado com os governos federal e estadual, pois assim destes teria a boa vontade e a simpatia para a destinação de dinheiro que permita a realização de uma boa administração.

            Bem, Pelegrino não é pioneiro. Este não é um argumento novo, vem sendo utilizado há décadas em muitos lugares, inclusive em Salvador e por diversas correntes políticas. Nas eleições municipais de 2008, foi muito usado pela campanha do candidato do PT a prefeito, o agora coordenador da campanha de Pelegrino, senador Walter Pinheiro.

           Bem antes dele, a senadora Lídice da Mata usara – para justificar as deficiências da administração que fez na capital – o mesmo argumento, mas pelo avesso. Formulou um discurso segundo o qual, embora houvesse conseguido fazer uma administração meritória em vários aspectos, tivera grandes dificuldades em outros, porque não contara com ajuda federal, já que o grupo carlista chefiado por Antonio Carlos Magalhães tudo fizera para impedir a vinda de dinheiro federal e controlava o governo do Estado, que também teria sabotado a gestão da então prefeita.

           Finalmente, o próprio carlismo, em várias eleições, usou e abusou do argumento de que o alinhamento político do prefeito de Salvador com os governos federal e estadual – ou mesmo só com o estadual, nas fases que o federal não estava alinhado com o carlismo – era fundamental para a obtenção de recursos financeiros que proporcionassem uma administração municipal profícua.

           Ora, ressalve-se que Lídice da Mata “apenas” buscou caracterizar-se como vítima de perseguição política, a qual teria resultado em sofrimento para a cidade – que também sofreu com certos outros prefeitos que não foram alvo de perseguição política, mas vitimaram a cidade por incompetência ou falta de espírito público.

            Quanto ao argumento de que o alinhamento é necessário, ele foi sempre, é e continuará sendo enquanto for usado uma espécie de chantagem praticada contra o eleitor. Tipo: “Vote em nós, que somos alinhados, ou dane-se”. Uma chantagem e uma confissão de más intenções: se o eleitorado não votar nos alinhados, a União e o Estado não darão ao prefeito eleito pelo povo da cidade os recursos que arrecadaram do povo mediante os tributos e que dariam se o eleito fosse outro, um candidato alinhado politicamente.

           Mas se o dinheiro não é do presidente, se não é do governador, como é que os partidos alinhados com o presidente, com o governador, têm a ousadia de desafiar o eleitorado com esse argumento? Em um país com uma cultura democrática sedimentada uma campanha eleitoral não faz isso. Não cometará a tolice de tal desafio.

            Para terminar com um fato bem objetivo: a campanha de ACM Neto trouxe ontem Beto Richa para o horário de propaganda eleitoral na TV. Beto Richa, do PSDB, foi eleito, em 2004, prefeito de Curitiba, capital do Paraná, com 54,78 por cento dos votos, vencendo Ângelo Venhoni, do PT. Não era “alinhado”, mas saiu-se bem e foi reeleito em 2008, ainda no primeiro turno, com 77,27 por cento dos votos válidos, vencendo a atual senadora e ministra-chefe da Casa Civil da presidente Dilma Rousseff, Gleisi Hoffmann. Foi avaliado em pesquisas eleitorais como o “melhor prefeito do Brasil”. Em outubro de 2010 foi eleito governador do Paraná, que governa “desalinhado” com o governo federal.

            Se todo mundo precisasse ser alinhado, bastaria existir um partido.
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.