Sábado, 29 de agosto de 2015
Maiana Diniz – Repórter da Agência Brasil
Uma nova geração de
tartarugas marinhas adultas passou a ocupar as praias e ilhas brasileiras nos
últimos cinco anos. De acordo com dados analisados pelo Projeto Tamar, criado
há 35 anos para proteger animais dessa espécie que passam pelo Brasil, de 2010
a 2015, houve crescimento de 86,7% no número de filhotes nascidos em relação ao
quinquênio anterior.
“Estamos festejando o
aparecimento dessa nova geração em idade reprodutiva. Isso praticamente dobrou
a população de tartarugas marinhas no Brasil”, disse o coordenador-geral e um
dos fundadores do projeto, o oceanógrafo Guy Marcovaldi. Segundo ele, os
números comprovam o início da recuperação dessas espécies, mas não significam
que a ameaça de extinção acabou. “Quando o Tamar completar 70 anos, teremos um
número bom, porque será segunda geração de tartarugas, uma sobre a outra.”
De acordo com o
pesquisador, quando o projeto começou, a tartaruga era um prato de comida, e a
matança de fêmeas e o consumo dos ovos tinham praticamente interrompido o ciclo
de vida desses animais. No primeiro ano de atividade, em 1980, o Tamar ajudou a
salvar 2 mil tartarugas. Na temporada de desovas de 2013-2014, foram mais de 2
milhões de filhotes protegidos.
Estima-se que 7.350
tartarugas fêmeas estiveram em processo de reprodução no Brasil no último ano.
Marcovaldi explica que as tartarugas são animais de vida longa e demoram 30
anos para atingir a idade adulta. Por isso, os resultados de trabalhos de conservação
demoram a aparecer.
Nos últimos 35 anos,
o Tamar protegeu mais de 20 milhões de filhotes. “Mas, por fatores naturais,
apenas um ou dois em cada mil sobrevivem no mar”, explica Marcovaldi. No
Brasil, as principais ameaças à recuperação das tartarugas são as redes de
pesca, os anzóis e a poluição dos oceanos.
Marcovaldi destaca
que o esforço de proteção dessas espécies precisa ser mundial, pois são animais
que viajam por longas distâncias. “As nossas tartarugas migram para a África,
Oceania, América do Norte e Ásia. Então, como num trabalho do Itamaraty, essas
populações precisam ser reconhecidas como ameaçadas por todos os países que
compartilham essas espécies com o Brasil.”
Das sete espécies de
tartarugas marinhas existentes no mundo, o Tamar pesquisa e protege as cinco
que vêm ao Brasil, todas ameaçadas de extinção: a cabeçuda, de pente, verde,
oliva e de couro. Segundo o coordenador-geral do Tamar, a espécie mais
vulnerável no Brasil é a tartaruga-de-couro, que vive no Espírito Santo. “Mas,
em termos mundiais, a pior é a tartaruga-pente, que tem o casco extraído para
fazer jóias. Até hoje os japoneses continuam insistindo nessa prática”,
lamenta.
Além de monitorar a
postura dos ovos, os cientistas do projeto observam o comportamento e coletam
material biológico para análise genética das tartarugas. Tanto nas áreas de
desova como nas de alimentação, animais são marcados com transmissores de metal
nas nadadeiras que permitem o estudo do deslocamento e dos hábitos, bem como de
dados sobre crescimento e taxa de sobrevivência.
Marcovaldi estima que
cerca de 50 mil tartarugas foram marcadas desde que o projeto começou. Os dados
constam no Sistema de Informação sobre Tartarugas Marinhas e ajudam a melhorar
as estratégias de recuperação das espécies. “Costumo dizer que saímos da
terceira divisão na conservação e pesquisa das tartarugas, no início da década
de 80, e hoje estamos entre os cinco primeiros colocados no mundo, na primeira
divisão de tartarugas marinhas do mundo, disputando com Austrália, Costa Rica,
Estados Unidos e México.”
Geração
de empregos e financiamento
O Projeto Tamar atua
em 25 localidades ao longo de mais de 1.100 quilômetros de praias, em áreas de
alimentação, desova, crescimento e descanso das tartarugas marinhas, no litoral
e ilhas da Bahia, de Sergipe, Pernambuco, do Rio Grande do Norte, Ceará,
Espírito Santo, Rio de Janeiro, de São Paulo e Santa Catarina.
De acordo com
Marcovaldi, mais de 1.800 pessoas trabalham no projeto, que prioriza a
colocação de pessoas da região, em especial as de classe baixa e que trocaram a
prática de matar tartarugas por viver da imagem delas. “Nós chamamos de uso não
letal, quando as pessoas param de vender carne e ovos de tartarugas, mas
continuam vivendo delas, mas sem matar. Por exemplo, fabricando camisetas,
vendendo artesanato e imagens de tartarugas.”
O projeto também
capacita cerca de 200 estagiários de universidades brasileiras e estrangeiras
nas áreas de Biologia, Engenharia de Pesca, Medicina Veterinária e Oceanografia
por ano.
O Tamar tem nove
centros de visitação nas regiões litorâneas com potencial turístico. De acordo
com o Formulário de Visitação Anual, do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram),
os centros da Bahia e de Santa Catarina estão entre os museus mais visitados do
Brasil.
“No ranking de
museus mais visitados do país, o Projeto Tamar encabeça a lista em quase todas
as regiões brasileiras onde temos centros para visitação. Só perdemos para
museus famosos de São Paulo e para o Cristo Redentor, no Rio”, afirma
Marcovaldi.
Os centros têm tanques
e aquários, painéis informativos, espaço para exposições e palestras e lojas
para venda de produtos e respondem por parte relevante do orçamento do projeto.
“A primeira fonte de renda do Tamar vem da produção e venda dos produtos da
marca, responsável por cerca de 40% dos recursos do projeto”, conta
Marcovaldi, que não revela o orçamento anual do projeto.
O Projeto Tamar é uma
cooperação entre o Centro Tamar, do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBio), e a Fundação Pró-Tamar, instituição privada sem fins
lucrativos. A Petrobras é a patrocinadora oficial do projeto há 33 anos. O
valor do contrato atual com a estatal, vigente de dezembro de 2014 a dezembro
de 2017, é de R$ 10.846.777,06. Pelo patrocínio, a Petrobras repassou R$ 1,88
milhão em 2014 e R$ 1,15 milhão, até agosto deste ano. Recentemente, o Bradesco
também tornou-se patrocinador do projeto.
O restante dos
recursos vem dos governos federal e estaduais e municipais onde o Tamar atua.
“O projeto hoje é uma coisa do Brasil. Já é do DNA da nossa sociedade, e graças
a isso ele funciona bem“, afirmou Macovaldi.